Editorial
Falta freio para a nova geração
Se a internet e as redes sociais, com esse tipo de alerta, ajudam a prevenir o pior, elas acabam contribuindo também para outros tipos de crime

Alguns vídeos, com uma série de crimes e infrações cometidas por jovens e adolescentes, têm chamado bastante a atenção nas redes sociais. Num deles é mostrado o ataque a um ônibus, na França. Os infratores aproveitam uma rua onde o veículo é obrigado a circular mais lentamente para abrir o porta-malas e saquear a bagagem dos passageiros. As cenas mostram os adolescentes se arriscando para roubar, enquanto isso, uma outra parte deles comemora o feito.
Um outro vídeo, este em Marselha, também na França, exibe um imenso acampamento de jovens refugiados, muitos deles drogados, instalados numa das avenidas da cidade. As cenas são muito parecidas com aquilo que se vê na Cracolândia, em São Paulo.
Outros dois vídeos se passam no Rio de Janeiro. Jovens fortemente armados, ligados a uma facção criminosa que opera no Estado, montam uma barreira para fiscalizar e assediar os motoristas que entram na comunidade. Os fuzis são apontados sem dó nem piedade e, por falta de alternativa, só resta aos amedrontados condutores obedecer a ordem sob risco de levar um tiro.
O outro vídeo se passa num baile funk. Duas jovens com idades próximas aos quinze anos contam um pouco de sua rotina ao entrevistador. Elas se vangloriam de não estudar, de não se preocupar com o futuro e de namorar traficantes de drogas.
Essas quatro histórias, publicadas aleatoriamente nas redes sociais, traçam um quadro preocupante da falta de rumo que vem causando sérios estragos na formação das futuras gerações. Se a internet e as redes sociais, com esse tipo de alerta, ajudam a prevenir o pior, elas acabam contribuindo também para outros tipos de crime.
Na terça-feira, 27, policiais civis da Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima deflagraram a Operação Dark Room e apreenderam dois adolescentes apontados como responsáveis por praticar estupros e de induzir meninas a automutilação e suicídio por meio da plataforma Discord. Um dos infratores apreendidos, de apenas 17 anos de idade, é considerado um dos mentores do grupo.
A ação ocorreu na zona oeste da capital fluminense e no município de Volta Redonda. As investigações começaram em março deste ano, após compartilhamento de dados de inteligência com a Polícia Federal e polícias civis de diversos Estados. Durante a apuração, foram constatados vários crimes cometidos por jovens e adolescentes na plataforma Discord, um aplicativo de comunicação com suporte a mensagens de texto, voz e chamadas de vídeo. De acordo com as investigações, a plataforma era utilizada por vários integrantes espalhados pelo País para cometer, em transmissões ao vivo pela internet, atos de violência contra animais e adolescentes, além de divulgar pedofilia, zoofilia e fazer apologia ao racismo e nazismo.
Segundo a corporação, adolescentes também eram chantageadas e constrangidas a se tornar escravas sexuais dos líderes, que cometiam “estupros virtuais”, também transmitidos ao vivo. Durante o ato, as meninas eram xingadas, humilhadas e obrigadas a se automutilar.
O Discord já estava na mira da polícia por permitir a criação de canais com conteúdos que fazem apologia ao nazismo, racismo, pedofilia e exploração sexual. Em sua defesa, o Discord mantém, no site, uma extensa lista de orientações à comunidade. Atualizadas em fevereiro 2023, as normas incluem: não encorajar, coordenar ou se envolver em situações de assédio e não usar discurso de ódio ou se envolver em outras condutas odiosas. Segundo a plataforma, em caso de violação das diretrizes, o aplicativo pode atuar com a “remoção de conteúdo, suspensão ou remoção das contas e/ou servidores responsáveis, além de possíveis denúncias às autoridades policiais”. Só que essas diretrizes nem sempre são compridas e o que se nota é uma lentidão dos responsáveis em tomar as devidas providências contra os que cometem abusos.
O que mais preocupa, diante de todos esses exemplos aqui listados, é a falta da capacidade dos jovens e adolescentes atuais em discernir o que é certo e o que é errado e as suas consequências presentes e futuras. As ferramentas de comunicação atuais, se bem utilizadas, são fantásticas para o desenvolvimento de mentes brilhantes. O problema é que podem se tornar também uma arma perigosa nas mãos dos mal-intencionados.