Editorial
Prudência e caldo de galinha
Qualquer medida que aumente o custo da produção no campo pode desestimular o setor e transformar o que é sucesso num grande problema social

O Ministério da Agricultura anunciou, para o início da semana que vem, o lançamento do Plano Safra 2023/24 empresarial. Os detalhes ainda não foram fornecidos e a expectativa é de que haja uma restruturação e até mesmo um fortalecimento das linhas de crédito. Se isso for confirmado, essa será uma boa oportunidade de reduzir as diferenças ideológicas entre o Governo Lula e o agronegócio. Se o resultado ficar abaixo da expectativa dos produtores rurais, pode haver um novo racha no setor.
Outra questão que deve ser levada em conta é a quantidade de recursos e vantagens que deve ser fornecida aos agricultores familiares. O plano para esse grupo será anunciado um dia depois do plano empresarial.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, explicou que a divulgação em dias diferentes reforça os perfis dos ministérios da Agricultura e Pecuária e o do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA). Segundo ele, enquanto o MDA tem como foco os pequenos produtores adeptos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), o Ministério da Agricultura foca em médios e grandes produtores.
Já o ministro do MDA, Paulo Teixeira, afirmou nas redes sociais que este será “o maior Plano Safra da história do Brasil”. Teixeira disse que haverá “muitos estímulos no sentido da produção de alimentos à transição ecológica”. Resta saber o que isso significa e qual o impacto na vida dos nossos produtores rurais. O governo deve ter em mente, sempre, que o Brasil é um importante “player” no cenário mundial e a população do planeta conta com os grãos produzidos aqui para se alimentar.
Prova dessa importância está num relatório recente da FAO, Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura. A FAO espera uma grande expansão da produção agrícola brasileira nos anos de 2023 e 2024. Esse aumento na quantidade de alimentos ajudaria a conter a inflação global e a derrubar os preços internacionais. Segundo o levantamento, o crescimento das safras de milho e de soja brasileiras seria fundamental para garantir fartura na mesa de milhões de pessoas.
A FAO estima que a produção mundial de grãos deve aumentar cerca de 3% em 2023 na comparação com 2022. Isso significa que o planeta atingiria a marca de 1,513 bilhão de toneladas. A maior parte desse crescimento deve vir dos Estados Unidos, do Brasil e de algumas localidades da União Europeia. Resta saber de que forma a guerra prolongada entre Rússia e Ucrânia vai afetar essa previsão.
A maior oferta de grãos, este ano, fez com que os preços internacionais das commodities agrícolas caíssem cerca de 9% entre janeiro e maio. Essa redução afeta diretamente o bolso dos nossos produtores rurais. A notícia, que parece boa, pode gerar um certo descompasso no campo. O agricultor ganhando menos, terá um menor incentivo a investir na qualidade da lavoura. Essa redução de cuidados pode levar a uma queda de produtividade e, por conseguinte, afetar a safra como um todo. Com menor quantidade de alimento disponível, o preço volta a subir e afeta todo a economia do planeta.
Diante desse cenário tão volátil, e num momento de baixa das cotações internacionais, é temerário exigir novas obrigações ambientais de nossos agricultores. Qualquer medida que aumente o custo da produção no campo pode desestimular o setor e transformar o que é sucesso atualmente num grande problema social.
Que o Governo Lula tenha compreensão suficiente para não transformar essa propalada “transição ecológica”, anunciada sem detalhamento pelo ministro Paulo Teixeira, num emaranhado de entraves para a vida de nossos produtores rurais.
O mundo precisa dos grãos produzidos aqui no Brasil, não só como fonte de alimento para milhões de pessoas, mas também como fator de equilíbrio para os preços das commodities no mercado internacional como um todo. Alterar esse quadro, sem o devido estudo e de forma precipitada, pode frustrar todo um ambiente de recuperação previsto pela própria FAO. O momento é de prudência e pé no chão.