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Editorial

De olho na gôndola

Os consumidores devem ficar atentos para não serem vítimas de um fenômeno batizado de "reduflação"

23 de Julho de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
(Crédito: Fábio Rogério (9/3/2021))

De uns tempos para cá o mundo está ficando tão tecnológico que nossas atitudes são analisadas a cada instante. Essas novas ciências conseguem captar a nossa maneira de ser e criar gatilhos que nos levem a comprar coisas e serviços que nem sempre precisamos.

O famoso algoritmo, usado nas redes sociais, denuncia nosso comportamento durante a navegação pela internet e nossos hábitos são transformados em oportunidades de venda. Se você buscou informações sobre passagens aéreas ou sobre um mero jogo de lençóis pode ter certeza que nas próximas horas você receberá em seu perfil uma série de anúncios com empresas oferecendo esses produtos. Como em seu subconsciente você já está decidido a comprar, o sucesso da operação é maior. E o lucro deles também.

Esse mesmo tipo de estudo é usado em estabelecimentos de nosso uso cotidiano, como os supermercados, por exemplo. Cada produto é exposto de forma milimetricamente calculada para atrair os olhares dos consumidores. As marcas pagam caro para que sejam colocadas em posição especial na gôndola, bem ao alcance de nossos olhos e mãos. Já as que se recusam a pagar um extra acabam lá em baixo, num local de difícil visualização.

Na área de frutas, verduras e legumes luzes especiais são colocadas para garantir vivacidade extra nos produtos. O tomate fica mais vermelhinho e a alface parece ter saído naquele instante da horta. E por aí vai.

Só que além de enfrentarmos esse tipo de armadilha científica, que aproveita nossa mente e nosso comportamento, outros perigos rondam as prateleiras.

Muitas marcas têm aproveitado a alta da inflação para reduzir a quantidade de produto nas embalagens e até a troca de alguns itens na composição. Em alguns casos essa maquiagem é difícil de ser detectada. Só é informada nas pequenas linhas escondidas na embalagem. Outras são mais grosseiras e basta chacoalhar a caixa para saber que houve redução na quantidade.

Os consumidores devem ficar atentos para não serem vítimas de um fenômeno batizado de “reduflação”, que nada mais é do que a redução de peso, volume ou quantidade de produtos industrializados sem informar a alteração e manter ou aumentar os preços. A prática é irregular e pode ser denunciada à Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon).

Esse movimento já vem sendo adotado há anos e foi intensificado durante a pandemia. Para a superintendente do Procon Sorocaba, Cristiane Bonito Rodrigues em vez das empresas aumentarem os preços e repassarem os custos diretamente para o consumidor, o que geraria um certo desgaste, eles optaram por fazer a “reduflação”, diminuindo a quantidade do produto ou a qualidade dos insumos.

De acordo com Cristiane, é necessário informar, de maneira clara, nas embalagens as alterações realizadas. Outra opção seria a de criar uma nova rotulagem, totalmente diferente da anterior. Nesse caso, esclarece a representante do Procon, não é preciso comunicar as modificações nos pacotes. “O que vem acontecendo é que muitos fornecedores fazem uma rotulagem e não explicam a diminuição, nem da quantidade, nem da qualidade. Aí, o consumidor fica confuso e acaba comprando uma coisa achando que é outra, e isso não pode”, alerta a superintendente do Procon.

Para Ulysses Reis, coordenador do Núcleo de Varejo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio de Janeiro, o que está havendo, na prática, é uma estratégia deliberada de venda maquiada, em que o consumidor acredita estar pagando o mesmo valor, ou até mais em alguns casos mais raros, mas está obtendo uma quantidade menor de produto. “A estratégia disfarça a inflação e funciona muito bem se o cliente não perceber”, diz Reis.

Como relata o professor João Alvarenga em artigo publicado na edição de ontem (22) do jornal Cruzeiro do Sul, tem muita gente comprando gato por lebre sem nem perceber. Ele defende que as multas para esse tipo de fraude sejam majoradas e que a fiscalização atue de forma mais ativa.

Nessa briga de gigantes da indústria contra nós, meros consumidores, os supermercados e outros estabelecimentos do mesmo tipo devem tomar partido evitando comprar de empresas que pratiquem de forma sorrateira esse tipo de estratégia.

Enquanto isso não acontece, o importante é estar atento na hora das compras. Ficar de olho nas embalagens, no peso, na relação custo x peso e na composição do que está sendo vendido. Nem que isso custe um tempinho extra. Não está fácil para ninguém fechar as contas no fim do mês e toda economia é oportuna.