Editorial
Impasse de verão
Cresce a preocupação com os possíveis efeitos do aquecimento global e a dúvida que mais preocupa é se ainda há tempo de reverter esse processo
O Hemisfério Norte está mergulhado numa onda de calor extremo. O verão começou há menos de um mês e os efeitos, em muitos países, são devastadores. Incêndios, mortes, racionamento de água, tudo contribui para deixar a situação ainda mais sufocante. Não são poucas as cenas de famílias inteiras aproveitando fontes de água espalhadas pelas cidades para se refrescar.
As altas temperaturas acendem um sinal de alerta em muitas mentes. Cresce a preocupação com os possíveis efeitos do aquecimento global e a dúvida que mais preocupa é se ainda há tempo de reverter esse processo. Diante desse questionamento, países da América Latina e da União Europeia estão reunidos em Bruxelas. A pauta, apesar de abrangente, sempre esbarra no desafio da preservação ambiental e da sustentabilidade. Países que passaram décadas queimando combustíveis fósseis e destruindo a natureza para crescer, agora querem limitar o progresso de nações ainda em desenvolvimento obrigando-as a reservar boa parte de sua área territorial em benefício dos outros habitantes do planeta. Como essas nações são mais ricas, apelam sempre para as ameaças e boicotes ao invés de oferecer uma gorda soma financeira para compensar o esforço pedido aos outros. Enquanto o impasse perdura, a Terra vai enviando seus sinais, cada vez mais claros.
O Hemisfério Norte começou a semana enfrentando temperaturas devastadoras. Isso obrigou as autoridades a emitir alertas de saúde e reacendeu focos de incêndio, que pareciam controlados.
Na Sardenha, uma ilha italiana em pleno Mediterrâneo, a temperatura pode chegar, nos próximos dias, a 48°C. Em Roma, os termômetros devem marcar, ainda hoje, 42ºC, o que seria um recorde absoluto de calor para essa capital que já viveu muita história através dos séculos.
Na Espanha, que já passou por uma semana sufocante, a agência meteorológica emitiu um alerta laranja para mais uma temporada de “temperaturas elevadas”, entre 38 e 42ºC em grande parte do país. Se isso se confirmar, o país estará atravessando uma longa fase com termômetros entre 5 e 10 graus acima da média histórica. Algumas regiões espanholas, como a Andaluzia, a situação prevista é ainda pior e já foi acionado o alerta vermelho. Em alguns momentos do dia, a população pode enfrentar temperaturas próximas dos 44ºC.
Na Grécia, além do calor, a população sofre com os incêndios florestais. Áreas inteiras estão sendo evacuadas para proteger a população. O vento forte e ar seco acabam acelerando a propagação das chamas e o risco de uma família perder tudo que construiu em uma vida toda é grande.
O mesmo problema que se vê na Europa é sentido nos Estados Unidos. Os serviços meteorológicos do país apontam para uma onda de calor “opressiva”, principalmente no sul do país. As temperaturas devem bater recordes. No Vale da Morte, na Califórnia, um dos lugares mais quentes do planeta, a temperatura oficial atingiu 51ºC no sábado.
Nem o costumeiramente frio Canadá vai escapar dos efeitos do calor neste verão. Mais de 10 milhões de hectares já foram destruídos por incêndios desde o início do ano. Nesta segunda, 882 focos permaneciam ativos, incluindo 579 considerados fora de controle, de acordo com o Centro Canadense de Incêndios Florestais (CIFFC, na sigla em inglês). Dois bombeiros morreram no combate ao fogo. A China também registrou temperaturas recordes, na casa de 52,2ºC, na região de Xinjiang.
Ano a ano, os moradores do Hemisfério Norte têm sofrido cada vez mais com o calor. É justo que eles tenham uma preocupação extra com o aquecimento global. O problema é querer transferir o custo dessa conta para quem tem pouca culpa nessa história. As antigas colônias do Sul só não estão mais preservadas atualmente por conta da exploração vivida no período que eram dominadas pela ganância dos colonizadores. Os países que ficam abaixo da linha do Equador enviaram boa parte de suas riquezas naturais e minerais para financiar os reinos do Norte. Foi graças a esses produtos, forçosamente exportados, que grandes nações foram construídas. Agora essas mesmas nações querem, novamente, que o Sul pague a conta e salve o planeta. Resta saber se esse apelo vai colar mais uma vez.