Editorial
Efeito borboleta
O que se vê, o tempo todo, é que qualquer mudança de humor na cúpula dos partidos, em Brasília, atinge diretamente a base de Tarcísio na Alesp

“O simples bater de asas de uma borboleta no sudoeste asiático pode ocasionar um terremoto na Califórnia”. Essa teoria, com centenas de variáveis geográficas, serve para exemplificar que tudo no mundo está interligado. E nem sempre é possível avaliar os efeitos de um fenômeno olhando somente para fatores próximos ao ocorrido.
A teoria do “Efeito Borboleta” foi proposta, inicialmente, por Edward Lorenz, em 1969, no 139º American Association for the Advancement of Science (Encontro da Associação Americana para o Avanço da Ciência). Na época, Lorenz, professor do Instituto de Tecnologia Meteorológica de Massachusetts, referia-se à impossibilidade de previsão de fenômenos atmosféricos por mais que alguns dias.
Segundo essa premissa, ao realizar um bater de asas, a borboleta promove uma modificação na pressão do ar que está em sua proximidade, fazendo com que seja direcionada para cima. Entretanto, a alteração da pressão é cerca de 100 mil vezes inferior que a pressão total do ar circundante, tornando-a facilmente absorvida pelas moléculas do meio e propagando a turbulência ocasionada pelo movimento das asas por apenas poucos centímetros.
Só que esse simples deslocamento poderia interferir em tudo ao seu redor e provocar uma onda de mudanças. E é assim que vivemos o nosso dia a dia. Ações que nem sempre são por nós compreendidas acabam afetando o rumo das nossas vidas.
Na política, isso também ocorre o tempo todo. O governador paulista, Tarcísio de Freitas, engenheiro por formação, sabe bem disso e está atento ao desenrolar das negociações partidárias em Brasília e como isso pode interferir no seu desempenho administrativo. E nem sempre essas surpresas vêm da oposição.
A possível aproximação do Republicanos, partido de Tarcísio, à base aliada de Lula causou irritação no PL, sigla de Jair Bolsonaro. O recado veio logo, numa votação na Assembleia Legislativa. No dia 6 de junho, o governo estadual falhou na hora de conseguir o quórum para aprovar a tramitação em urgência de um projeto de 2021 que aumenta as taxas processuais cobradas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.
Deputados que participaram das negociações relataram que enquanto o líder de governo Jorge Wilson (Republicanos) pedia a presença de todos para votar pela proposta, o deputado Gil Diniz (PL) solicitava que os aliados não fossem ao plenário. Sem os votos do PL, a proposta acabou sendo apoiada por apenas 26 deputados, e não passou.
Outro exemplo do desgaste da base de Tarcísio aconteceu na terça-feira, 20, quando o governo não conseguiu alcançar número mínimo de deputados para votar um projeto de lei que autoriza contratação de empréstimo para a construção do trem São Paulo-Campinas. Na ocasião, até os deputados considerados governistas do União Brasil, partido que já está no Governo Lula, obstruíram a votação, e o projeto não foi votado.
Um dia depois, com mais conversa e negociação, o cenário mudou e foi possível aprovar a proposta.
O líder de governo Jorge Wilson nega que exista dificuldade de articulação. Como prova do bom momento, justifica que todos os projetos enviados pelo Executivo à Alesp, até agora, foram aprovados. Aliados de Tarcísio no Palácio do Bandeirantes também veem uma base mais unida agora do que no início do Governo. Só que essa união não é tão estável assim.
Não foram poucas as críticas dos bolsonaristas a algumas posições adotadas por Tarcísio até agora. A exibição de um documentário com críticas à extrema direita e aos atos do dia 8 de janeiro, na TV Cultura, gerou muita pressão para que a secretária estadual que cuida da pasta fosse demitida. A liberação de verbas para a organização da Parada do Orgulho LGBT+ foi outro ponto de atrito, embora a dotação já estivesse no orçamento aprovado para este ano.
O que se vê, o tempo todo, é que qualquer mudança de humor na cúpula dos partidos, em Brasília, atinge diretamente a base de Tarcísio na Alesp. O governador vai precisar de muito jogo de cintura para driblar todas essas armadilhas. É preciso também vigiar as borboletas, para antecipar os terremotos que o bater das asas delas pode causar em solo paulista.