Editorial
Cobertor curto
Para custear esse gasto extra, o INSS já alertou a equipe econômica que vai precisar de um aporte de recursos ao orçamento
O trabalhador brasileiro recolhe, todos os meses, sua contribuição para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O órgão foi criado em 1990 com a fusão do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que administrava os benefícios recebidos por aposentados e pensionistas, com o Instituto de Administração Financeira da Previdência Social (IAPAS), que era responsável por arrecadar as contribuições e fiscalizar.
Ao longo dos anos esse sistema foi encontrando dificuldades de gerenciamento. A arrecadação era deficitária e o cenário indicava um colapso no futuro. O risco era grande de muita gente ficar sem receber os benefícios. O problema foi praticamente resolvido, em 2019, com a reforma da previdência aprovada pelo Congresso Nacional.
Mesmo assim, vários gargalos permaneceram e o atendimento ao segurado e ao aposentado sempre deixou a desejar. A situação se agravou ainda mais, durante a pandemia. Muitos serviços foram suspensos e uma enorme fila de processos se formou.
Há quase dois meses, o governo federal lançou um programa para reduzir essa fila, mas a lentidão na análise dos pedidos continua atrapalhando a vida de parcela significativa da população.
A diferença é que agora não são vistas mais as enormes filas na porta das agências do INSS. Com o sistema quase todo automatizado, o drama dos cidadãos deixa de chamar a atenção e de virar pauta nos noticiários.
Antes do lançamento do programa, em julho, quase 1,8 milhão de pessoas esperavam atendimento. A maioria procura benefícios assistenciais ou mesmo previdenciários, como a desejada aposentadoria. Só aguardando perícia médica são 600 mil brasileiros, muitos deles já poderiam ter voltado ao trabalho se seus processos andassem com a devida celeridade.
De acordo com dados de agosto, do Portal da Transparência, a fila, com todo o esforço prometido pelo governo, caiu cerca de 6%. Para que isso ocorresse, o ministério passou a pagar um bônus aos funcionários que topassem trabalhar fora do horário de expediente. Isso significa que o governo atual decidiu pagar mais para que os próprios funcionários, responsáveis pela fila, resolvessem o problema. Esse incentivo financeiro só faz com que a fila nunca termine. Qual o interesse de “A” ou “B” em acabar com o extra oferecido de mão beijada pelo Estado.
No fim das contas, como sempre, esse prejuízo vai parar no nosso bolso. Para custear esse gasto extra, o INSS já alertou a equipe econômica que vai precisar de um aporte a mais de recursos do orçamento. O pedido está na casa dos R$ 3,2 bilhões só para este ano.
A justificativa do órgão é que a redução da fila de segurados fez aumentar o número de concessões de benefícios, tornando necessária a ampliação dessa despesa em R$ 1,646 bilhão. O órgão diz ainda que a previsão de gastos com a compensação previdenciária cresceu R$ 1,595 bilhão, o que também demandará ajuste no Orçamento.
Como esses pagamentos são despesas obrigatórias, vai ser impossível o governo escapar desse aporte. Um baque extra para as contas do Tesouro que mês a mês vem acumulando déficits. O remanejamento desse dinheiro dos cofres públicos para a previdência vai obrigar o governo a bloquear recursos de outros ministérios. A falta de espaço para manobras orçamentárias é cada vez maior.
O ministro Carlos Lupi tem garantido, em entrevistas e audiências no Congresso, que pretende acabar com a fila do INSS até dezembro. Para agilizar esse processo ela autorizou a contratação de 1.250 servidores aprovados em concurso. A notícia parece boa para quem depende do INSS, mas com o aumento de segurados no sistema, o governo vai precisar desembolsar muito mais dinheiro. Resta saber de onde esse extra será tirado já que para o orçamento de 2024 houve redução na verba destinada ao INSS.
A falta de coordenação política e de comunicação entre os ministérios faz com que fique, cada vez mais distante, a promessa de zerar o déficit público no ano que vem. A situação pode piorar ainda mais se a reforma tributária não for aprovada este ano.