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Editorial

Adolescentes e o ato infracional

02 de Setembro de 2024 às 22:00
Cruzeiro do Sul [email protected]
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No final do mês de agosto, a Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 2325/24, que aumenta de três para oito anos o prazo de internação máxima de adolescente que cometeu ato infracional, equivalente ao crime na fase adulta. Além disso, o texto aumenta a idade de liberação compulsória da internação de 21 anos para 26 anos.

O projeto altera o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para combater “o crescimento da criminalidade entre os jovens”. O texto deixa claro que “a intenção é o combate à impunidade e que é extremamente necessário elevar o período máximo de internação de três para oito anos e a que a matéria merece apoio e aprovação, eis que atende aos anseios da população, que está cansada e oprimida com o aumento da criminalidade em todo o País, notadamente pelos efeitos nefastos de atos infracionais praticados por jovens adolescentes”.

A proposta também aumenta o prazo para a internação cautelar, ou seja, antes da sentença, para 180 dias. Hoje a internação cautelar pode ser determinada por, no máximo, 45 dias.

O projeto também passa a exigir monitoramento eletrônico para o adolescente realizar atividades externas. Hoje, o ECA permite essas saídas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo determinação judicial em contrário, mas não menciona o uso de monitoramento eletrônico.

O texto modifica ainda a lista dos atos infracionais análogos a crimes que possibilitam a aplicação da medida socioeducativa de internação. Atualmente, o ECA prevê que a medida de internação pode ser aplicada nos casos de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência; reiteração no cometimento de outras infrações graves; e descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta.

O projeto permite a internação também nos casos de atos infracionais análogos ao crime de porte ilegal de arma de fogo ou de explosivo; tortura; terrorismo; quadrilha ou associação criminosa; e tráfico ilícito de entorpecentes — salvo se o agente for primário, com bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas nem integrar organização criminosa.

O projeto será analisado agora pelas comissões de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Em seguida, será votado pelo plenário. Para virar lei, a proposta precisa ser aprovada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado.

O tema é delicado e revela uma triste realidade brasileira e, ao que parece, de difícil solução. Porém, em um primeiro momento, há a concordância de grande parte da sociedade pela decisão que os legisladores estão tomando neste momento.

O estudo Trajetória Escolar e de Vida de Jovens em Situação de Risco e Vulnerabilidade Social Acusados de Cometimento de Ato Infracional, que analisou o perfil de menores moradores da cidade do Rio de Janeiro, em 2023, apurou que cerca de 90% dos mais de 143 mil adolescentes que cumpriam medidas de liberdade assistida, semiliberdade, internação estrita e prestação de serviços à comunidade não completaram o ensino fundamental. Outro número preocupante é o de que mais de 70% deles viviam em áreas de conflito armado, 97% deles são homens; 76% são negros; 34% possuem renda familiar de 1 a 3 salários mínimos e 70% deles está na faixa etária entre 15 e 17 anos.

Um fato que chamou a atenção dos pesquisadores foi que o alto número de jovens problemáticos, na faixa etária entre 15 a 17 anos, está diretamente ligado à evasão escolar e a uma perspectiva de início da vida profissional. O estudo concluiu que os jovens que cometeram atos infracionais são os mais vulneráveis socialmente no Brasil: homens, negros, pobres, pouco escolarizados e que começaram a trabalhar muito cedo.