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Editorial

O Centrão mostra a sua força

Ministros de algumas pastas do Planalto prometeram reagir através da judicialização

15 de Dezembro de 2023 às 23:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Além disso, tem a revolta dos prefeitos de pequenos municípios que perderam o benefício da desoneração
Além disso, tem a revolta dos prefeitos de pequenos municípios que perderam o benefício da desoneração (Crédito: Reprodução / Internet)

O Governo Lula sofreu duras derrotas no Congresso Nacional na noite de quinta-feira, 14.

Vários vetos foram derrubados, por ampla margem de votos, e o Centrão deu uma demonstração inequívoca de quem realmente manda na política do país.

Os temas mais emblemáticos dessa disputa versaram sobre a desoneração fiscal de vários setores e o marco temporal das terras indígenas.

Mesmo com derrotas acachapantes, o Governo não pretende aceitar passivamente a democrática decisão de deputados e senadores.

Ministros de algumas pastas do Planalto prometeram reagir por meio da judicialização.

Eles só esquecem que contrariar a ampla maioria do Congresso pode emperrar projetos futuros do próprio governo.

No caso da desoneração da folha de pagamentos de 17 setores, os placares de votação foram bastante elásticos, deixando claro, a quem quisesse ver, a falta de base do Governo no Congresso e a incapacidade de seus articuladores políticos de enfrentar temas sensíveis.

No Senado, 60 senadores votaram pela derrubada do veto presidencial, ante 13 pela manutenção.

Já na Câmara, foram 378 votos pela derrubada e 78 para sustentar o veto.

Um abismo entre a vontade do presidente Lula e o que pensam os legisladores eleitos pela população.

Criada em 2011 durante o governo Dilma, do próprio Partido dos Trabalhadores, a desoneração da folha de pagamento é um benefício fiscal que substitui a contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a folha de salários por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta.

Na prática, a medida reduz a carga tributária devida pelas empresas. O benefício tinha data marcada para acabar, mas foi renovado pelos parlamentares.

Segundo estudos de diversos economistas e do próprio Ministério da Fazenda, o impacto da renovação do benefício para os cofres da União pode chegar a R$ 20 bilhões por ano, o equivalente ao que o governo prevê arrecadar com a nova tributação dos fundos exclusivos e offshore.

A decisão do Congresso, informada ao Governo desde o dia do veto de Lula, desagradou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que ameaçou com a possibilidade de o governo acionar o Judiciário contra a prorrogação da desoneração, um programa criado pelo próprio PT.

Haddad defende que a prorrogação é inconstitucional e que o Supremo Tribunal Federal deve ser ouvido sobre o tema.

Segundo o governo, o vício de inconstitucionalidade aumentou depois que o projeto aprovado pelo Congresso inseriu os municípios de menor porte entre os beneficiários da desoneração.

Para o deputado Domingos Sávio, que preside a Frente Parlamentar do Comércio e Serviços, a derrubada do veto foi um “momento histórico” que mostra a independência e a reafirmação do papel do Congresso.

Mas essa não foi a única surra que o governo tomou na quinta-feira no Congresso Nacional.

O veto do presidente Lula ao marco temporal para demarcação de terras indígenas também caiu: 41 dos 47 pontos vetados pela Presidência da República foram derrubados.

A Câmara e o Senado haviam aprovado projeto definindo que só poderiam ser demarcadas terras ocupadas por indígenas até a promulgação da Constituição, em outubro de 1988.

A decisão foi uma resposta a julgamento ocorrido em setembro, quando o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional a tese do marco temporal.

Agora, pelo menos por enquanto, o entendimento anterior voltou a valer.

O Ministério dos Povos Indígenas, contrariado com a decisão do Congresso, declarou que pretende acionar a Advocacia-Geral da União (AGU) para entrar com ação no Supremo contra a derrubada do veto.

Mesmo que o STF decide pela inconstitucionalidade do marco, outras vitórias importantes foram conquistadas pelos agricultores e dificilmente serão alteradas.

É o caso, por exemplo, do trecho da lei que garante direito à indenização em desocupação de áreas para demarcações de terras, e de outro que impede a ampliação de um território já demarcado.

A indenização, por si só, aumenta, e muito, o custo para o Governo desapropriar uma grande quantidade de terras para transformá-las em reservas indígenas.

Só essa alteração nas regras deve ser suficiente para atrasar a demarcação de alguns projetos.

Se o Governo não aprender com essas derrotas em série no Congresso, a tensão entre os poderes Executivo e Legislativo pode aumentar.

E nem sempre o Judiciário vai conseguir dar a ajudinha que Lula precisa. Entregar alguns anéis, nesse momento, parece mais sensato que perder os dedos.