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Editorial

O importante papel da Anvisa

As ameaças -- públicas e veladas -- feitas a funcionários da agência são absolutamente inaceitáveis, absurdas e covardes

24 de Dezembro de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Fachada do edifício sede da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Fachada do edifício sede da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). (Crédito: Marcelo Camargo / Agência Brasil)

Desde o princípio da pandemia no Brasil, no início de 2020, uma palavra passou a fazer parte do vocabulário dos brasileiros. Na verdade, não é bem uma palavra e, sim, a sigla de um órgão público importante: Anvisa, a abreviação de Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Do dia para a noite, a Anvisa entrou no olho do furacão. Afinal, como agência fiscalizadora de vacinas e medicamentos -- entre outras coisas -- cabe ao órgão avaliar e autorizar, ou não, o uso de imunizantes.

Passados dois anos do início desse pesadelo chamado Covid, podemos dizer que a Anvisa tem feito um trabalho admirável, com correção, isenção e responsabilidade. No meio de tantas acusações, reclamações e insinuações, de todos os lados, contra e a favor do modo como os governantes lidam com a pandemia, a Anvisa se manteve serena, atuando em prol da população no esclarecimento e encaminhamento das vacinas e medicações.

Foi ela, por exemplo, que autorizou a retomada dos testes da vacina de Oxford quando estes foram suspensos. Foi ela também que liberou a importação de seis milhões doses da Coronavac, imunização desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, no final de outubro de 2020, fato que ajudou na chegada da vacinação ao País. A mesma Anvisa também determinou, em alguns momentos, a interrupção dos testes, após eventos suspeitos ou adversos.

Diante do cenário atípico de pandemia e da necessidade de um processo mais rápido, a agência também instituiu um Comitê de Avaliação de Estudos Clínicos, Registro e Pós-Registro de Medicamentos para prevenção e tratamento da Covid-19, de forma prioritária, no prazo médio de até 72 horas após a submissão formal do protocolo.

Nem todos sabem, mas o papel da Anvisa vai muito além da aprovação de imunizantes. Fundada em janeiro de 1999, ela é uma agência reguladora, sob forma de autarquia, um órgão autônomo da administração pública com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, e é vinculada ao Ministério da Saúde. Sua finalidade é fiscalizar a produção e consumo de produtos submetidos à vigilância sanitária como medicamentos, alimentos, agrotóxicos e cosméticos. Ela deve garantir que todos eles sejam seguros, de qualidade e com eficácia comprovada. Na prática, a Anvisa regula produtos e serviços que movimentam quase um quarto do PIB brasileiro. A agência também é responsável pelo controle sanitário de portos, aeroportos e fronteiras.

Com todo esse protagonismo desempenhado durante a pandemia, a Anvisa é um relevante órgão no combate ao novo coronavírus. Nesse sentido, as ameaças -- públicas e veladas -- feitas a funcionários da agência são absolutamente inaceitáveis, absurdas e covardes. Elas se acentuaram principalmente depois que o órgão aprovou a vacinação de crianças de 5 a 11 anos -- com doses pediátricas, diga-se.

Respaldados por falas irresponsáveis de membros do governo federal, ativistas digitais têm inundado as redes sociais com discurso de ódio e ameaças, divulgando os nomes dos responsáveis pelas aprovações, ameaçando até os familiares dos funcionários. Trata-se de uma intimidação barata e rasteira, pela qual os quadros da Anvisa não merecem passar. Diante dos ataques, a agência -- na figura de seu diretor-presidente, o almirante da reserva Antonio Barra Torres -- teve de solicitar proteção da Polícia Federal tanto para as instalações físicas quanto para diretores e servidores.

É lamentável essa situação. Assim como também é lamentável a falta de um posicionamento mais enfático do governo em defesa do órgão que tanto tem feito a favor da população na luta contra a pandemia. Se já não bastasse levantar dúvidas e suspeitas em relação às vacinas e promover medicamentos sem eficiência científica comprovada, insuflar a turba contra funcionários do órgão somente por conta de suas decisões técnicas é um absurdo.

Que a Anvisa siga cumprindo seu relevante papel. Que o governo tenha a decência de prestigiar e valorizar a agência, e não atiçar os negacionistas contra ela. Que todos juntos sigamos enfrentando e derrotando o inimigo comum: o coronavírus.