Editorial
No caminho certo, mas num ritmo lento
A melhor notícia do relatório é que a taxa de mortes violentas intencionais caiu 2,4% no Brasil em 2022 na comparação com 2021

Os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) trouxe um panorama bastante interessante da atual situação brasileira. Alguns tabus foram quebrados e vários sinais de alerta disparados.
A melhor notícia do relatório é que a taxa de mortes violentas intencionais caiu 2,4% no Brasil em 2022 na comparação com 2021. Foi o segundo ano consecutivo de queda. Mesmo assim, os números ainda são preocupantes. Foram 47.508 mortes, o segundo menor da série histórica iniciada em 2011. Isso equivale a 130 mortes por dia, ou, se você preferir um pouco mais de precisão, cinco por hora. A taxa de mortes violentas intencionais (MVI) passou de 24 para cada 100 mil habitantes em 2021, para 23,4 a cada 100 mil no ano passado. Número melhor que o registrado em países como México, Colômbia, Venezuela e África do Sul.
As unidades da federação que tiveram as menores taxas de violência letal foram São Paulo, com 8,4 mortes por 100 mil habitantes, Santa Catarina, com 9,1 por 100 mil, e o Distrito Federal, com taxa de 11,3. Ao todo, 20 Estados registraram taxas de MVI acima da média nacional.
Para Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do FBSP, vale a pena destacar que apesar de as mortes violentas intencionais seguirem caindo, é importante observar que essa queda passou a ter um ritmo menor em relação aos anos anteriores. Em 2019, foram 10 mil homicídios a menos que em 2018. Na comparação deste ano, a diminuição não chegou a mil casos.
Os números só não foram melhores por causa da influência de São Paulo. Apesar do Estado ter a menor taxa de letalidade do País, houve alta de 1,3% no número de mortes em 2022. Foram 3.735 casos contra 3.666 no ano de 2021.
Apesar desse aumento de mortes, em São Paulo houve redução nos casos envolvendo a atuação de policiais. Foram 419 casos, contra 570 no ano anterior. Esse número ajudou a derrubar o índice nacional. No Brasil todo foram registradas 6.430 mortes em confrontos com participação da polícia contra 6.524, em 2021.
O anuário mostrou também que o perfil de assassinados em 2022 não mudou muito na comparação com os anos anteriores. A maioria das mortes envolveu pessoas negras, entre 12 e 29 anos, majoritariamente do sexo masculino. Dado que reforça a necessidade de ampliar o desmonte de organizações criminosas que operam, principalmente, o tráfico de drogas no Brasil. São essas quadrilhas que montam verdadeiros exércitos paramilitares que servem não só para proteger as áreas dominadas como se envolver na guerra por novos territórios e no confronto com as autoridades policiais. As quadrilhas e organizações criminosas acabam cooptando jovens das comunidades pobres para atuar no crime e são essas as principais vítimas da violência do País, como detalha o anuário. Não há como reverter esse quadro absurdo de mortes, sem mexer nesse vespeiro.
Outro ponto de alerta, apontado pelo relatório, é o crescimento do número de casos de feminicídio. A alta foi de 6,1%. Foram registrados 1.437 casos, ante 1.347 em 2021. A taxa chegou a 1,4 ocorrência a cada 100 mil habitantes. São Paulo e Rio Grande do Norte têm a menor taxa do País (0,9), mas, também nesse recorte, houve aumento expressivo de mortes no ano passado (42,6%). Foram registrados 195 casos só em território paulista.
Na visão de Juliana Martins, coordenadora institucional do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o grande desafio é como proteger essas mulheres se, na maioria das vezes, a violência acontece dentro de casa. E nem sempre as medidas judiciais de proteção são suficientes para garantir a segurança dessas vítimas.
O Brasil ainda tem muito a caminhar para se tornar um país menos violento. Vai ser preciso muito esforço conjunto das autoridades de todas as esferas públicas para que seja possível reduzir esses números. O problema é que as divergências ideológicas, como sempre, podem ser um grande empecilho para que isso ocorra. Se não houver diálogo e ação, muitas famílias ainda vão chorar a perda de seus entes queridos.