Buscar no Cruzeiro

Buscar

Editorial

Quando a esmola é muita

Com o desemprego em níveis preocupantes, a busca por uma vaga está em alta, um prato cheio para criminosos que só querem tirar vantagem

06 de Julho de 2023 às 23:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Parece, mas não é
Parece, mas não é (Crédito: Rafael Neddermeyer / Fotos Públicas)

É triste imaginar um pai e uma mãe de família desempregados, sem ter dinheiro sequer para levar comida para casa. Os boletos e contas acumulando sobre a mesa e as dívidas só aumentando. Bate aquela angústia e o impulso de abreviar, logo, esse tipo de situação. O mesmo vale para um jovem, recém-formado, que precisa ajudar nas contas da casa, e busca uma oportunidade no mercado de trabalho. O desespero só aumenta depois que várias tentativas de encontrar um emprego são frustradas por processos seletivos cada vez mais exigentes. Centenas de currículos distribuídos e nada de uma resposta positiva.

Nesses momentos, o raciocínio falha, os olhos não enxergam mais os detalhes e a pessoa acaba mais suscetível a acreditar numa oferta maravilhosa que pode resolver boa parte dos problemas. Só que, na maioria das vezes, a promessa de ganho fácil ou de recolocação rápida esconde uma armadilha. Um golpe que sangra os últimos recursos da família e causa muita revolta.

Revolta em perceber que o mundo está cheio de indivíduos capazes de explorar a fragilidade humana e se aproveitar dos momentos mais difíceis para levar vantagem. Com o desemprego em níveis preocupantes, a busca por uma vaga está em alta, um prato cheio para criminosos que só querem tirar vantagem desse tipo de situação. Os golpes chegam por vários caminhos, SMS, e-mail, WhatsApp, redes sociais. Eles são cada vez mais elaborados e exigem atenção em dobro.

Segundo os especialistas em cibersegurança, a armadilha mais frequente consiste em enviar uma falsa vaga de uma grande empresa com a promessa de alto salário. Geralmente, na mensagem os criminosos adicionam um link para que a pessoa se candidate. Na página, eles solicitam os dados pessoais que podem ser usados em fraudes como clonagem de cartão, abertura de contas em bancos e logins em aplicativos. Os estelionatários usam esse tipo de “isca” para atrair e se aproveitar de uma série de informações pessoais. Alguns deles vão além e exigem dinheiro para uma falsa inscrição e até vendem apostilas para que o candidato se prepare melhor para a disputa da vaga no processo seletivo. Evitar esses links maliciosos é fundamental para escapar desse tipo de abordagem. É sempre importante ter em mente que quando a esmola é muita, até o santo desconfia.

Aqui em Sorocaba, no mês passado, a situação se agravou tanto que o Hospital Santa Lucinda precisou emitir uma nota alertando as pessoas que as vagas oferecidas em nome da entidade eram falsas. Como mostrou reportagem do jornal Cruzeiro do Sul, a nota publicada pela Fundação São Paulo -- mantenedora da unidade de saúde -- esclareceu que qualquer oferta de emprego é apresentada somente para pessoas já cadastradas pela área de Recursos Humanos da entidade e que não solicita qualquer tipo de pagamento dos candidatos para participar de seus processos seletivos ou de treinamentos.

A presidente da Associação dos Profissionais em Recursos Humanos de Sorocaba e Região (APRH), Ana Carolina Jacção, em entrevista, lembrou que a prática de aplicar golpes com oferta falsa de emprego é antiga. Atualmente, com as redes sociais, os falsos anúncios se potencializaram e são acessados rapidamente por centenas de usuários. A forma de atuação do golpista pode variar de acordo com o objetivo do criminoso. “A prática mais antiga é o acesso a dados sensíveis, que no passado servia, inclusive, para falsificação de documentos, e hoje com o aumento da segurança digital, serve para cadastros e tentativas de crédito digital ou contas ‘laranjas’”, explicou Ana Carolina. Outro método muito comum, atualmente, é a cobrança de taxas para o processo seletivo e o posterior sumiço dos falsos recrutadores após o pagamento.

O importante, em todos os casos, é estar atento aos detalhes da oferta. Verificar a origem da mensagem, checar a forma como o texto foi escrito e suspeitar de benefícios em excesso. Essas regras valem para todas as propostas que vêm pelo sistema virtual. Os golpistas sabem mexer com os sentimentos das pessoas e isso acaba atraindo um número cada vez maior de vítimas. Devemos não só tomar todos os cuidados possíveis, mas também ajudar aquelas pessoas de mais idade e de menor instrução que acabam sendo iludidas com maior facilidade.

Apostar somente na segurança dos sistemas não é o único caminho. A cada porta fechada para o estelionato, os golpistas conseguem abrir outros atalhos para continuar enganando os incautos e lucrando com as brechas abertas pela facilidade que a tecnologia proporciona.