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Editorial

No trânsito, o sentido é a vida

Os veículos evoluíram, as ruas e rodovias ficaram mais seguras e a legislação apertou o cerco

19 de Setembro de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Semana Nacional do Trânsito
Semana Nacional do Trânsito (Crédito: Arquivo Jornal Cruzeiro do Sul)

“No trânsito, sua responsabilidade salva vidas.” O tema da Semana Nacional do Trânsito de 2021, aberta neste sábado (18), baliza o caminho para a tão almejada, crucial e inadiável pacificação das ruas e das rodovias brasileiras. Apenas dois recortes pinçados das fartas estatísticas sobre acidentes levantadas pelos departamentos estaduais de trânsito e compiladas pelo Conselho Nacional (Contran) são suficientes para justificar uma guinada urgente no comportamento dos motoristas: em cerca de 75% das ocorrências registradas em todo o País as causas estão diretamente ligadas à imprudência e/ou ao despreparo dos condutores; e, pior ainda, quase 80% desses casos incluem a combinação entre álcool e direção.

No entanto, apesar de gravíssimo, o fato de três a cada quatro acidentes poderem ser evitados -- simplesmente com mais atenção, preparo, sensatez e respeito às leis de trânsito -- representa apenas uma ponta do enorme iceberg que se esconde sob a tragédia do dia a dia no trânsito. O mais preocupante -- na verdade, revoltante -- é a constatação de que em pouco mais da metade das ocorrências que terminam em óbitos -- aproximadamente 53% -- pelo menos um dos condutores envolvidos está embriagado.

Completando as cifras nutridas pela nefasta combinação de imprudência, negligência e ignorância de alguns motoristas, não se pode esquecer que a epidemia de irresponsabilidade vem ceifando a média diária de 80 vidas brasileiras desde 2016. De acordo com o Contran, os incidentes envolvendo veículos terrestres de todos os tipos deixaram um saldo de 31.307 óbitos apenas em 2019.

A avalanche de acidentes que há décadas assola o País configura a cruel faceta de uma tragédia recorrente, inclusive em Sorocaba. A manchete do Cruzeiro do Sul de 15 de setembro de 1961 -- há exatos 60 anos --, por exemplo, já apresentava o combate à embriaguez ao volante como um difícil desafio para sociedade como um todo.

Preocupados com a quantidade e a gravidade dos acidentes registrados na rodovia Raposos Tavares, as autoridades policiais da região discutiam a adoção de punições mais rígidas aos infratores, como a prisão e a suspensão da CNH. Desde então, os veículos evoluíram significativamente, as ruas e rodovias ficaram mais seguras e a legislação apertou o cerco aos transgressores.

Quanto àqueles atrás do volante, que têm o discernimento, pouca coisa mudou. Há menos de dois meses -- em 27 de julho --, um homem embriagado, ao volante de um VW Gol em alta velocidade em plena rua Paulo Emanuel de Almeida -- no bairro sorocabano Wanel Ville --, invadiu a calçada e atropelou e matou um garoto de sete anos.

Nem mesmo a pandemia do novo coronavírus, com o consequente isolamento social, foi capaz de reduzir significativamente as cifras catastróficas do trânsito. Entre janeiro e outubro de 2020, 27.839 indenizações por mortes em acidentes foram pagas no Brasil. Tampouco, mexer no bolso dos infratores se mostrou alternativa tão eficiente quanto se previa. Apesar do aumento no valor das multas, o Estado de São Paulo registrou entre janeiro de 2019 e julho de 2021, 12.470 acidentes e 892 óbitos de motoristas com suspeita de embriaguez ao volante. Na Região Metropolitana de Sorocaba, foram 111 flagrantes de condutores comprovadamente alcoolizados nos últimos três anos. Desse total, 54 foram pegos nos limites do território sorocabano, sendo seis em 2019, 12 no ano passado e 36 apenas nos primeiros sete meses de 2021.

O levantamento mais recente realizado pelo Sistema de Informações Gerenciais de Acidentes de Trânsito do Estado de São Paulo (Infosiga-SP), divulgado na semana passada, traz mais dados alarmantes: 42,3 das mortes de motoristas com suspeita de embriaguez ao volante (378) registradas de janeiro de 2019 a julho deste ano aconteceram aos finais de semana no período noturno; além disso, 18% dos mortos tinham entre 18 e 24 anos.

A constatação de que a selvageria que impera no trânsito resiste às diferentes e sucessiva tentativas de controle deixa evidente a necessidade de abordagens mais contundentes e amplas. As lições do passado nos ensinam que está na hora de uma ação concentrada. A crise exige um plano que envolva todos os setores da sociedade e contemple intervenções integradas nos âmbitos educacional, fiscalizador e punitivo. A expectativa é que, ao final da Semana Nacional de Trânsito, no próximo sábado (25), os administradores, políticos, instituições e especialistas passem da teoria à prática, adotando medidas que realmente ajudem a salvar vidas. À população, por sua vez, cabe cobrar, se educar e respeitar as leis.