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Racismo à brasileira

29 de Outubro de 2020 às 00:01

Thífani Postali e Josué de Oliveira Santos

É sabido que a história do Brasil envolve, especialmente, a exploração e violência contra povos africanos e indígenas que foram escravizados durante o período colonial. De acordo com Silvio Almeida, foi nesse período que a construção do conceito de raça foi introduzida no País, quando o homem branco se colocou como universal e detentor do direito de explorar outros povos, estrutura que ainda reflete na vida dos brasileiros.

É importante ressaltar que os afro-brasileiros, após o fim do regime escravagista, enfrentaram novos desafios, como a marginalização social e a exploração imposta pelo sistema capitalista, como previu o abolicionista Joaquim Nabuco, em 1883. O fato de o Brasil ter incentivado a vinda de mão de obra europeia, sobretudo para atender o projeto de branqueamento da população brasileira -- que levava em consideração as teorias raciais que buscavam afirmar a superioridade do homem branco -- contribuiu ainda mais para a permanência da discriminação racial no País.

De acordo com Almeida, o racismo deve ser entendido de três formas: individual, institucional e estrutural. O racismo individual é compreendido como um fenômeno ético ou psicológico e está enraizado na pessoa, que pode exteriorizá-lo a partir de atitudes discriminatórias ou não. A discriminação racial é a atitude que usa a posição de privilégio para atribuir vantagens ou desvantagens às pessoas, considerando raça.

Já o racismo institucional diz respeito a como as instituições de poder operam para manter o racismo de modo “naturalizado” na sociedade, resultando em desigualdades sociais. A ausência ou o enfraquecimento de políticas de inclusão social, por exemplo, são atitudes que mantêm as vantagens de pessoas considerando questões de raça. Almeida lembra que, para haver mudanças significativas, é preciso desenvolver e praticar políticas de ações afirmativas que visem combater o racismo estrutural, forma que resulta na naturalização do racismo na sociedade.

Em junho de 2020, a Globo News recebeu duras críticas pela cobertura do caso de George Floyd, afro-estadunidense que foi morto de maneira brutal por um policial branco nos Estados Unidos. Na ocasião, o programa “Em pauta” levantou um debate sobre a questão com uma bancada formada por diversos jornalistas brancos. Cabe ressaltar que ele possui profissionais negros que, por vivenciarem o racismo em suas vidas, estariam muito mais aptos para cobrirem uma pauta sobre o assunto.

O tratamento descuidado foi revelador do racismo institucional praticado, desde sempre, pelo grupo Globo (vide inúmeros trabalhos científicos acerca do tema). O evento gerou uma crise de imagem, fazendo com que o canal recorresse a uma ação de relações públicas. A questão foi altamente compartilhada nas redes sociais e, para lidar com a crise, o programa fez uma edição especial com bancada formada pelos profissionais negros que debateram o tema racismo. Também incluiu as comentaristas Zileide Silva e Flavia Oliveira como fixas no quadro que é formado por 24 profissionais, sendo 21 deles brancos. Prometeram maior cobertura sobre pautas raciais, reconhecendo o racismo estrutural.

Ocorre que, com o avanço da internet, muitas pessoas estão se informando sobre os assuntos que antes eram ocultados pelas instituições dominantes, ação comum ao racismo estrutural. Essa mudança tem feito com que a população mais bem informada cobre das instituições ações afirmativas. Quem não assumir posturas mais éticas será fortemente cobrado, como o caso da Globo News. Vale lembrar também o caso do Magazine Luiza, que implementou política de cota para resolver o problema da desigualdade na empresa.

É importante saber que o simples fato de não entendermos a importância das ações afirmativas faz parte do racismo estrutural. Para não cairmos nessa armadilha, o caminho é informação, conscientização e atitudes antirracistas.

Thífani Postali é doutoranda em Multimeios pela Unicamp e mestra em Comunicação e Cultura pela Uniso. É professora nos cursos de Comunicação e Jogos Digitais da Uniso e membro dos grupos de pesquisas MidCid e Nami. Blog: www.thifanipostali.com

Josué de Oliveira Santos é graduando do curso de Relações Públicas da Uniso. E-mail: [email protected]