Editorial
Todos contra a desigualdade social
Pandemia afetou sobremaneira a renda dos brasileiros, especialmente os mais pobres. Hora de esforço conjunto para reverter esse quadro
É notório que a desigualdade social é um dos principais problemas da sociedade moderna. É um mal que afeta todo o mundo, em especial os países em desenvolvimento. Desigualdade social significa menos qualidade de vida, menos segurança, menos desenvolvimento. E isso para todos, ricos e pobres.
Objetivamente, a desigualdade pode ser medida por faixas de renda. Também podem ser utilizados fatores como o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), escolarização, acesso à cultura e a serviços básicos -- como saúde, segurança, saneamento etc.
A renda, por si só, não garante que não haja desigualdade, pois a qualidade de vida pode, em alguns casos, não depender dela. Porém, em geral, qualidade de vida e renda caminham juntas, de mãos dadas. Foi pensando nisso, por exemplo, que o estatístico italiano Corrado Gini criou, em 1912, o índice ou coeficiente de Gini, uma fórmula que permite a classificação da desigualdade social. O índice varia de 0 a 1. Quanto menor o valor, menos desigualdade. A escala de Gini é medida com base na renda.
E é justamente aí que entra uma das piores consequências da pandemia. Além da irreparável morte de milhares de pessoas, o novo coronavírus afetou sobremaneira a economia e a renda do brasileiro. Pesquisa do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV Social) concluiu que, principalmente por conta da Covid, o Brasil registrou uma queda de 11,3% na renda média do trabalhador. Nos primeiros três meses de 2020, o valor médio per capita alcançou R$ 1.122, o maior da série. No entanto, com a crise, caiu para R$ 995 em 2021. Esta é a primeira vez que a renda fica abaixo de R$ 1.000, sendo o patamar mais baixo desde 2012, quando teve início a série histórica. Os pobres foram os que tiveram a renda mais afetada, com uma queda de 20,81%, quase duas vezes a queda da renda média.
Assim, a desigualdade proveniente do mercado de trabalho subiu a um recorde histórico, segundo o levantamento da FGV. No primeiro trimestre de 2021, o índice de Gini chegou a 0,674, após ser 0,669 no quarto trimestre de 2020. Para efeito de comparação, no primeiro trimestre de 2020, quando a pandemia ainda não tinha afetado tão fortemente o mercado de trabalho no País, o resultado era consideravelmente mais baixo: 0,642.
O levantamento calcula ainda o índice de bem-estar social, que combina as medidas de desigualdade de renda e do nível de renda da população. Nesse quesito, houve queda de 19,4% em relação ao patamar de um ano antes. Ou seja, a perda da renda foi a maior responsável pela queda do poder de compra dos brasileiros.
Um outro estudo, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), complementa que os trabalhadores brasileiros com menor nível de instrução foram os mais prejudicados pelo choque provocado pela pandemia. No primeiro trimestre de 2021, o número de horas trabalhadas pelos profissionais com ensino fundamental incompleto despencou 12,9% em relação ao mesmo trimestre do ano anterior. Por outro lado, as pessoas com ensino superior completo trabalharam 11,7% mais horas que no mesmo período do ano anterior.
O estudo faz parte do cálculo do Índice de Qualidade do Trabalho (IQT) que combina informações de mercado de trabalho com dados de escolaridade e experiência de trabalhadores. O objetivo é acompanhar a evolução da produtividade do trabalho no País.
Com bases nesses dados, constata-se um viés de melhora -- crescimento médio de 2,31% ao ano -- na qualidade da população ocupada no mercado de trabalho brasileiro entre o segundo trimestre de 2012 até o primeiro trimestre de 2021. Ou seja, a qualificação profissional é importante e dá resultados.
Diante dos últimos acontecimentos como ampliação do auxílio emergencial, prosseguimento da vacinação em faixas etárias mais baixas e sem comorbidades, desempenho da Bolsa de Valores e retomada lenta mas gradual dos negócios, a economia tende a seguir apresentando recuperação. Tudo indica que o atual trimestre já poderá mostrar o início da virada para que a desigualdade volte a diminuir. É isso que todos buscamos.