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A informação certa para a criança certa

A escola é uma das instituições que compõem a chamada rede de proteção à infância e adolescência

18 de Maio de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
O prefeito falou sobre o assunto em um vídeo e citou os trechos que acredita ser inapropriado às crianças.
O prefeito falou sobre o assunto em um vídeo e citou os trechos que acredita ser inapropriado às crianças. (Crédito: REPRODUÇÃO)

O prefeito de Sorocaba, Rodrigo Manga (Republicanos), criticou em um vídeo nas redes sociais a distribuição pelo poder público municipal do livro “Deus me livre!”, da autora Rosa Amanda Strauz. Segundo o prefeito, o conteúdo do material não é apropriado para crianças.

“Hoje (ontem), nos deparamos com mais um livro, que uma criança levou para casa e que estava nas creches. Parece um livro muito bonitinho, só que a história não é para crianças, ainda mais aquelas de 5 anos”. O conteúdo causador da indignação traria, segundo Manga, uma explicação “inadequada” sobre o sistema reprodutor humano. No texto a autora se refere ao órgão genital masculino.

No vídeo, o prefeito Rodrigo Manga determina que a obra seja recolhida das escolas. A medida foi comemorada por parte da população e criticada por outra.

O tema é bastante controverso. A educação sexual deve sim ser debatida nas escolas, mas como parte de um programa desenvolvido ao longo das séries e adequado a cada uma das idades. Incluir, sorrateiramente, o assunto num livro fora de contexto, e do momento certo, parece não ser a forma mais sensata de se abordar o assunto.

Para a coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade da Universidade de São Paulo, Carmita Abdo, o ideal seria começar a falar sobre educação sexual com crianças na faixa entre 9 e 10 anos. De acordo com a especialista, os pais devem tirar as dúvidas dos filhos assim que forem surgindo e de forma direta e objetiva, e não tentar ir além da pergunta feita. Carmita ressalta que é importante estar atento às necessidades das crianças e dos adolescentes, pois não existe uma fórmula padrão. “É preciso olhar o que a criança e o adolescente estão falando, e não tentar usar o que já está escrito, como se valesse para todo mundo. É preciso trabalhar em cima das necessidades de cada um”, explica Carmita.

As crianças aprendem com tudo o que vivenciam, observam, escutam e, principalmente, com os comportamentos que absorvem dos adultos. Então, é de importância fundamental discutir de que forma os pequenos desenvolvem a relação com o seu corpo e com o corpo do outro. A erotização infantil atravessa as etapas de desenvolvimento da criança e antecipa seus aprendizados, o que pode ser bastante nocivo.

Antes de mais nada, é preciso atentar para o fato de que sexualidade é diferente de sexualização. A primeira é inata ao ser humano e deve ser estimulada de maneira saudável, de modo que a criança tenha familiaridade com seu próprio corpo, saiba identificar onde dói para ajudar os pais e cuidadores a tomar conta de sua saúde, e possa se instrumentalizar para estabelecer os limites entre carinho e abuso.

Já a segunda acontece de fora para dentro, ou seja, não é um processo natural da criança, e sim uma manobra que adultiza a criança, muitas vezes encabeçada pela publicidade infantil e pela exposição exagerada ao tema antes da hora certa.

Para se trabalhar com educação sexual nas escolas, é necessário promover um aprendizado com conteúdo significativo para o aluno, que tenha valor e aplicação para sua vida. Para discutir a sexualidade de forma eficiente, pode-se trabalhar com atividades lúdicas, que possibilitam interações e diálogos entre os colegas e entre o professor e seus alunos.

O uso de jogos, por exemplo, faz com que os alunos participem e se expressem sobre assuntos que podem ser considerados como vergonhosos, tornando-os interessantes quando apresentados de forma sutil, simples e aplicáveis ao cotidiano, como a prevenção de doenças, o uso de métodos contraceptivos e a aceitação da diversidade de gênero na escola.

A escola é uma das instituições que compõem a chamada rede de proteção à infância e adolescência. Juntamente com atores de outras áreas, como Saúde e Assistência Social, os profissionais da educação devem zelar pelos direitos da população dessa faixa etária, previstos no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA).

A educação sexual deve ser uma política planejada, executada passo a passo, sempre acompanhando a reação dos alunos ao tema. Os pais devem ser incluídos nesse processo. Não deve o educador inserir armadilhas que possam trair a confiança da sociedade e provocar reações como a do prefeito Manga. O tema é de suma importância e deve ser constante apresentado aos alunos. Só que cada idade deve receber a dose certa de informação. Nem mais, nem menos.