Editorial
Só o bom senso pode salvar a humanidade
Mais do que nunca, os governantes mundiais carecem de bom senso, humildade e sensatez para superar o radicalismo
A aparente calmaria na manhã do sábado, 7 de outubro, em Israel, foi interrompida por sons aterrorizantes e estridentes de sirenes que anunciavam que algo não estava bem, enquanto ainda ocorria o Simchat Torá, um feriado que ocorre no final do festival judaico de uma semana conhecido como Sucot, ou Festa dos Tabernáculos.
Segundo o site GotQuestion, é dessa forma que os judeus celebram a união e a igualdade de direitos e se alegram. Todos pegam a Torá fechada e dançam com ela nos braços.
O ato encerra uma grande lição: se os festejos fossem realizados com a Torá aberta, com sua leitura, haveria distinções entre um judeu e outro, pois a compreensão e o conhecimento de cada um são diferentes.
No sábado, as casas estavam desprotegidas, com portas e janelas abertas.
O Hamas, o maior grupo armado palestino, e que há tempos vinha se preparando para atacar, tinha consciência de que Israel estava um tanto quanto distraído naqueles dois dias.
Com a chamada Operação Al-Aqsa Flood, o Hamas entrou em Israel, inicialmente com motos, invadiu bairros, sequestrou civis em suas casas e nas ruas.
Ao mesmo tempo, atiradores começaram a alvejar pessoas.
Famílias inteiras foram mortas.
Na sequência, artilharia pesada foi lançada contra as posições de Israel por terra, céu e mar.
Houve retaliação israelense e destruição e mortos também em Gaza, governado pelo Hamas e de onde partiu o ataque.
Gerações acompanham os tristes capítulos dos conflitos no Oriente Médio, entre israelenses e palestinos, que já destruíram milhares de vidas.
O surgimento dos povos israelense e palestino está ligado à história de Abraão, que recebeu, segundo os textos religiosos, a missão de migrar para a “terra prometida”, em Canaã, antigo país dos cananeus, depois chamado de Palestina, onde hoje se localiza o Estado de Israel.
A Bíblia conta que Abraão teve dois filhos: Ismael e Isaque. O primeiro nasceu de sua relação com Agar, serva de sua esposa, Sara; já o segundo, concebido pela sua própria cônjuge, nasceu com a fama de ser o “filho da promessa”.
Deus, no entanto, prometeu que ambos iriam prosperar e estariam ligados a grandes nações: os hebreus (judeus) e os muçulmanos (árabes).
As terras palestinas foram divididas em 12 partes, as chamadas tribos de Israel, que se encontravam em conflito contra os filisteus.
Mesmo com a criação do Reino de Judá e do Reino de Israel, o conflito só aumentou.
Logo após o lançamento dos primeiros mísseis pelo Hamas, no sábado, lideranças internacionais condenaram os ataques, considerando-os ações terroristas, e iniciaram reuniões para a discussão da situação.
O papa Francisco pediu, no domingo (8), após a oração do Angelus, na praça de São Pedro, no Vaticano, o fim dos ataques e destacou que “o terrorismo e a guerra não levam a solução nenhuma”.
Ainda, no sábado, foi convocada, para o dia seguinte, uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), sob a presidência do Brasil, exclusivamente, sobre o conflito em Israel.
Porém, o encontro a portas fechadas, em Nova York, terminou sem nenhuma declaração final.
A situação no Oriente Médio é tão ímpar, que até mesmo Vladimir Putin -- presidente russo e responsável pela guerra contra a Ucrânia --, expressou preocupação.
A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, apelou a palestinos e israelenses “para que implementem um cessar-fogo imediato, renunciem à violência, exerçam a contenção necessária e estabeleçam, com a assistência da comunidade internacional, um processo de negociação destinado a estabelecer uma paz abrangente, duradoura e há muito esperada”.
Paralelamente às questões humanitárias, o novo conflito gera preocupação generalizada com os possíveis efeitos à economia global e prejuízos às negociações geopolíticas, incluindo um acordo histórico entre Arábia Saudita, Estados Unidos e Israel, com garantias de segurança do governo Joe Biden à Arábia Saudita em troca do reconhecimento do Estado de Israel -- criado oficialmente em 1948 e ainda não assimilado por alguns governos.
Tudo isso, enquanto Washington e Teerã conversam para reverter a escalada da ameaça nuclear.
No entanto, apesar de todos os “esforços”, nada de concreto foi feito para estabelecer o diálogo e a paz entre árabes e judeus, a exemplo do que ocorre há 600 dias entre russos e ucranianos.
Tanto em um como no outro caso, as ações bélicas têm origem na disputa por territórios e poder.
A preocupação de que o novo conflito sangrento -- Israel-Hamas -- se prolongue, em meio à fragilidade das relações mundiais, somadas à guerra entre Rússia e Ucrânia, e às incertezas que vêm da China e da Coreia do Norte, acendem um alerta sem precedentes: mais do que nunca, os governantes mundiais -- senhores da razão e do destino -- carecem de bom senso, humildade e sensatez para superar o radicalismo.
A paz e o próprio futuro da humanidade dependem disso.