Editorial
11,4 milhões não sabem ler e escrever um bilhete simples
Dados do Censo Demográfico 2022 Alfabetização: Resultados do universo divulgado nesta sexta-feira (17) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que, no Brasil, dos 163 milhões de pessoas com idade igual ou superior a 15 anos, 151,5 milhões sabem ler e escrever ao menos um bilhete simples e 11,4 milhões não têm essa habilidade mínima. Em números proporcionais, o resultado indica taxa de alfabetização em 93%, em 2022 e, consequentemente, a taxa de analfabetismo foi 7% do contingente populacional.
Há 4 anos, o mesmo IBGE apontava que aproximadamente 16 milhões de brasileiros eram analfabetos, o equivalente a 7% da população nacional à época. Ou seja, pouco se evoluiu, afinal o País está estagnado na taxa de 7% de analfabetos.
Esse assunto demanda amplo e demorado estudo para, então, chegar a um consenso reflexivo.
De acordo com o Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional (Inaf) — iniciativa de medição do alfabetismo da população brasileira, criado e implementado pelo Instituto Paulo Montenegro e pela ONG Ação Educativa — a alfabetização pode ser classificada em quatro níveis: analfabetos, alfabetizados em nível rudimentar (ambos considerados analfabetos funcionais), alfabetizados em nível básico e alfabetizados em nível pleno (esses dois últimos considerados indivíduos alfabetizados funcionalmente).
Vamos nos ater um pouco sobre o conceito de analfabetos funcionais, que são os indivíduos que, embora saibam reconhecer letras e números, são incapazes de compreender textos simples, bem como realizar operações matemáticas mais elaboradas. Aí que mora um problema sério que a política de alfabetização do governo precisa priorizar, para não inflar as estatísticas e esconder a real situação.
O próprio Inaf comprovou, por meio de pesquisa, a partir da aplicação de um teste avaliando as habilidades de leitura, escrita e matemática, que o domínio pleno da leitura vem sofrendo queda entre todos os entrevistados, mesmo tendo eles concluído o ensino fundamental ou até mesmo o ensino superior. Os dados mostram que o problema do analfabetismo funcional deve ser levado a sério, pois a dificuldade de compreensão dos gêneros textuais, mesmo os mais simples e mais acessados no cotidiano, prejudica o desenvolvimento intelectual, pessoal e profissional do brasileiro
Outra pesquisa, feita pelo Instituto Pró-Livro, mostrou que 50% dos entrevistados declararam não ler livros por não conseguirem compreender seu conteúdo, embora sejam tecnicamente alfabetizados.
Então, dos recentes números do IBGE, é necessário ampliar a imagem do que se mostra. A estatística não deve privilegiar informações para “inglês ver”. O significado da famosa expressão é fingir que fez algo ou fazer mal feito. Ela surgiu na primeira metade do século 19, quando a Inglaterra, por interesses econômicos, tentou abolir a escravidão no mundo. Em sua lista, estava o Brasil, que tinha nos escravos a base de sua economia. Para enganar a potência, o Império colocava navios no litoral com a suposta missão de ir atrás das naus negreiras. Entretanto, na prática, nada acontecia a elas. Era uma encenação “para inglês ver”. Olha o Brasil aí dando mais um de seus “jeitinhos”.
A questão que envolve o (an)alfabetismo no País é um resultado constrangedor de décadas de políticas públicas mal conduzidas que, apesar de bem intencionadas, não têm logrado alfabetizar devidamente crianças, jovens e adultos.
Pois bem, diante da realidade comprovada — e expressada — há, sim, de encarar o enfrentamento ao analfabetismo urgente, a fim de mudar essa triste história e efetuar o devido pagamento da dívida social e humana, que hoje representa uma vergonha nacional. Necessário, também, produzir números oficiais que realmente expressem a verdade, principalmente sobre os analfabetos funcionais.