Buscar no Cruzeiro

Buscar

Por que seu filho deve conviver com crianças especiais na escola

04 de Março de 2021 às 00:01

Danielle H. Admoni

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 1 bilhão de pessoas têm algum tipo de deficiência no mundo e uma em cada dez é criança. No Brasil, 45,6 milhões de pessoas são portadoras de deficiência. Destas, 7,5% são crianças de até 14 anos de idade, segundo o último censo do IBGE -- de 2010 --, ou seja, cerca de 3,5 milhões de crianças.

Em primeiro lugar, vamos entender quem são essas crianças com necessidades especiais. São aquelas que, por alguma diferença no seu desenvolvimento, requerem certas modificações ou adaptações no programa educacional, visando torná-las autônomas, capazes e mais independentes, para que possam atingir todo o seu potencial. Podem elas ser de condições visuais, auditivas, intelectuais (mentais), físicas e ter duas ou mais destas deficiências, como visual e intelectual ao mesmo tempo.

Entre 2014 a 2018, o número de matrículas de estudantes com necessidades especiais cresceu 33,2% em todo o País, segundo dados do Censo Escolar divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). No mesmo período, também aumentou de 87,1% para 92,1% o percentual daqueles que estão incluídos em classes comuns.

Em 2014, eram 886.815 os alunos com deficiência, altas habilidades e transtornos globais do desenvolvimento matriculados nas escolas brasileiras. Esse número tem aumentado ano a ano. Entre 2017 e 2018, houve aumento de aproximadamente 10,8% nas matrículas. Em 2018, chegou a cerca de 1,2 milhão.

Por lei, pelo Plano Nacional de Educação (PNE), o Brasil deve incluir todos os estudantes de 4 a 17 anos na escola. Os estudantes com necessidades especiais devem ser matriculados preferencialmente em classes comuns. Para isso, o Brasil deve garantir todo o sistema educacional inclusivo, salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados.

O assunto, já abordado exaustivamente, diz respeito à inclusão social de crianças com deficiências físicas e intelectuais. A proposta educacional é oferecer educação de qualidade para todos, sem discriminação, incentivando os alunos especiais a frequentarem as mesmas escolas que as demais crianças. Trata-se de um movimento mundial, uma importante transformação, resultando na valorização da diversidade.

Naturalmente, como em toda mudança, partem dúvidas dos pais: será positiva a convivência do meu filho entre crianças com diferenças? É benéfico? Nas escolas que recebem crianças especiais, elas são estimuladas pelos outros alunos, alcançam progressos muito superiores aos que teriam em escolas especializadas, onde estariam “protegidas” deste contato e, portanto, segregadas.

Ao participarem das atividades regulares, as crianças deficientes desempenham maior quantidade de tarefas do que antes e aprendem mais com o amigo que tem uma habilidade maior. Em contrapartida, as crianças ditas “normais” fortalecem características que talvez não adotassem se não tivessem essa experiência. A convivência entre alunos com deficiência desenvolve significativamente a tolerância e a solidariedade, além de aumentar a qualidade nos relacionamentos e diminuir a tendência de comportamentos agressivos.

Os educadores, diante de uma turma ainda mais heterogênea, aprendem a lidar com as diferenças dos alunos, enxergando cada um como um ser individual, com suas próprias particularidades e dificuldades. Consequentemente, a avaliação feita pelo professor se torna mais personalizada, humanizada.

Os pais também aprendem, pois se envolvem em uma realidade totalmente desconhecida até então, embora alguns ainda tenham receio de que um aluno com necessidades especiais possa gerar queda no rendimento de todo o grupo. Entretanto, o preparo da escola inclui lidar com o fato de que as crianças especiais possam não alcançar a mesma produção dos demais, o que não interfere no cronograma e tampouco prejudica o restante da classe.

A proposta da inclusão é que as crianças se beneficiem com este convívio. Afinal, todas têm algo a aprender e ensinar, independentemente do nível intelectual e social. Com esta experiência, as crianças ditas “normais” tendem a crescer sem preconceitos e com uma noção mais ampla sobre a realidade da vida. Dar às crianças essa oportunidade é oferecer ao mundo futuros cidadãos que saberão o real significado de respeito, empatia, responsabilidade e compreensão sobre ser diferente.

Dra. Danielle H. Admoni é psiquiatra da Infância e Adolescência na Escola Paulista de Medicina (Unifesp) e especialista pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).