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Editorial

Suburbanos ao deus-dará

A situação faz parte do dia a dia de milhares de trabalhadores, estudantes e demais pessoas que precisam de ônibus para se locomover entre os municípios da RMS

24 de Outubro de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
(Crédito: Arquivo pessoal / Maria da Silva)

Ônibus superlotados e atrasados -- não raramente com problemas mecânicos e/ou de segurança --, passando direto pelos pontos de parada e, consequentemente, deixando os passageiros expostos ao sol ou à chuva na beira das rodovias, além de impossibilitados de cumprir seus compromissos. Lamentavelmente, esse é o roteiro de um drama que parece não ter fim na Região Metropolitana de Sorocaba (RMS).

A situação faz parte do dia a dia de milhares de trabalhadores, estudantes e demais pessoas que precisam se locomover entre os municípios para fazer compras e até mesmo em busca de atendimento médico. O enredo nunca mudou. Ao contrário, se repete há décadas, independentemente de quem governa o Estado e do órgão que deveria zelar pela qualidade dos serviços de transportes coletivos, especialmente aqueles prestados pelas chamadas linhas suburbanas.

Nas duas últimas semanas, o Cruzeiro do Sul recebeu inúmeras reclamações de usuários do sistema. Na maioria dos casos, passageiros das linhas que fazem a ligação entre Sorocaba e os vizinhos municípios de Itu, Araçoiaba da Serra e São Roque. Os denunciantes comprovaram as queixas relatadas por meio de fotografias e vídeos. Em todos os casos, a reportagem questionou a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos (EMTU), empresa pública vinculada à Secretaria Estadual de Transportes Metropolitanos e responsável pelo planejamento, fiscalização e controle dos sistemas de média e baixa capacidades nas regiões metropolitanas de São Paulo.

O jornal indagou sobre o limite de passageiros por viagem, permissão para os ônibus circularem com excesso de passageiros, medidas de segurança relacionadas à Covid-19 que as empresas de transportes coletivos devem adotar em suas viagens e, ainda, o que a EMTU pretende fazer para evitar que os coletivos continuem trafegando com lotações acima do permitido. A instituição, no entanto, limitou-se a responder parcialmente referente aos problemas registrados no trajeto Sorocaba-Itu. Informou que a operadora circulou no dia 11 de outubro -- uma segunda-feira -- com tabela horária de sábado, que apresenta intervalo bem maior entre as viagens, sem autorização. Naquela data os intervalos entre as partidas deveriam corresponder à tabela válida para os dias úteis. Por conta dessa irregularidade, a transportadora seria autuada, “conforme prevê a legislação”. Sobre o descumprimento das medidas sanitárias, obrigatórias durante a pandemia de Covid-19, a agência apenas citou a lista de protocolos definidos pelos órgãos da saúde pública.

O modo como a EMTU tratou as demandas apresentadas nas últimas semanas pelos usuários de Sorocaba, Itu, Araçoiaba da Serra e São Roque demostra que nada mudou no que se refere ao transporte público suburbano. O desdém é praticamente idêntico ao que ocorria antes da criação da Região Metropolitana de Sorocaba (RMS), em 2014. Até então, a incumbência de planejar, fiscalizar e controlar o sistema cabia à Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp).

Não sem motivo, a população que depende dos ônibus suburbanos se considera negligenciada. As contradições começam pela própria definição adotada pela EMTU para o sistema: serviço de transporte público entre cidades diferentes por meio de veículos de características urbanas (duas ou mais portas, catraca, etc). Levando em consideração que os trajetos geralmente incluem trechos rodoviários, os ônibus sububanos deveriam possuir características semelhantes às dos demais coletivos que fazem percursos idênticos.

Mesmo a questão da lotação é cercada de controvérsias. Enquanto a Artesp é taxativa ao determinar que as linhas de características suburbanas não podem transportar passageiros em pé, a EMTU permite às empresas que operam essas linhas na região de Sorocaba trafeguem como verdadeiras “latas de sardinha”, com pessoas espremidas umas contra as outras, sobre os degraus de acesso e até mesmo encostadas ao motorista e aos para-brisas. Deixando de lado o argumento comodidade, certamente menosprezado pelas empresas de transporte, ainda restam justificativas suficientemente graves para acender a luz de alerta da EMTU, como higiene -- especialmente durante a pandemia -- e proteção em casos de acidentes. Se os ocupantes de carros de passeio e de ônibus interurbanos são obrigados por lei a trafegar usando cinto de segurança, por que os passageiros de suburbanos podem viajar em pé, soltos?

Com a palavra a própria EMTU e os órgãos que se ocupam dos interesses coletivos da RMS, como a Agência Metropolitana de Desenvolvimento de Sorocaba (Agem), o Conselho de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Sorocaba (CDRMS) e o recém-criado Parlamento Regional Metropolitano (PRM).