Editorial
Pandemia também acelerou tendências
Há cursos a distância de qualidade e o mercado está cada vez mais adaptado ao modelo remoto

Uma das áreas mais impactadas, em todo o mundo, pela pandemia do novo coronavírus foi -- e tem sido -- a educação. Assim como em vários outros países, no Brasil uma das principais consequências foi a evasão escolar -- alunos que por algum motivo deixaram de estudar.
Outros dados mostram que a pandemia também acelerou algumas tendências. A quantidade de alunos que, no ano letivo de 2020, ingressaram em cursos de graduação a distância no Brasil, os chamados EAD, superou o total de estudantes que optaram por cursos presenciais pela primeira vez na história, segundo pesquisa divulgada na última sexta-feira (18). O fenômeno havia sido constatado em 2019, mas apenas na rede privada.
O levantamento aponta que, entre os mais de 3,7 milhões de alunos que ingressaram em instituições públicas e privadas em 2020, mais de 2 milhões (53,4%) optaram por cursos a distância, enquanto 1,7 milhão (46,6%) escolheram os presenciais. As informações são do Censo da Educação Superior 2020, divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e pelo Ministério da Educação (MEC). Os dados não levam em consideração aqueles cursos que ofereceram aulas remotas em caráter provisório, mas que mantêm previsão de retorno presencial.
O censo também revelou que a oferta de vagas em cursos remotos em 2020 aumentou mais de 30% na comparação com 2019, chegando a 13,5 milhões. Para efeito de comparação, o crescimento da oferta em cursos presenciais no mesmo período foi de 1,3%. A tendência de migração para o on-line já era observada nos últimos anos, diante da expansão desse setor, sobretudo em faculdades privadas, e também da crise econômica. Isso porque cursos remotos costumam ser mais baratos -- para as instituições e para os alunos -- e dão mais flexibilidade a quem trabalha para encaixar as classes na rotina. Em 30 de junho de 2021, data de referência do levantamento, havia 2.457 instituições de educação superior no Brasil. Do total, 2.153 (87,6%) são privadas e 304 (12,4%), públicas. As instituições privadas registraram 3,2 milhões de ingressantes, o que corresponde a 86% do total.
Apesar da resistência de parte dos conselhos de classe e de parte do mercado, há cursos a distância de qualidade e o mercado está cada vez mais adaptado ao modelo remoto. Por outro lado, os educadores se preocupam com os efeitos que o crescimento rápido do número de graduações EAD pode gerar na qualidade do ensino.
De acordo com especialistas, o cenário revelado no censo já era esperado. Afinal, os cursos EAD já vinham tendo, principalmente na última década, um crescimento expressivo em instituições de ensino privado. Certamente a pandemia acelerou ainda mais essa tendência, embora seja difícil mensurar o quanto.
A exemplo do que se viu nos últimos anos, os cursos EAD devem permanecer avançando ainda mais, mas tal situação deve ser vista com cuidado. Isso porque, ainda que as tecnologias tenham progredido, no cenário nacional atual essa ampliação de recursos não necessariamente reverbera na qualidade dos cursos remotos e, por consequência, na mão de obra do trabalhador brasileiro. A tecnologia permite proporcionar experiências ao aluno que ele não teria em um curso presencial, como uma trilha de conhecimento personalizada, por exemplo. Mas isso tudo custa dinheiro. O que se observa no mercado atualmente é uma padronização de cursos a distância, desconsiderando esses avanços.
Do ponto de vista dos alunos, o EAD demanda foco e organização para separar o tempo para o estudo. Como vantagem, o formato propicia mais flexibilidade de dias e horários, com a possibilidade de rever conteúdos.
Já para os educadores, surge uma nova responsabilidade -- para ser somada a tantas outras da carreira de formador --, a de tentar garantir que a modalidade EAD ofereça a mesma qualidade da modalidade presencial.