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Editorial

Perde-se mais do que dinheiro com os jogos de azar

25 de Junho de 2024 às 22:30
Cruzeiro do Sul [email protected]
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De uns tempos para cá, uma nova epidemia vem assolando as famílias brasileiras de forma silenciosa. Trata-se dos jogos de azar on-line, que prometem resolver a vida financeira das pessoas num piscar de olhos, mas, na verdade, trazem a desgraça, o desespero, a depressão, o endividamento, a perda de patrimônio e outras consequências ainda mais graves.

Embora a exploração de jogos de azar no Brasil seja proibida desde 1946, sobre o argumento de que a prática vicia as pessoas, cria um ambiente favorável à criminalidade, estimula a sonegação fiscal, lavagem de dinheiro e corrupção, além de poder causar alguma instabilidade institucional e econômica no País, os jogos de azar têm livre acesso aos apostadores por meio do celular e dos computadores pessoais. Bom lembrar que, embora proibido, o jogo do bicho está presente nas esquinas do País, principalmente no Rio de Janeiro desde de 1892, quando foi criado pelo Barão João Batista Viana Drummond, como uma atração para os visitantes de seu zoológico na capital fluminense. Foi por meio dos bicheiros cariocas que as máquinas caça-níqueis, como as que surgem escondidas em um canto de um bar qualquer, foram introduzidas no Brasil.

Porém, como conta o site www.askgamblers.com/, no Brasil, os jogos de azar foram introduzidos pela primeira vez com a chegada da família real portuguesa. Em 1920, já como uma república e sob o governo do então presidente Epitácio Pessoa, o País permitiu a construção das primeiras casas de apostas. Depois de um período de proibição, os cassinos foram retomados em 1930 e legalizados por Getúlio Vargas. Na época, um dos mais famosos foi o Cassino da Urca, no Rio de Janeiro. Além de jogos de cassino e caça-níqueis, o local era conhecido por shows musicais de artistas renomados, como a cantora Carmem Miranda.

Entretanto, já em 1946, um decreto assinado pelo presidente na época, Eurico Gaspar, fechou 70 estabelecimentos e proibiu os cassinos no Brasil. Mais recentemente, amparadas pela Lei Zico e depois pela Pelé, alguns bingos ligados a equipes desportivas chegaram a funcionar no País, mas logo fecharam. Mas, nada adiantou. Jogos de azar sempre existiram. Até mesmo as loterias oficiais estão nesse quesito.

Porém, pouco se fala sobre seus efeitos. A situação é tão grave que até mesmo a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera doença o chamado “distúrbio de games” desde a publicação, em janeiro de 2022, de uma versão atualizada da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, chamada CID-11, no qual o problema está definido como um padrão de comportamento caracterizado pela perda de controle sobre o tempo de jogo, sobre a prioridade dada aos jogos em relação a outras atividades importantes e a decisão de continuar de frente à tela apesar de consequências negativas. O diagnóstico é dado quando os prejuízos afetam de forma significativa as áreas pessoais, familiares, sociais, educacionais e ocupacionais ao longo de cerca de 12 meses.

Além de afetar a saúde, os jogos de azar on-line se tornaram casos de polícia e de muita investigação. Tem se tornado comum a prisão de influenciadores digitais pelo convecimento de pessoas a caírem na armadilha do ganho fácil e rápido. O uso de plataformas escondidas na rede podre da internet tem levado pessoas ao desespero. Após serem atraídos ao jogo, a falência é rápida, sem antes passar pela necessidade de “vender” a alma aos agiotas.

Em entrevista à Record News ontem (25), Flávio de Leão Bastos, advogado e professor de direito constitucional, falou sobre os impactos do vício na vida de quem tem compulsão por jogos de azar. “Os prejuízos não são só individuais. Envolvem a família, os relacionamentos, o emprego. Temos pesquisas mostrando até que as pessoas pedem adiantamento de salário para pagar dívidas de jogos”, afirma. Segundo ele, um estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostra que, no último período avaliado, cidadãos do mundo todo ‘perderam‘ mais de R$ 2 trilhões para o jogo. O problema é que a perda não é só monetária. Perde-se muito mais do que dinheiro. E pode piorar: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, na sexta-feira passada, dia 21, que deve sancionar o projeto de lei que propõe a legalização de cassinos e jogos de azar, como bingo e jogo do bicho, no Brasil. Para Lula, entretanto, não é isso “que vai salvar o País” em termos de receitas e geração de empregos.