Buscar no Cruzeiro

Buscar

Editorial

Lacração inquisitória

Vivemos um momento assustador, no qual aqueles que se diziam perseguidos e oprimidos são opressores de quem pensa diferente

04 de Novembro de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Maurício Souza, atleta de vôlei.
Maurício Souza, atleta de vôlei. (Crédito: Reprodução / Instagram)

Nos dias atuais, uma das maiores armadilhas da sociedade moderna são as redes sociais e a superexposição. Nesse ambiente digital praticamente sem lei, pessoas -- e robôs -- disseminam todo tipo de conteúdo: notícias falsas, ódio e preconceito.

As redes (anti)sociais proporcionam o cenário ideal para uma batalha ideológica, onde grupos extremistas e mal intencionados praticam perseguição e condenação -- que acabam se estendendo para o mundo real.

Na semana passada, os ativistas digitais conseguiram causar (mais) um desses linchamentos virtuais, desta vez o do jogador de vôlei Maurício Souza. O motivo alegado foram postagens e compartilhamentos feitos por ele, sobretudo a respeito de uma HQ (história em quadrinhos) que mostra o filho do Super-Homem beijando outro homem.

Guiados pelo barulho das redes sociais, Maurício foi crucificado. Perdeu o emprego no Minas Clube e provavelmente será barrado pelo técnico da seleção brasileira de vôlei, Renan Dal Zotto.

Vivemos um momento curioso, para não dizer assustador, no qual aqueles que se diziam perseguidos e oprimidos viraram os opressores de quem pensa diferente. As pessoas falam em “aceitação”, mas não aceitam a opinião dos outros. Neste caso, a questão não é a “opção”, e sim a mudança em um personagem que desde sua criação, em 1931, tinha um perfil estabelecido. É natural que muita gente tenha ficado espantada, como o atleta. Assim como é natural que as HQs se atualizem e façam o que bem entenderem com seus personagens. Quem não gostou da “modernidade” do personagem, basta não comprar a revista.

O ponto crucial é a reação violenta, com represálias, em cima de uma pessoa que manifestou esse espanto. Se for com respeito, temos que aceitar a opinião livre das pessoas, assim como todos devem aceitar a maneira que outros escolheram viver.

Infelizmente, existe no Brasil uma turma que segue a linha do “respeito a opinião dos outros, desde que ela seja igual à minha”. É a mesma turminha do “quanto pior, melhor”, que torce contra o Brasil e os brasileiros quando seu político de estimação não está no comando.

Sejamos honestos. Há uma diferença abissal entre não gostar da opção sexual de um herói de HQ e ser homofóbico. Evidentemente Maurício Souza não é homofóbico. Os próprios companheiros homossexuais do vôlei falam isso dele. Mas isso não importa para a turba digital.

A falsa acusação de homofobia está sendo usada somente para encobrir a verdadeira causa da perseguição: a sua opção política. Maurício costuma compartilhar postagens da turma que apoia Bolsonaro. Esse foi o maior “pecado” do atleta. Na verdade, a turminha da lacração -- da qual fazem parte muitos integrantes da mídia -- quis derrubá-lo pois há tempos ele tem uma postura contrária à que eles querem.

Contudo, independentemente de sua opção política, o atleta tem o direito de votar em quem quiser, em fazer campanha para quem quiser e a gostar ou não de um personagem de HQ. Por mais que a gente discorde da opinião dele, ele tem o direito de tê-la.

Não houve incitação ao ódio em nenhuma postagem do atleta. Ele não saiu pela cidade incendiando bancas de revista ou agredindo homossexuais. Na verdade, o ódio mais profundo veio justamente daquelas comunidades e pessoas que até há pouco tempo sofriam terríveis opressões. É estarrecedor observar muita gente se perdendo na intolerância -- aquela mesmo que dizem combater -- e praticar isso de forma dolosa e danosa.

São grupos tão radicais que parecem os “terroristas” que dizem combater. Chantageiam e pressionam empresas, perseguindo quem pensa diferente. São verdadeiros tribunais de exceção. E o pior é que muitas empresas acabam cedendo às pressões.

E para essa turminha da lacração, não basta um pedido de desculpas (se bem que quando o pedido vem de alguém do espectro político deles, daí não apenas é aceito como exaltado). Para eles, tem de haver vingança contra o cidadão que pensa diferente, independentemente se ele é honesto ou trabalhador.

Homofobia é crime e, quando ocorrer, tem que haver punição, sim. Mesmo de forma absolutamente injusta, Maurício Souza já foi punido. Acabou demitido. E podem ter certeza que continuará a ser perseguido. Qualquer clube que quiser lhe dar um emprego será achincalhado pela patrulha. Querem mais o quê? Cadeira elétrica, prisão perpétua?

É um absurdo esse patrulhamento ideológico. Pregam a democracia, mas desde que você vote no candidato deles. Senão você é “inimigo”. Querem enfiar goela abaixo suas opiniões, e ai de quem for contrário a elas!

Curiosamente, após ser execrado, Maurício viu sua popularidade nas redes sociais explodir. Em uma delas, saiu de 350 mil para 2,4 milhões de seguidores. Não que número de seguidores signifique certo ou errado, longe disso, mas talvez seja uma “resposta” de uma imensa parcela da população que acha que ele não foi tratado com justiça.

Há que se respeitar e tolerar as opiniões e posições alheias, sejam elas quais forem.