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Editorial

Privatização contra ineficiência

Discussão sobre projeto de lei que trata da exploração dos serviços postais pela iniciativa privada está em debate na Câmara

04 de Agosto de 2021 às 00:37
Cruzeiro do Sul [email protected]
 Privatização em andamento
Privatização em andamento (Crédito: LUIZ SETTI / ARQUIVO JCS)

Um assunto que atrai as atenções atualmente é a discussão sobre a privatização dos Correios, empresa que foi incluída no Programa Nacional de Desestatização (PND) em abril. Com a volta do Parlamento aos trabalhos, após o recesso, o tema está em debate na Câmara dos Deputados, por meio de projeto de lei que trata da exploração dos serviços postais pela iniciativa privada. A urgência da tramitação já foi aprovada pela Casa.

O projeto não trata diretamente da privatização da estatal, mas autoriza que serviços postais possam ser explorados pela iniciativa privada, mesmo os que são prestados pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), nome oficial dos Correios.

Segundo a proposta, a União, que hoje é dona de 100% da empresa, manteria para si apenas uma parte dos serviços, definida no PL como “serviço postal universal”, que se resume a entrega de encomendas simples, cartas e telegramas.

Isso porque a Constituição Federal determina que a União tenha serviço postal e correio aéreo nacional. O projeto ainda deverá passar por ao menos seis comissões da Câmara. Se aprovado, irá para o Senado.

O assunto desperta tanto interesse que, anteontem, o ministro das Comunicações, Fábio Faria, fez um pronunciamento em cadeia nacional de TV. Após dizer que os Correios são um “orgulho do Brasil”, Faria defendeu a privatização.

O ministro lembrou que o projeto foi aprimorado e uma das mudanças é a que estabelece um período de transição para a nova empresa e um período de estabilidade para os empregados da estatal. “Primeiro, consultorias apoiaram o BNDES num estudo detalhado sobre o que precisa ser preservado e melhorado na empresa e nos serviços.

Depois, na Câmara, o projeto foi aprimorado, estabelecendo limites de preço e uma tarifa social, que garantirá os serviços mesmo para pessoas que não podem pagar por eles”, disse.

Apesar do lucro auferido em 2020, o faturamento se mostra insuficiente frente ao que precisa ser investido de forma ininterrupta para que os Correios permaneçam competitivos. Para Faria, é questão de sobrevivência e só com a privatização será possível manter a ECT saudável.

No mundo dos negócios, há um velho ditado: “Quem não tem competência não se estabelece”. Contudo, ele não serve para boa parte das empresas públicas ou estatais. Infelizmente, no Brasil, são raras as estatais eficientes.

A diferença de comprometimento entre uma empresa privada e uma pública é abissal. Uma tem dono (ou donos), cobrança, metas. A outra tem um “dono” de passagem, as cobranças praticamente não existem, está sempre sujeita ao humor do funcionalismo público.

E pior, muitas dessas estatais -- para não dizermos todas -- costumam servir de cabide de emprego para acomodar os apadrinhados dos políticos.

Não é diferente nos Correios, cujos serviços perderam muita qualidade ao longo das últimas décadas. Com a privatização -- caso ela seja aprovada, os Correios teriam a chance de crescer, competir, gerar mais empregos, desenvolver novas tecnologias, ganhar eficiência, agilidade e pontualidade.

Nesse sentido, um modelo europeu pode ser um bom exemplo. O Deutsche Post, antigo correio alemão, foi criado ainda na fundação do Império Alemão, em 1871, como uma estatal. Além de cuidar da entrega de cartas e encomendas, também atuava no setor de serviços financeiros e telefonia.

Há quase 30 anos, na década de 1990, a Alemanha iniciou as discussões sobre sua privatização. O processo de privatização levou 10 anos para ser concluído. Primeiramente, a empresa foi dividida em três, uma para cada ramo: correios, serviços financeiros e telefonia.

Em seguida, foram definidas regras para o setor postal e criada uma agência reguladora para coordenar e supervisionar o mercado e garantir, por exemplo, que todas as cidades seriam atendidas. Por último, decidiu-se que em vez de vender toda a companhia de uma vez, em leilão, a empresa seria vendida em fases, por meio da abertura de capital.

Isso impediu que o serviço ficasse sob administração de apenas uma empresa, garantindo maior concorrência. Após a privatização, o Deutsche Post comprou a empresa americana de entregas expressas DHL, que hoje se chama Deutsche Post DHL Group, com sede na Alemanha.

Atualmente, é uma das maiores companhias logísticas do mundo, com cerca de 550 mil funcionários. Não que devamos copiar esse modelo. Cada caso é um caso, como diria o filósofo contemporâneo. Mas o processo de privatização dos Correios deve ser debatido, com base em estudos, exemplos internacionais, e a nossa realidade.

Na verdade, muitas dessas estatais são verdadeiros entraves para o País. Atrasam o desenvolvimento e muitas são focos frequentes de escândalos. Sem tantas estatais problemáticas para cuidar, o Estado poderia priorizar áreas essenciais como saúde, educação e segurança.

Por que manter monopólio dos Correios? Por que manter estatais que dão prejuízos e dores de cabeça? Infelizmente, quanto mais empresas públicas existirem no Brasil, haverá mais riscos de maracutaias, acomodações, desvios.

Essa é a triste realidade. Privatizar o que não é eficiente é uma atitude corajosa e nobre, e deve ser apoiada. O mundo atual precisa de competitividade, desenvolvimento, investimentos e, sobretudo, comprometimento.