Pacto com Sorocaba e com as próximas gerações
Trecho da avenida General Carneiro, em Sorocaba. Crédito da foto: Emídio Marques (4/9/2019)
Dom Julio Endi Akamine
Muita polêmica têm suscitado as discussões sobre queimadas na Floresta Amazônica e, em um círculo menor, sobre o Sínodo Especial da Amazônia. Neste artigo gostaria de convidar as pessoas de boa vontade a voltar a sua atenção para uma necessidade mais próxima de nós, mas que tem também relação com a preservação do meio ambiente: a necessidade de fazer um pacto com Sorocaba e com as próximas gerações para entregar-lhes uma cidade mais limpa, justa, humana e misericordiosa.
Concretamente como podemos fazer isso? Aponto algumas poucas atitudes que podem favorecer esse pacto com as próximas gerações.
1. Mudar nosso estilo de vida. Atualmente vivemos um estilo esbanjador e socialmente injusto. Essa voracidade consumista tem como causa principal a falta de uma espiritualidade autêntica e libertadora. Com efeito, quanto mais vazio está o coração da pessoa, tanto mais ela necessita de objetos para comprar, para possuir e para consumir. Além de perdulário, o coração vazio é incapaz de aceitar limites. Com o coração vazio de Deus e anestesiado pelo consumismo não conseguiremos sequer reconhecer que haja um verdadeiro bem comum a ser promovido.
Ter um estilo de vida mais sóbrio e austero não somente ajudará a evitar os fenômenos climáticos, mas também as terríveis catástrofes sociais que estão por vir se nada fizermos agora. Com efeito, a busca de um estilo de vida mais sóbrio visa à superação da situação injusta do mundo de hoje em que “uns vinte por cento da população mundial consomem recursos numa medida tal que roubam às nações pobres, e às gerações futuras, aquilo de que necessitam para sobreviver” (Laudato sì, 95).
2. Amar mais as pessoas e cultivar a simplicidade de vida. A espiritualidade cristã propõe uma forma alternativa de entender a qualidade de vida, encorajando um estilo de vida profético e contemplativo, capaz de gerar profunda alegria sem estar obcecado pelo consumo.
A sobriedade, vivida livre e conscientemente, é libertadora. Não se trata de menos vida, nem de vida de baixa qualidade; é precisamente o contrário! Com efeito, as pessoas que saboreiam mais e vivem melhor cada momento são aquelas que experimentam o que significa ter apreço pelas pessoas, aprendem a se familiarizar com as coisas mais simples e sabem se alegrar com elas.
3. Rezar mais. Nós sabemos pela fé que é possível necessitar de pouco e viver muito, sobretudo quando se é capaz de dar espaço a outros prazeres, encontrando satisfação nos encontros fraternos, no serviço aos mais necessitados, no cultivo dos próprios talentos, na música e na arte, no contato com a natureza, na oração. A felicidade exige saber limitar algumas necessidades que nos entorpecem, permanecendo assim disponíveis para as múltiplas possibilidades que a vida oferece.
4. Paz interior. Ninguém pode amadurecer numa sobriedade feliz, se não estiver em paz consigo mesmo. A paz interior das pessoas tem muito a ver com o cuidado da ecologia e com o bem comum. Autenticamente vivida, a paz interior se reflete em um equilibrado estilo de vida aliado com a capacidade de admiração que leva à profundidade da vida.
A natureza está cheia de palavras de amor; mas, como poderemos ouvi-las no meio do ruído constante, da distração permanente e ansiosa, ou do culto da notoriedade? Muitas pessoas experimentam um desequilíbrio profundo, que as impele a fazer as coisas a toda a velocidade para se sentirem ocupadas, numa pressa constante que, por sua vez, as leva a atropelar tudo o que têm ao seu redor. Isto tem incidência no modo como se trata o ambiente (Laudato sì, 225).
Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba.