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Editorial

O fundo eleitoral é vergonhoso

Congresso derrubou veto do presidente e campanhas terão R$ 4,9 bilhões em 2022

23 de Dezembro de 2021 às 18:20
Cruzeiro do Sul [email protected]
(Crédito: Divulgação / Câmara dos Deputados)

O Congresso Nacional deu nova demonstração de que a maioria dos políticos brasileiros está mais preocupada com seus benefícios do que em servir ao povo -- teoricamente seu papel. Na última sexta-feira (18), as duas casas legislativas derrubaram o veto do presidente Jair Bolsonaro a um trecho da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Dessa forma, os congressistas mantiveram a vergonhosa previsão de R$ 5,7 bilhões em recursos públicos para o fundo eleitoral em 2022. Ao vetar o trecho da LDO, Bolsonaro argumentou corretamente que a medida “contraria o interesse público”. A equipe econômica defendia a reserva de R$ 2,1 bilhões para o fundo eleitoral, valor que consta na proposta de orçamento.

Comprovando que boa parte dos políticos vota de acordo com interesses pessoais e financeiros, a aprovação foi respaldada por parlamentares da base e da oposição. Ela teve apoio variado das legendas do Centrão -- sempre eles, claro -- e até de deputados do PT -- aqueles que praticam o “falo uma coisa e faço outra”.

Na terça-feira (21), o Congresso aprovou o relatório final do Orçamento de 2022, apresentado pelo relator, deputado Hugo Leal (PSD-RJ). O valor do fundo eleitoral baixou para R$ 4,9 bilhões, ainda assim uma aberração. É o maior volume de dinheiro público despejado em campanhas políticas na história. Soma-se a esse valor R$ 1,1 bilhão de outro fundo público, que banca as estruturas partidárias, mas também abastece candidaturas.

É uma completa inversão de valores e prioridades. Em um País que precisa de mais e melhor saúde, mais e melhor educação, mais e melhor segurança, usar esse orçamento bilionário para campanha política é um acinte. Ainda mais durante uma pandemia que assolou todo o planeta. Lembremos que temos milhões de pessoas enfrentando dificuldades, com necessidades, milhões de pessoas passando fome.

Criado em 2017 com o nome oficial de Fundo Especial de Financiamento de Campanha, o “fundão” serve para bancar, com recursos públicos, campanhas eleitorais. Desde 2018 a legislação eleitoral não permite mais que pessoas jurídicas façam doações para candidatos. O financiamento de campanhas pode ser feito pelo próprio candidato (até um limite de 10% do teto para o cargo), por doações de pessoas físicas e pelo fundo eleitoral.

O discurso dos defensores do fundo é muito bonito, pena que ele funciona somente na teoria. Dizem que o fundo eleitoral serve para evitar a roubalheira do financiamento privado de campanhas. Outro argumento é que é preciso dar meios para que os candidatos novos, de partidos menores economicamente, possam ter o mínimo de igualdade na disputa política. Isso é balela.

Primeiramente que não está em discussão o financiamento público. Que ele possa existir, OK. Mas com valores minimamente adequados. Triplicar o valor do fundão, sobretudo em um momento de pandemia, é vergonhoso. Já sobre o segundo tópico, na prática, o fundo eleitoral significa justamente a perpetuação de políticos renomados. Como não há critérios claros e justos de uso dos recursos, os caciques partidários investem muito dinheiro em poucos escolhidos, normalmente aqueles que já têm mandato e que estão há muito tempo no poder. Ou seja, é um círculo vicioso -- mais um de nossa política falha e podre. Diferentemente do alardeado, o fundo eleitoral não dá acesso a todos nem promove a renovação da classe política. Pelo contrário.

E ninguém escuta uma palavra dos líderes no sentido de baratear a campanha, reduzir custos, se aproximar do eleitor. Só estão de olho na dinheirama que poderá ser distribuída para financiar candidaturas País afora.

Ou seja, em vez de promover políticas públicas de qualidade -- que seria a principal atribuição da classe --, a atividade política passa a ser uma disputa feroz em torno de recursos eleitorais, que, por mais lícitos que sejam, transcendem qualquer razoabilidade. Depois o Legislativo diz não saber por que a democracia fica cada dia mais fragilizada no País. São atitudes como essas que distanciam a sociedade de seus representantes.

Fundo eleitoral com dinheiro do cidadão é vergonhoso!