Editorial
A inflação e seu efeito nas famílias
Ao longo de 2024, as famílias de renda muito baixa têm sentido mais o peso da inflação que os lares de renda alta. De janeiro a maio, a inflação para lares com renda mensal menor que R$ 2.105,99 foi de 2,57%, enquanto a inflação de todas as faixas de renda ficou em 2,27%. Na outra ponta, famílias de renda alta, ou seja, orçamento maior que R$ 21.059,92, experimentam aumento nos preços de 1,9% em 2024. Os grupos familiares de renda baixa (entre R$ 2.105,99 e R$ 3.158,99) e média baixa (de R$ 3.158,99 e R$ 5.264,99) também vivenciam em 2024 inflação maior que o índice médio: 2,50% e 2,35%, respectivamente.
Lares de renda média (de R$ 5.264,98 e R$ 10.529,96) sentiram impactos de aumentos de preços levemente abaixo da inflação oficial, 2,25%.
Os dados fazem parte do Indicador de Inflação por Faixa de Renda, divulgado nesta sexta-feira (14) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O levantamento é feito com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O estudo — conduzido pela pesquisadora Maria Andreia Parente Lameiras — aponta que a maior pressão inflacionária ao longo de 2024 é explicada, principalmente, pelos efeitos climáticos sobre os alimentos no domicílio. A alimentação ocupa mais espaço no orçamento das famílias mais pobres.
Já no acumulado dos últimos 12 meses, as famílias de rendas média (4,03%), média alta (4,27%) e alta (4,84%) sentiram inflação maior que o índice médio de todas as faixas de rendimento (3,93%). Domicílios de renda média alta são os que têm orçamento de R$ 10.529,96 a R$ 21.059,92. Na outra ponta, os lares de renda muito baixa (3,20%), baixa (3,42%) e média baixa (3,66%) perceberam a inflação.
Considerando que inflação é o aumento dos preços de bens e serviços, ela implica na diminuição do poder de compra da moeda, uma vez que os salários nunca acompanham os índices inflacionários. A inflação gera incertezas importantes na economia, desestimulando o investimento e, assim, prejudicando o crescimento econômico.
Os preços relativos ficam distorcidos, gerando várias ineficiências na economia. As pessoas e as empresas perdem a noção dos preços relativos e, assim, fica difícil avaliar se algo está barato ou caro. A inflação afeta particularmente as camadas menos favorecidas da população, pois essas têm menos acesso a instrumentos financeiros para se defender da inflação.
O mercado financeiro elevou pela quarta vez seguida a previsão da inflação para este ano. Segundo o boletim Focus, divulgado no dia 3 de junho pelo Banco Central (BC), o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechará 2024 em 3,88%.
A estabilidade dos preços preservaria o valor do dinheiro, mantendo o poder de compra da moeda. Manter a taxa de inflação baixa, estável e previsível é a melhor contribuição que a política monetária do BC pode fazer para o crescimento econômico sustentável e a melhora nas condições de vida da população. Com preços estáveis, todos podem se planejar melhor. Empresas têm melhores condições para realizar investimentos e as famílias para avaliar quanto vão gastar ao longo do mês.
E os gastos governamentais geram inflação? O especialista em contas públicas, Raul Velloso, disse que o gasto público está crescendo exponencialmente a cada ano, mas a inflação está sob controle. “O gasto é ruim para a inflação, mas o governo tem mecanismos para segurar uma onda inflacionária. O maior impacto do aumento dos gastos é a redução dos investimentos privados”, explicou. Mas, no ritmo em que andam, os gastos da administração pública podem gerar sérios impactos na taxa de inflação do País, alerta o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A inflação mais alta aumenta o custo da dívida pública.
O governo tem mecanismo para se socorrer na falta de dinheiro, criando taxações e impostos. E as famílias, o que podem fazer a não ser enfrentar a questão com dignidade.