Editorial
Boxe luta para se manter em pé
Esporte, que tem um sorocabano de coração como destaque nacional, corre risco de ficar fora dos Jogos

Um dos esportes mais antigos da humanidade -- alguns registros apontam que a sua origem remonta ao ano 3000 a.C, no Egito --, o boxe esteve presente em todas as Olimpíadas da Antiguidade e, na era moderna, faz parte da programação olímpica desde 1904, em Saint Louis, nos Estados Unidos.
Entretanto, essa tradição corre sério risco de ser interrompida. Na semana passada, em uma reunião em Pequim, na China, o Comitê Olímpico Internacional (COI) revelou que a modalidade, assim como o levantamento de peso e o pentatlo moderno (que envolve tiro esportivo, esgrima, natação, hipismo e corrida), a princípio estão fora do programa esportivo inicial das Olimpíadas de 2028, a ser realizada em Los Angeles, nos Estados Unidos.
As três tradicionais modalidades podem retornar para a programação de Los Angeles-2028 se conseguirem respeitar uma série de exigências impostas pelo COI até 2023. O órgão defende que seu objetivo é melhorar a imagem, o julgamento e a eficiência das três modalidades, envolvidas em vários tipos de escândalos e problemas. No caso do boxe, quem está na mira é a Associação Internacional de Boxe (Aiba), de quem é cobrada maior transparência no comando e nas movimentações financeiras, bem como um melhoramento no julgamento dos combates. As desconfianças começaram em uma investigação conduzida pelo canadense Richard McLaren, que revelou possível sistema de manipulação de resultados das lutas de boxe na edição de 2016 dos Jogos Olímpicos, no Rio de Janeiro. Seu relatório estimou que cerca de 10 combates estiveram no esquema, incluindo batalhas valendo medalhas.
A real ameaça contra a nobre arte, no entanto, pode estar no interesse dos organizadores em migrar novos públicos para as Olimpíadas e engajar novos fãs. Em Paris-2024, por exemplo, haverá a estreia do inusitado breaking, aquele estilo de dança de rua famoso pelo giro do corpo com as pernas para o alto. Quando foi confirmado nos Jogos, muita gente criticou e questionou se essa dança pode ser considerada um esporte.
A inclusão de “novos esportes” no programa olímpico já está em andamento. Skate, surfe e escalada, por exemplo, tiveram grande popularidade nas Olimpíadas de Tóquio, no Japão, e marcam presença no programa inicial para os Jogos de 2028. São esportes definidos como “voltados para a juventude” e bem vistos por Casey Wasserman, presidente do comitê organizador do megaevento esportivo.
A questão do boxe envolve diretamente não apenas o Brasil como a cidade de Sorocaba. O País é dono de oito medalhas no pugilismo. Na esteira de Servílio de Oliveira, que tinha apenas 20 anos quando ganhou o bronze nos Jogos da Cidade do México, em 1968, vieram Yamaguchi Falcão, Esquiva Falcão e Adriana Araújo (Londres-2012), Robson Conceição (Rio-2016), Hebert Conceição, Beatriz Ferreira e Abner Teixeira (Tóquio-2020). Revelado pelo esporte pela Liga Sorocabana de Boxe, o osasquense de nascimento e sorocabano de coração acabou de ganhar medalha de ouro em um campeonato da Hungria e representa com orgulho a cidade e a região. Abner simboliza a história de diversos jovens atletas do País que sonham em vencer nos ringues e também na vida, podendo tirar seu sustento e de sua família por intermédio da carreira esportiva, e também ajudar a revelar novos talentos no próximo ciclo. Como Luiz Carvalho, de 20 anos, que segue os mesmos passos e já faz parte da seleção brasileira permanente. Uma sucessão que talvez fique prejudicada caso a decisão do COI seja levada adiante.
Em meio a toda essa polêmica, o boxe amador brasileiro perdeu ontem, aos 96 anos, seu maior incentivador: Newton Campos. Presidente da Federação Paulista de Boxe há mais de 30 anos, o jornalista, dirigente e entusiasta era o maior responsável pelo incentivo às competições amadoras da modalidade no País. Definitivamente, não são bons tempos para a nobre arte.