Buscar no Cruzeiro

Buscar

Editorial

Ser ‘julgado’ aqui no Brasil é mais fácil

O que a prisão de brasileiros na Tailândia, por tráfico internacional de drogas, pode nos ensinar

24 de Fevereiro de 2022 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
(Crédito: Emidio Marques / Arquivo JCS (26/3/2014))

Um caso envolvendo três brasileiros -- dois homens e uma mulher -- presos na Tailândia ganhou as manchetes e as redes sociais nos últimos dias. Eles foram detidos no aeroporto da capital, Bangkok, e segundo as autoridades locais são investigados por tráfico internacional de drogas. De acordo com o governo tailandês, foram apreendidos 15,5 quilos de cocaína com eles.

Os três haviam saído do Paraná. Dois deles -- um homem de 27 anos e uma mulher de 22 -- embarcaram em Curitiba e, após escalas, chegaram a Bangkok na manhã de segunda-feira. A equipe do aeroporto desconfiou de itens mostrados no raio-X, funcionários da alfândega revistaram as malas e encontraram nove quilos de cocaína. A droga estava em compartimento oculto. Horas depois, as autoridades tailandesas prenderam outro brasileiro, de Apucarana. O jovem, de 24 anos, havia chegado em outro voo. Com ele, encontraram mais 6,5 quilos de cocaína escondidos em duas malas. Não se sabe se ele conhecia o casal detido anteriormente. O Itamaraty informou que acompanha a situação.

O ponto principal de toda essa questão é que a Tailândia é um dos países onde o tráfico de drogas pode ser punido com pena de morte, dependendo da quantidade e das circunstâncias. O mesmo ocorre em outros países do Sudeste Asiático. Em abril de 2015, por exemplo, o também paranaense Rodrigo Gularte foi executado na Indonésia por esse crime. Ele ficou 11 anos preso após ser flagrado no aeroporto com seis quilos de cocaína revestidos em pranchas de surfe.

Assim, a prisão do trio gerou extensa repercussão na mídia e nas redes sociais. Matérias relatam a apreensão e campanhas de familiares e amigos para que os brasileiros sejam repatriados. E uma das coisas que mais chamam a atenção nas mensagens e áudios enviados pelos presos -- pois na Tailândia há permissão para troca de mensagens mediante algumas regras -- é o desejo dos criminosos. Em todas as conversas eles suplicam para serem submetidos à Justiça brasileira. É até constrangedor ouvir as mensagens. É como se dissessem “por favor, queremos ir para algum lugar em que possamos dar um jeitinho de escapar”.

Ouvir os áudios deixa claro a necessidade de uma reforma das leis no Brasil, para que possamos punir os criminosos -- de todo tipo -- adequadamente. Não que a pena de morte signifique fazer justiça nesta ou em nenhuma outra situação. Isso é outra discussão. Nesse aspecto, tomara que esses três brasileiros presos na Tailândia -- assim como todos os réus em qualquer situação -- tenham direito a julgamentos justos e imparciais. A questão é que, infelizmente, também terão de enfrentar as consequências das leis às quais estão submetidos. E pelo visto, alguns desavisados continuam subestimando e desafiando as fortes leis dos países asiáticos em relação ao tráfico de drogas.

Antes que alguém fique com pena ou indignado com a situação dos brasileiros presos na Tailândia, devemos lembrar também a quantidade de famílias e pessoas destruídas pelas drogas. O tráfico mata milhões em todo o mundo, todos os anos. Não é algo “menor”, não é algo que possa ser tratado com indiferença. Quem nunca teve um problema com drogas na família pode não entender, mas a droga é um crime feito não apenas contra os usuários mas com todos à volta dele. Nós, aqui no Brasil, nos acostumamos a ser condescendentes com muita coisa errada. Por aqui, se nem quando a pessoa mata à luz do dia, na frente de todos, ela vai presa, imaginem em um “simples” tráfico de drogas. O ponto é que tráfico de drogas não é nada “simples”.

Obviamente que devemos nos compadecer com os familiares e amigos dos detidos. São grandes as chances de o trio pegar penas extensas ou mesmo pagar com a vida pelo crime que cometeram. É justo a pena capital? Pode ser que ela seja exagerada -- e muito provavelmente é --, mas o que pensam os pais de um jovem que perdeu a vida para as drogas?!

Além de tudo, também devemos nos perguntar por que todo mundo quer ser “julgado” aqui no Brasil? Isso é certamente um tremendo atestado de incompetência de nossas leis e de nosso sistema de punição. Por aqui -- e é até triste constatarmos isso -- seria plenamente factível obter a soltura desses criminosos, alegando serem primários ou qualquer outra brecha jurídica. Diariamente temos milhares de exemplos como esses. Não apenas no tráfico, mas em qualquer atividade criminosa.

Portanto, que o episódio na Tailândia sirva para mostrar a premência de uma atualização em nossas leis e em todo o nosso sistema de punição a criminosos.