Editorial
Cabo de guerra entre democratas e republicanos
O FMI destacou que o impasse sobre a elevação do teto da dívida dos EUA ocorre "em um momento muito difícil para a economia global"
O mundo assiste, com preocupação, a uma verdadeira batalha em solo americano. Uma guerra que não envolve armas letais, nem soldados, nem deve provocar baixas, mas que pode mexer com a economia de todo planeta. Republicanos e democratas discutem a elevação do teto da dívida dos Estados Unidos. Nenhum dos lados pretende ceder e os efeitos podem ser devastadores. A bomba já tem até data para explodir, primeiro de junho. Se até lá não houver um acordo, a vida do presidente Joe Biden, que entra na reta final do mandato, pode virar um inferno.
Os republicanos, que tem maioria na Câmara dos Representantes, exigem que o governo anuncie uma série de cortes no orçamento para aprovar o aumento do teto da dívida. Joe Biden se recusa a negociar e diz que vai executar tudo que foi prometido por ele. O problema é que se não houver uma liberação de gastos extras, os Estados Unidos deixarão de pagar suas dívidas, afetando a economia do mundo. Uma economia que já vive, nos últimos anos, de sobressalto por conta da pandemia da Covid-19 e da invasão russa à Ucrânia.
O presidente da Câmara dos Representantes, o republicano Kevin McCarthy, tem reclamado da falta de interesse do governo Biden em caminhar para uma posição que permita a negociação de um acordo. O tempo está passando e a chance de um calote aumenta.
Ao sair de uma reunião, na terça-feira (9), no Salão Oval da Casa Branca, McCarthy e o líder da minoria no Senado, o também republicano Mitch McConnell, culparam Joe Biden por rejeitar a proposta oferecida pelo partido que implica no corte de gastos em troca do aumento do limite da dívida. McCarthy reclamou do fato de o presidente não ter aceitado nenhuma das propostas de redução de gastos. A Casa Branca disse que não negociará o limite da dívida, argumentando que a capacidade de crédito do governo federal não deve ser usada por nenhuma das partes para exigir concessões. Os negociadores de Biden dizem que só vão discutir mudanças e cortes nos gastos numa conversa separada, no momento que se for debater o orçamento futuro.
O impasse já causa preocupações além do território americano. O Fundo Monetário Internacional (FMI) destacou que o impasse sobre a elevação do teto da dívida dos Estados Unidos ocorre “em um momento muito difícil para a economia global”. A porta-voz do FMI, Julie Kozack, disse nesta quinta-feira (11) que o calote americano pode provocar “efeitos muito negativos”, tanto para os EUA, como para a economia global, caso ocorra um default da dívida. Ela enfatizou que seria “urgente” haver uma solução para o tema, o quanto antes.
Kozack disse ainda que uma das repercussões potenciais do impasse seriam juros mais altos, bem como maior instabilidade, com repercussões na economia global, que “poderiam incluir custos mais altos de empréstimos”. E recordou que há países, sobretudo com vulnerabilidades na dívida, que já enfrentam quadro mais delicado com o aperto monetário global. “Pedimos que todos os lados se reúnam e trabalhem para resolver a questão o mais rápido possível”, disse.
Tudo que o Brasil não precisa, neste momento, é uma nova onda de caos na economia global. Toda essa turbulência pode gerar mais inflação e alta de juros, atingindo de forma quase fatal o pequeno crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) esperado para este ano.
Essa insegurança mundial pode inclusive forçar o Banco Central a adiar, por mais tempo, o início de redução da taxa básica de juros.
Os embates entre os partidos de Biden e de Trump devem se acentuar, ainda mais, nos próximos meses com a aproximação das campanhas eleitorais. O pleito, marcado para novembro de 2024, muito provavelmente terá os dois, outra vez, como adversários. Cada lado vai usar as armas que têm para mostrar a falta de preparo do outro e a economia é sempre um dos motores que mais ajudam a impulsionar ou destruir candidaturas.
Os republicanos têm agora a faca e o queijo na mão para dificultar a vida de Biden. Resta saber se eles terão coragem de prejudicar a imagem do país para provar que o presidente atual não tem condições de governar. Por outro lado, Biden há meses demonstra não ter limites para gastar. Autoriza novas despesas quase que diariamente e isso ajuda a aumentar a inflação nos Estados Unidos e abalar o sistema financeiro. O aumento da dívida, sem concessões, permitiria que ele continuasse, firme e forte, nessa prática.
Muitas reuniões sobre o tema devem ocorrer nos próximos dias e semanas. Resta saber quem vai ter mais força para manter posição e mostrar à sociedade americana quem realmente manda. Enquanto isso, o mundo assiste em alerta o desfecho dessa briga política interna.