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Editorial

Inteligência artificial X geração de empregos

Está surgindo uma nova classe de pessoas: a dos inúteis. ‘São pessoas que não serão apenas desempregadas, mas que não serão empregáveis‘

09 de Abril de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Caixas automatizados.
Caixas automatizados. (Crédito: EMIDIO MARQUES / ARQUIVO JCS (21/1/2019))

A Câmara de Sorocaba está debatendo um assunto de suma importância nos dias de hoje. O avanço da automação sobre as vagas de trabalho. O projeto, de autoria do vereador Cícero João (PSD) e apresentado em 2021, quer a limitação do número de caixas de autopagamento em supermercados e hipermercados.

O texto já foi considerado inconstitucional pela Comissão de Justiça e o mesmo parecer foi dado pela Secretaria Jurídica da Casa. Segundo o parecer, os municípios não têm competência constitucional para legislar sobre restrição da atividade privada, em prol de uma categoria profissional.

Mesmo assim o projeto prosseguiu. Em 2 de dezembro de 2021, o plenário da Câmara decidiu não acatar o relatório jurídico e agora a fase de votação está próxima. O resultado disso, pouco importa. O que importa é o debate de como geraremos empregos num futuro onde as atividades são cada vez mais produzidas de forma automatizada ou virtual.

O avanço da inteligência artificial pode ser sentido no nosso dia a dia. Dezenas de aparelhos que eram utilizados em nossos lares foram embutidos num único local: o telefone celular. Lá está nosso relógio, nosso gravador, nossa televisão, as cartas que recebíamos pelo correio, os mapas que usávamos para nos locomover pela cidade, a câmera fotográfica, a filmadora e até o nosso banco. Tudo fica ali, num quadradinho cheio de tecnologia.

E essa revolução feita para melhorar a nossa vida custou milhões de empregos. Empresas inteiras, de muita tradição, simplesmente deixaram de existir. Outras, que se orgulhavam em ter em seus quadros uma legião de colaboradores, agora apostam num processo mais enxuto e automatizado.

É claro que essa evolução também criou novas oportunidades de trabalho, mas a proporção entre vagas criadas e vagas fechadas continua sendo cruel para quem busca trabalho e sustento para a família.

Um dos maiores pesquisadores desse tema é o professor Yuval Harari, da Universidade Hebraica de Jerusalém. Para ele, está surgindo uma nova classe de pessoas: a dos inúteis. “São pessoas que não serão apenas desempregadas, mas que não serão empregáveis”, explica o professor. Na teoria de Harari, até 2050, um contingente imenso de trabalhadores vagará pelo mundo sem conseguir se adequar às mudanças tecnológicas que estão por vir. Sem as habilidades necessárias e sem a formação educacional ideal não terão espaço no mercado de trabalho.

Apesar dessa previsão assustadora, o historiador israelense aponta uma saída. Os governos, de forma global, vão ter que se unir e criar um sistema de renda básica universal. Os recursos vindos desse sistema vão dar o mínimo de conforto para essas pessoas à margem da sociedade. Ele ressalta que uma outra providência também precisa ser tomada.

“As pessoas devem se envolver em atividades com algum propósito. Caso contrário, irão enlouquecer. Afinal, o que a classe inútil irá fazer o dia todo?”, alerta Harari.

O professor, que não gosta de ser confundido com um profeta, tem uma certeza pessoal: o ensino é a chave principal para reduzirmos o impacto dessa mudança.

“Em 2050, um caixa ou um operário da indústria têxtil que perder seu emprego para um robô dificilmente estará apto a começar a trabalhar como oncologista, como operador de drone ou como parte de uma equipe de humanos ligados à inteligência artificial de um banco. Não terão as habilidades necessárias”, escreve Harari.

Garantir essas habilidades para as próximas gerações é uma tarefa que deve ser iniciada já. Não dá mais para esperar. O avanço tecnológico vem como um tsunami e quem estiver despreparado vai ser engolido pela onda. A educação é o ponto de partida para essa sobrevivência.

O debate iniciado na Câmara de Sorocaba é valido e importante. Provavelmente, por questões legais, não deve resultar em nada. Mesmo que a lei seja aprovada, e algumas poucas vagas sejam preservadas por mais alguns anos, tudo será um mero paliativo. O assunto merece uma discussão mais ampla e muito investimento em educação.