Editorial
O aprendizado que vem do Velho Mundo
A Festa do Tropeiro, com seu tradicional desfile, tem potencial para atrair muita gente e render bons negócios para o município
Milhares de cidades, em todo o mundo, fazem questão de preservar e cultuar suas tradições. Manter as origens vivas é importante não só para garantir que a história seja contada de maneira correta, como também possibilitar que as novas gerações conheçam e entendam o passado.
Sorocaba tem muito a aprender nesse aspecto. Apesar de ter vivido momentos marcantes desde a sua fundação, resiste em apoiar iniciativas que garantam e protejam a memória de parte importante de sua história. E isso não é de hoje.
Basta nos reportarmos a dois importantes países que ajudaram na formação da população sorocabana. Itália e Espanha tem muito a nos ensinar em termos de preservação da história e da memória. Para citar alguns poucos exemplos, fiquemos no Palio de Siena, na Toscana, e com as Festas de San Firmino em Pamplona, e da Tomatina em Buñol.
O Palio de Siena nada mais é que a disputa de uma corrida a cavalo entre representantes de várias comunidades da cidade. O vencedor fica com a bandeira (palio). Essa manifestação cultural, apesar de atrair milhares de turistas todos os anos em suas duas edições, não foi instituída com esse fim. O objetivo principal dela é garantir a unidade e o sentimento de pertencimento de toda a comunidade.
A origem exata no Palio se perdeu na história, mas as regras atuais da disputa foram definidas em 1644 e vigoram até hoje. O território da cidade foi dividido em dezessete “Bairros” cujas “fronteiras” foram definidas em 1729. São essas comunidades que se enfrentam. A disputa é tão séria que depois de escolhido o cavalo que vai representar aquela determinada parte da população, o jóquei acaba até dormindo com o animal para impedir que algo dê errado. O vencedor ganha fama eterna e vira um verdadeiro herói na cidade.
Mudando um pouco de ares, chegamos a Pamplona, no norte da Espanha. Lá a Festa de São Firmino, que dura nove dias, termina com uma correria de touros pelo centro da cidade. É um Deus nos acuda para escapar da força dos bichos em disparada pelas ruas estreitas. A tradição vem do século 15 e precisou de alguns ajustes, já neste século, depois do registro de várias mortes e da necessidade de se proteger um pouco mais os touros. Apesar da violência, a festa é uma paixão local e também atrai milhares de turistas.
Um pouco mais para o sul, em Valência, também na Espanha, se celebra, desde 1945, a Tomatina, uma verdadeira batalha de tomates. Os frutos são de uma variedade imprópria para consumo e são cultivados exatamente com o objetivo de manter a tradição e a guerra. No período da festa, a cidade também recebe milhares de turistas.
Sorocaba poderia estar no rol desses municípios que exploram bem a sua tradição. A Festa do Tropeiro, com seu tradicional desfile, tem potencial para atrair muita gente e render bons negócios para o município. Neste domingo (28), por exemplo, bastou um pequeno chamado para que quatro mil cavaleiros desfilassem pelas ruas da cidade. Além disso, comitivas de outras regiões enfrentaram estrada e poeira só para participar do evento. A capacidade de mobilização que essa festa tem é pouco dimensionada e tem muito potencial a ser desenvolvido.
O desfile, com direito a bênção aos participantes e show de música típica, teve alguns perrengues. Numa multidão como essa, casos isolados, brigas e confusões podem ocorrer, mas nada com capacidade de manchar a importância do evento e nem o resgate histórico que o ciclo do tropeirismo representa para a cidade.
O mês de maio está chegando ao fim. Para este ano vai ser impossível aprimorar a comemoração desse ciclo econômico que tanta riqueza proporcionou a Sorocaba. Temos agora o desafio de, nos próximos 365 dias, criar eventos e atividades, principalmente na área de educação, que ajudem a valorizar o movimento tropeiro na cidade.
Que um dia possamos ter orgulho dessa parte do nosso passado assim como tem os moradores de Siena com seu Palio, os de Pamplona, com sua Corrida de Touros, e os Buñol com sua guerra de tomates. Que a Festa do Tropeiro de 2024 nos encha de orgulho e sirva para atrair turistas e investimentos.