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Editorial

Cada um em seu quadrado

A primeira "live" do presidente foi um fiasco e isso não se discute. A vantagem é que a falta de público pode ter sido benéfica para Lula

14 de Junho de 2023 às 23:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Presidente Lula em live
Presidente Lula em live (Crédito: Reprodução)

Preocupado com a queda de sua popularidade, como indicam as mais recentes pesquisas de opinião, o presidente Lula busca alternativas de comunicação para atingir o maior público possível. Nesta terça-feira (13), ele estreou no campo das “lives”, numa tentativa de copiar o que foi feito, com muito sucesso, por Jair Bolsonaro durante todo seu mandato. Só que o resultado foi desastroso.

Os números, nem de perto, se aproximaram dos conquistados por seu antecessor. A presença do experiente jornalista Marcos Uchôa, com décadas de trabalho na TV Globo, não foi suficiente para levantar o astral da transmissão, idealizada num modelão antigo, bem pouco atrativo.

Segundo os dados informados pelas plataformas digitais, a performance de Lula foi constrangedora. No YouTube, o número de visualizações simultâneas chegou a 5,8 mil; no Facebook, somaram 9,4 mil. No Twitter o resultado foi um pouco melhor, cerca de 34,5 mil visualizações, mesmo assim uma quantidade bem abaixo do esperado pelos idealizadores do projeto.

Para se ter uma ideia de comparação, no pior momento do Governo Bolsonaro, as “lives” dele arregimentavam cerca de 170 mil visualizações. Uma diferença e tanto.

Lula, além de não dominar a linguagem do meio digital, teve pouca novidade para contar. Foi quase um pedido de desculpas, ao vivo, tentando passar o pano para várias posições controversas de sua própria administração.

Um dos temas escolhidos por ele durante a entrevista foi o agronegócio, setor que está sempre em guerra com diversas alas da esquerda e do Partido dos Trabalhadores. Sem ter muito o que dizer em termos de feitos administrativos e de projetos, Lula tentou relembrar momentos do passado para tentar cativar esse público.

Procurou, o tempo todo, amenizar as diferenças ideológicas com o setor e chegou até a dizer que a agricultura brasileira teve um salto de qualidade em seus 8 anos de mandato, entre 2003 e 2010. O que não é verdade. Sua ministra do Meio Ambiente na época, Marina Silva, que voltou ao mesmo cargo agora, fez tudo para impedir a chegada das sementes transgênicas ao País.

Lutou com unhas e dentes para evitar que nossos agricultores tivessem o mesmo diferencial competitivo que os produtores do exterior, principalmente os dos Estados Unidos. Lula determinou à Embrapa que todas as pesquisas tecnológicas de melhoramento genético de várias culturas fossem dadas, de graça, para países africanos administrados por ditadores amigos.

Foram décadas de avanços e estudos feitos por nossos cientistas distribuídos, de mão beijada, a futuros concorrentes no cenário internacional. Foi também no Governo Lula que o País enfrentou uma das piores crises recentes de febre aftosa, retardando as exportações de carne bovina em quase uma década. Só alguém muito ingênuo, e que não conhece a realidade, acreditaria num monte de lorotas desse.

Lula ainda pregou, em sua “live”, a harmonia entre o agronegócio e o Movimento Sem Terra.

O presidente defendeu uma reforma agrária “tranquila e pacífica, sem guerra” e que caberia ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) realizar o levantamento de terras improdutivas, sem interferência dos manifestantes de movimentos sociais. Uma balela impossível de ser colocada em prática.

Durante a entrevista oficial, o petista ainda reclamou que quatro anos é pouco tempo para tudo que ele pretende fazer durante seu mandato. Chegou a dizer que “não há tempo a perder, para conversa fiada”, mas o que Lula mais tem feito é jogar conversa fora, no Brasil e no exterior, sem que seu governo avance de forma concreta em direção aos problemas reais do País. Nem uma base sólida, no Congresso, foi conquistada em seis meses de negociação e centenas de milhões de recursos em verbas públicas liberados. Sem arrumar a casa, Lula já se prepara para um novo tour internacional, essa sim uma marca forte de seu mandato.

A primeira “live” do presidente foi um fiasco e isso não se discute. A vantagem é que a falta de público pode ter sido benéfica para Lula já que, assim, ninguém viu o pouco conteúdo que o presidente da República tinha para apresentar. Os marqueteiros do Alvorada vão ter muito trabalho para enquadrar o discurso de um bom orador de porta de fábrica em algo que atraia o interesse que a internet e as redes sociais atualmente exigem. E pode ser que esse casamento nunca ocorra.