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Editorial

Nem os mortos estão tendo paz

Violação de sepulturas para furtos de peças e objetos em cemitérios públicos municipais cresce em Sorocaba

01 de Maio de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
Evento: Furtos no Cemitério da Saudade voltam a ser alvo de reclamações.
Local: Cemitério da Saudade - Praça Pedro de Toledo, s/n, Além Linha, em Sorocaba
Furtos no Cemitério da Saudade voltam a ser alvo de reclamações (Crédito: Fábio Rogério )

Que os bandidos e criminosos há muito tempo não respeitam ninguém aqui no Brasil, isso a gente já está cansado de saber. Mas de uns tempos para cá a bandidagem resolveu abusar. Além dos vivos, passaram a não respeitar nem mesmo os mortos.

A violação de sepulturas, sobretudo em cemitérios públicos municipais, vem crescendo nos últimos anos. Os alvos são bem escolhidos pelos criminosos: geralmente lápides antigas de mármore e peças ou detalhes em bronze.

Isso quando não são, literalmente, arrombadas, na intenção de encontrar algum material mais valioso no interior dos túmulos.

E a falta de respeito e de compaixão já atingiu algumas vezes o impensável, com ladrões violando os caixões para furtarem objetos de valor dos cadáveres -- dentes de ouro, por exemplo. Ou seja, algo abominável.

Infelizmente, Sorocaba não está imune a esses absurdos. De acordo com matéria publicada nesta semana aqui no Cruzeiro do Sul, as sepulturas do cemitério da Saudade, na Vila Carvalho, por exemplo, têm sido alvo frequente de furtos e vandalismo.

Segundo informações da Secretaria de Serviços Públicos e Obras (Serpo), confirmadas pela administração do cemitério, somente no mês de abril foram quatro casos. Neste ano, já houve oito ocorrências. Além dos casos de abril, foram registrados um em janeiro, dois em fevereiro e outro em março.

Somente em três ocorrências nesse cemitério em abril, foram furtados 11 ornamentos de bronze. Como são peças artísticas e ornamentais, não é possível estimar o valor desses roubos.

Em outro evento, uma sepultura foi depredada e a porta de bronze, levada pelos malfeitores. Uma moradora ouvida pela reportagem, dona de um dos jazigos violados, garante que os furtos são em número bem maior do que o divulgado e que os criminosos deixam um rastro de destruição no cemitério.

Para efeito de comparação, em 2020 foram seis ocorrências ao todo. Ou seja, o número de furtos nos quatro primeiros meses de 2021 é maior do que o total do ano passado. E isso sem contar a enorme possibilidade de subnotificação, já que muitas famílias só tomam conhecimento dos delitos meses depois do acontecido.

Evidentemente que a falta de segurança colabora, e muito, para essa situação. Raramente um cemitério público conta com sistema de segurança eficaz, com câmeras de monitoramento, nem vigilância suficiente para inibir os bandidos. Tudo isso facilita a ação dos criminosos.

Se a polícia e as autoridades já têm enorme dificuldade em proteger os vivos, o que dizer de guardar a memória e a honra dos mortos? No caso de Sorocaba, apesar dos esforços da Guarda Civil Municipal (GCM), os bandidos parecem estar ganhando essa batalha.

Nesse sentido, uma das apostas da Prefeitura de Sorocaba é a criação do Centro de Operações Integradas (COI), sistema que unifica as ações e informações coletadas pelas polícias por meio de videomonitoramento.

Elas serão compartilhadas com todas as forças de segurança pública do município para a montagem de estratégias de combate a todos os tipos de crimes.

Do ponto de vista jurídico, a questão é complexa. Não há responsabilidade objetiva, uma vez que os danos decorrentes da inércia estatal fogem ao controle público. Por outro lado, caso seja constada uma omissão específica, o Estado deve responder pelos danos.

Ainda assim, a partir de jurisprudência, os lesados têm logrado êxito nos tribunais, comprovando nexo causal entre o dano sofrido e a omissão dos municípios.

Contudo, o maior prejuízo -- que os tribunais não conseguem prever nem cobrar -- é o emocional. Além de já sofrer pela perda ou ausência de um ente querido, a constatação de vê-lo violado e vilipendiado é mais um duro golpe para as famílias que passam por isso. É motivo mais do que suficiente para uma absoluta indignação.