Editorial
Cortesia com chapéu alheio
Foi o dinheiro de nossos impostos que custeou toda essa expertise no campo agrícola
O Brasil tornou-se, nas últimas décadas, um dos maiores produtores mundiais de alimentos.
Todo esse avanço se deu por conta da obstinação de nossos agricultores, que buscaram, sempre, produzir mais, com qualidade e numa área menor.
Para se conquistar esse posto, foi necessário muito esforço e trabalho não só no campo, mas, também, nos diversos centros de pesquisa espalhados pelo país.
Atualmente, enfrentamos, de igual para igual, qualquer nação do planeta.
Temos a capacidade de tirar da terra até três safras por ano, numa mesma área, sem que isso comprometa o solo e a produtividade.
Esse tipo de conhecimento vale ouro.
Cientistas do mundo todo buscam, em seus laboratórios, a mesma eficiência que o Brasil conquistou.
Só que esses segredos, que tanto beneficiam nossa economia, estão em risco.
O governo federal pretende, mais uma vez, oferecer de graça, para outras nações um patrimônio que é do povo brasileiro.
É o que prometeu Lula em sua viagem à Angola.
O presidente garantiu ao país africano que o Brasil vai auxiliar o governo de lá a promover uma revolução agrícola.
Em seu discurso, o presidente brasileiro disse que o acordo incluirá desde pesquisa agropecuária até capacitação para a implementação de políticas de crédito para pequenos produtores.
O problema é que, para isso ocorrer, muitas pesquisas feitas aqui serão dadas de graça, sem nenhuma contrapartida.
Essa não é a primeira vez que Lula faz isso.
Em seu primeiro mandato, ele já obrigou que os pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, a Embrapa, liberassem para vários países africanos os resultados e avanços de vários estudos feitos com grãos aqui no país.
Na época, a decisão desagradou muitas das nossas mentes mais brilhantes em termos de desenvolvimento de tecnologia agrícola.
São pesquisadores abnegados que lutam contra a falta de recursos para manter vivas suas experiências e, quando o resultado positivo chega, nada recebem em termos de compensação.
Entregar, de mão beijada, décadas de trabalho árduo só serve para desmotivar os que se dedicam a produzir ciência no Brasil.
A Embrapa e suas pesquisas não pertencem a Lula e sim ao povo brasileiro que há mais de cinquenta anos paga a conta de toda essa estrutura de desenvolvimento tecnológico.
A empresa pública foi criada em 1972, pelo presidente Médici.
O governo da época percebeu que a agricultura se intensificava cada vez mais no país e era necessário dar suporte técnico para o homem do campo.
O aumento acelerado da população e da renda per capita, e a abertura de negócios para o mercado externo mostravam que, sem investimentos em ciências agrárias, o país não conseguiria reduzir o diferencial entre o crescimento da demanda e o da oferta de alimentos e fibras.
Foi assim, com esse incentivo, que surgiram os primeiros centros de pesquisa.
Nessas cinco décadas, a Embrapa deixou de ser um sonho e hoje possuiu 38 unidades espalhadas pelo território nacional.
O avanço na produção de soja no Brasil deve-se, quase que totalmente, aos estudos da Embrapa.
O grão veio da Ásia e era desconhecido dos agricultores.
Dominar o seu cultivo e desenvolver sementes adequadas para cada tipo de solo e de clima foi um dos mais importantes trabalhos da história da agricultura brasileira.
O sucesso desse trabalho é que coloca, hoje, o Brasil no topo do ranking da produção mundial de alimentos.
Esse tipo de conhecimento não pode ser desprezado, nem doado a bel prazer desse ou daquele governante.
É importante que o Brasil possa ajudar as nações mais pobres a produzir seus próprios alimentos, mas não é justo que nenhuma contrapartida seja dada a quem pagou pelo desenvolvimento de todas essas pesquisas.
Foi o dinheiro de nossos impostos que custeou toda essa expertise no campo agrícola.
Ao assinar parcerias com Angola, oferecendo ajuda na produção de alimentos, Lula abre mão de boa parte do conhecimento produzido pela nossa ciência e ainda expõe o Brasil ao risco de que multinacionais que atuam no país africano se apropriem dessas pesquisas e as implementem em outras nações que concorrem no mercado mundial com os produtos aqui produzidos.
Ao fazer cortesia com chapéu alheio, o atual governante do país está jogando contra a própria nação.
Tudo na tentativa de melhorar sua imagem internacional e ganhar uns míseros aplausos.
O prejuízo desse tipo de atitude vai ser sentido com o passar dos anos.