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Provérbios

01 de Setembro de 2018 às 09:50

Aldo Vannucchi

Ao abrir a Sagrada Escritura, li, outro dia, em Jeremias 31, 29: “Haverá um tempo em que o povo não dirá mais: Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos se estragaram!” Era um provérbio daquele tempo. Mas o profeta contesta-o, insistindo que erros e pecados são de responsabilidade estritamente pessoal.

Já naquela época, provérbios faziam parte da conversação comum. Na própria Bíblia há o Livro dos Provérbios, uma coletânea, na verdade, de conselhos e instruções de sabedoria prática. Provérbio, no sentido exato, é um dito curto, em forma direta e atrativa, fácil de decorar e de aplicar às diferentes situações da vida. Alguns até soam com rima: “Água mole em pedra dura tanto bate até que fura”.

De criação anônima, os provérbios vão se propalando por todos os povos, sobretudo por tradição oral, de geração a geração, como sentenças de cunho moral ou prático, com visos de filosofia popular. Que eles carregam conselhos e advertências oportunas para uma boa conduta da vida, não há como negar. Lembremos dois muito práticos: “Não se deve pôr o carro na frente dos bois” e “Macaco velho não mete a mão em cumbuca”.

Seria ingenuidade, porém, calcar nosso procedimento só pela lição dos provérbios, mesmo porque há provérbios que se contradizem, como observou Machado de Assis: “Repare que para cada provérbio afirmando uma coisa, há outro provérbio afirmando a coisa contrária. Os provérbios mentem”. Comparem-se, por exemplo, “Quem espera sempre alcança” e “Quem vive de esperança morre desesperado”.

Outros provérbios, apesar de simpáticos, merecem contestação, como “Águas passadas não movem moinhos”. Não é bem verdade, porque se houver no ribeirão outro moinho a seguir, as águas certamente irão movê-lo. Contudo, ninguém descarta a recomendação positiva desse ditado popular: tocar a vida pra frente, superando antigos problemas. Melhor, porém, que superar experiências ontem sofridas, seria aprender com elas, no presente.

“Pau que nasce torto, morre torto”. Esse rifão categórico merece repulsa. Aceitá-lo representaria desvalorizar a missão dos educadores, o papel da pedagogia, a importância da medicina reparadora. Em sentido contrário, inspirador e positivo, nunca é demais encarecer: “É de pequenino que se torce o pepino”.

Voltando para a hora atual, acho oportuno fixar também a atenção no “Mentira tem perna curta”, boa advertência para os postulantes do nosso voto, mas também para nós, possíveis eleitores cantados e encantados por eles, que sempre se autoapresentam como santos e milagrentos. Mentindo, mentindo e mentindo, eles costumam ganhar votos com mentiras de perna longa.

E qual provérbio nos daria alguma dica para votar bem? Acho difícil responder, mas uma luz me surpreende na vida do próprio Jesus Cristo. É que em Nazaré, onde cresceu, ele foi hostilizado, certa vez, e resolveu se explicar pela linguagem proverbial. Primeiro, afirmando: “Nenhum profeta é bem recebido em sua própria terra” e daí nasceu o nosso “Santo de casa não faz milagre”. Depois, como queriam que ele fizesse ali grandes sinais, como médico maravilhoso que a todos curava, Jesus lhes disse: “Vocês vão aplicar a mim o provérbio, “Médico, cura-te a ti mesmo” e decidiu não praticar nenhum prodígio, como se fosse um médico qualquer.

Por esses dois provérbios, não esperemos milagres com estas eleições.

Aldo Vannucchi é mestre em Filosofia e Teologia pela Universidade Gregoriana de Roma e licenciado em Pedagogia. Autor de diversos livros, foi professor e diretor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Sorocaba (Fafi) e reitor da Universidade de Sorocaba (Uniso) - [email protected]