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Países Baixos: parlamentarismo e avanço da extrema-direita

03 de Fevereiro de 2021 às 01:23

Carmela Marcuzzo do Canto Cavalheiro

As mudanças políticas que ocorrem nos Países Baixos devem ser analisadas sob três aspectos: o primeiro é a maior celeridade  que o parlamentarismo possibilita para as democracias solucionarem problemas na gestão pública de forma menos traumática. O segundo, é a maior responsabilização da classe política em temas que causam todo tipo de dano para a sociedade. E o terceiro, é o rápido avanço da extrema-direita nos Países Baixos verificada pela célere ascensão do Partido Fórum pela Democracia, em neerlandês Forum voor Democratie, sob a liderança do jovem Thierry Baudet.

É importante observar que o Reino Unido dos Países Baixos é uma monarquia constitucional, em que a posição do rei é definida na Constituição, e os cidadãos votam em seus representantes, sendo uma democracia parlamentar. O Reino é constituído por quatro países, Países Baixos, Aruba, Curaçao e São Martinho, e a Carta do Reino dos Países Baixos define a relação constitucional entre os quatro países. Recentemente, as duras críticas com relação aos benefícios fornecidos para algumas famílias que tiveram que reembolsar de forma equivocada e injusta dezenas de milhares de euros ao Estado neerlandês foi motivo de transtornos políticos.

As acusações demonstraram uma falha no Estado de direito, e as família ingressaram com ações contra cinco políticos, entre esses o ministro das Finanças e o ministro da Economia, responsabilizando-os por má gestão. Diante da crise instaurada na coalizão do governo neerlandês e as palavras do primeiro-ministro, Mark Rutte, de que o governo não atingiu seus elevados padrões. Os partidos de oposição exigiram uma renúncia, o líder do Partido do Trabalho, em neerlandês Partij van de Arbeid (PvdA), então a liderança do partido renunciou. A renúncia do líder levou ao pedido de demissão por parte do primeiro-ministro.

O primeiro-ministro ofereceu, no dia 15 de janeiro, ao rei Willem-Alexander, a renúncia, em um pedido de demissão

formalizado de todos os ministros e secretários de Estado. É a primeira vez que ocorre uma queda completa do gabinete. Na tarde do mesmo dia, o rei pediu ao primeiro-ministro, ministros e secretários de Estado que continuassem realizando o que fosse considerado necessário pelo interesse do reino. É costume que o primeiro-ministro envie uma carta de demissão ao rei e o governo entre no chamado estado provisório enquanto o terceiro gabinete de Rutte se encerra.

A crise que se instaurou não está relacionada com a popularidade de Rutte, tendo em vista que o primeiro-ministro ainda encontra dois terços de aprovação, sendo que a maioria dos neerlandeses é desfavorável à sua saída. No entanto, o rápido avanço do líder Baudet da extrema-direita e as ideias eurocéticas, o fechamento das fronteiras, as críticas sobre a imigração demandam atenção, tendo em vista a célere ascensão do partido no Senado, conseguindo 12 assentos.

O relatório condenatório ao Comitê de Benefícios foi feito urgentemente e mostrou a forma com que as famílias que sofreram injustiça devem ser reparadas. Houve grave indignação da sociedade e a percepção de que os políticos devem ser responsabilizados em casos de comprovada má-gestão. Entretanto ainda em um contexto político de grande aprovação do gabinete que se desfez, Baudet conseguiu tirar votos do líder da ultradireita, Geert Wilders, e de liberais de direita, demonstrando uma grande mudança política que deve ser observada.

Baudet critica as excessivas atenções para as mudanças climáticas e a sustentabilidade. O Fórum para a Democracia alega ser o partido do renascimento e para a nova democracia neerlandesa. No momento em que a União Europeia e a sociedade internacional devem lidar com o cenário da pandemia da Covid-19, o vírus mais transmissível, a vacinação, a crise econômica, entre outros, as democracias terão que lidar com um complexo

contexto.

Profa. dra. Carmela Marcuzzo do Canto Cavalheiro,  Universidade Federal do Pampa (Unipampa), câmpus Santana do Livramento (RS), área de Direito Internacional é doutora pela Universidade de Leiden/Países Baixos.