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Editorial

Torneio de futebol é assunto do STF?

Em sessão especial, o Supremo vai decidir sobre a Copa América no Brasil. Mas desde quando um campeonato de futebol é matéria constitucional?

09 de Junho de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Estátua do STF.
Estátua do STF. (Crédito: REPRODUÇÃO / INTERNET)

Como se já não houvesse muita coisa importante para resolver no Brasil, eis que o Supremo Tribunal Federal (STF) marcou para quinta-feira (10) uma sessão extraordinária para -- pasmem -- tratar com urgência e decidir a respeito da realização ou não da Copa América no Brasil.

A audiência faz parte de um processo impetrado pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), que tem a relatoria da ministra Cármen Lúcia, autora da solicitação da sessão. O presidente do STF, Luiz Fux, aceitou o pedido e inseriu o assunto na pauta.

Segundo despacho dela, os ministros deverão analisar ao longo de 24 horas, em plenário, como proceder com a competição. Cármen Lúcia argumentou que a marcação da sessão extraordinária se deve pela “excepcional urgência e relevância do caso e da necessidade de sua célere conclusão, considerando que se noticia o início da competição desportiva questionada para o próximo dia 13 de junho”.

Os advogados das partes — o PSB e a Presidência da República, representada pela Advocacia Geral da União (AGU) — estão autorizados a fazer sustentações orais nesta quarta para que depois os ministros apresentem seus votos.

O processo foi distribuído no STF no dia 1º de junho, um dia após o anúncio por parte da Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) de que a Copa América viria para o Brasil. O País atendeu a um pedido da entidade, que se viu sem saída para o torneio, já que Colômbia e Argentina não puderam receber mais a competição.

No caso dos colombianos, o ponto crucial foi a onda de protestos nas ruas, que deixou em risco a segurança no país. Já o governo argentino suspendeu o torneio ao ver a escalada da pandemia no país.

A realização do torneio em solo nacional divide opiniões entre os brasileiros. Assim que foi confirmada, choveram opiniões e discussões acaloradas nas mídias e redes sociais.

Os opositores da Copa América afirmam ser um contrassenso fazer um evento dessa magnitude em plena pandemia e no momento em que enfrentamos possível nova escalada da doença. Dizem que a movimentação das delegações pode levar ou trazer novas variantes do vírus. Afirmam ser um desrespeito às milhares de vítimas da doença no País.

Já os defensores -- ou pelo menos os não críticos -- alegam que os jogos serão sem torcida, com controle sanitário, que todos os jogadores serão vacinados e que as delegações serão testadas sistematicamente.

Eles se apoiam também no fato de jogos do Campeonato Brasileiro e da Copa Libertadores -- além de outros eventos esportivos -- estarem acontecendo normalmente, e que nesses casos não houve toda essa gritaria.

Independentemente de que lado você esteja neste assunto, uma certeza é que até isso virou polarização política, com discursos cheios de hipocrisia.

Mas aqui o ponto é outro. Sem entrar no mérito se a Copa América deve ou não ser realizada no Brasil, desde quando a realização de torneio de futebol, sem torcida, virou matéria constitucional? Existem tantos processos sérios e importantes -- envolvendo políticos, empresas e bilhões de reais -- para serem desengavetados, analisados, julgados, e vão mesmo discutir a realização ou não de um evento esportivo específico? Se o objetivo é avacalhar o STF, então estão dando mais um passo nessa direção.

A maior corte do País precisa tratar de decidir sobre assuntos realmente relevantes para a sociedade, e não entrar em disputas como essa em que não deveria se meter. E, pior, seja qual for a sua decisão, sairá perdendo de todo jeito.

Afinal, se reprovarem a Copa América, como irão proceder com os outros campeonatos que foram e estão sendo disputados em meio à pandemia? Vão barrar o Brasileirão, por exemplo, cujos direitos de TV são da Rede Globo? Se liberarem, serão criticados pela turma da polarização, dos extremos. Ou seja, é mais uma enrascada em que o STF se mete. Deveria simplesmente ignorar tal pedido e pronto.

Seria ridículo uma competição de âmbito internacional ser suspensa por um tribunal local enquanto todas as outras competições desse mesmo esporte estão acontecendo no País. Que o STF não caia nessa bobagem. Quem tem de responder por isso é a CBF, órgão máximo do futebol nacional. Agora, se a CBF é um mar de lama, isso é outra história.

Além do que, um veto do STF iria transparecer uma completa e absurda interferência no Executivo, algo que não é nada normal nem saudável. O STF precisa saber a hora e o momento certo de usar sua soberania, sua força. E não será liberando ou vetando a Copa América que isso irá acontecer.