Editorial
Choque de realidade
Depois de levar uma série de puxões de orelha da Ucrânia, da União Europeia e dos Estados Unidos, Lula mudou de posição com relação à invasão russa
A terça-feira, 18 de abril de 2023, vai ficar conhecida como o Dia do Recuo. Foi nessa data que o presidente Lula mudou de posição em vários temas antes defendidos por ele e por sua equipe. Em alguns casos tentou demonstrar indignação. Em outros, mesmo embaraçado, teve que discursar contrariado para prestar contas ao mundo das bobagens que disparou sobre a guerra da Ucrânia durante a viagem oficial pela China e pelos Emirados Árabes. Difícil foi ver tanta gente que defendeu o presidente nas últimas horas ter que capitular à nova posição.
Aqui no Brasil, o que mais chamou a atenção foi a decisão de recuar na taxação das compras internacionais até o valor de US$ 50,00. A mudança de rumo começou a se desenhar ainda na noite de segunda-feira (17), numa reunião com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Durante o encontro, Lula teria reclamado que o fim da isenção atingiria a população de baixa renda e da classe média-baixa, principais grupos consumidores de produtos de plataformas como a Shopee e Shein. Lula teria dito que a nova medida tinha sido anunciada sem o aval da Casa Civil da Presidência. Reclamou, ainda, do desgaste à imagem dele. Bola cantada, decisão mudada e tudo voltou a ser como era antes.
No campo da diplomacia o recuo foi ainda maior. Depois de levar uma série de puxões de orelha da Ucrânia, da União Europeia e dos Estados Unidos, Lula mudou de posição com relação à invasão russa. Sem citar diretamente o país governado por Putin, o mandatário brasileiro mudou o tom adotado nos últimos dias e disse que Brasil “condena” a violação territorial da Ucrânia.
Para piorar a situação de Lula, ele ainda teve que assistir, dentro de casa, o presidente da Romênia, Klaus Iohannis, discursar veementemente contra a postura da Rússia. Iohannis, em visita ao Brasil, pregou uma posição “implacável‘ na defesa da Ucrânia.
“A mensagem da Romênia é clara, forte e deve ser compreendida por nossos parceiros: por mais que Moscou tente justificar suas ações, a Rússia é um Estado agressor, que violou à força a soberania territorial da Ucrânia e tentou anular sua independência”, disse o presidente romeno. “A comunidade internacional tem o dever de apoiar a Ucrânia para repelir a agressão e vencer esta guerra para libertar o país.”
A Romênia sabe bem o que é isso. Viveu décadas sob o jugo da Rússia, comandada pelo ditador Nicolae Ceaucescu. O jogo virou em 1989 quando a população romena se revoltou e invadiu a mansão onde vivia Ceaucescu, o prendeu e o executou. Só assim o país pode voltar a respirar os ares da liberdade.
A visita do presidente romeno aconteceu um dia depois de Lula ter recebido, no mesmo palácio, o chanceler russo. Serguei Lavrov defendeu, em solo brasileiro, a invasão russa e agradeceu o apoio e a compreensão de Lula.
As posições de Lula têm causado indignação entre os diplomatas mais antigos e que por anos ajudaram a construir a imagem do Brasil no exterior. Roberto Abdenur, que foi embaixador na China e nos EUA disse, em entrevista, que a postura do atual presidente contradiz a posição formalizada pelo Brasil nas Nações Unidas, que é de condenar a guerra.
Para ele, as declarações de Lula sobre a guerra prejudicam a relação bilateral com países que são de importância estratégica para o País.
“O presidente foi muito infeliz nas coisas que disse culpando a Ucrânia pela guerra, quando na real é o país agredido, dizendo que EUA estão incentivando e prolongando a guerra, e que é contra a entrega de armas à Ucrânia. Se não fosse a entrega de armas, a Ucrânia teria desaparecido”, disse Abdenur.
O problema maior para o Governo é que o principal conselheiro do presidente em política internacional, o ex-chanceler Celso Amorim, parece não só comungar das mesmas ideias de Lula como também tem sido um grande incentivador de algumas posições mais radicais.
Antes mesmo de completar quatro meses no poder, Lula já enfrentou uma série de desgastes políticos e econômicos, tanto no Brasil como no exterior. Sua retórica anacrônica vem se tornando piada internacional. O próximo capítulo dessa saga já tem hora e local marcados, vai ser semana que vem, em Portugal. Os discursos e posições do presidente brasileiro causaram indignação em parte da comunidade e a oposição promete uma recepção “calorosa” a Lula durante sua passagem por terras lusitanas.