Ortopedia, bactérias e vírus
Tulio Pereira Cardoso
Infecção não é bem-vinda em nenhuma situação, mas particularmente na Ortopedia ela é bastante temida. A cartilagem articular é de certa maneira uma barreira à propagação da infecção para os ossos. Apesar dessa relativa resistência da cartilagem a infecção, uma vez infectado, tanto ossos como articulações são de difícil tratamento e podem sofrer deformidades bastante incapacitantes.
As infecções ósseas ou articulares podem ocorrer basicamente de duas maneiras. Por via hematogênica, ou seja transmissão pela corrente sanguínea, por exemplo no paciente com amigdalite que desenvolve uma osteomielite. Outra forma de infecção é por contiguidade, aquelas causadas por um ferimento aberto e contaminado como numa fratura exposta, ou ao implantarmos uma prótese de substituição articular.
Das infecções virais afetando o aparelho locomotor, a poliomielite ou paralisia infantil é certamente a mais devastadora. Durante meus anos de residência médica em Ortopedia, 70% do nosso tempo era investido no tratamento das sequelas dessa terrível doença. Atualmente, graças ao esforço de inúmeras organizações, lideradas por programa mundial capitaneado pelo Rotary Club Internacional, a vacinação em massa praticamente erradicou a paralisia infantil. E há quem seja contra vacinação !
Segundo os infectologistas mais experientes, a melhor forma de tratar uma infecção é preveni-la. Como ortopedista tenho certeza disso. Uma prótese infectada é um pesadelo para o paciente e para o médico. O custo físico, psíquico e financeiro é sempre enorme. Então como prevenir? Da mesma forma que se previne qualquer infecção bacteriana ou viral. Bons hábitos de higiene doméstica e pessoal como lavar as mãos frequentemente, escovação dos dentes e corte das unhas, banhos diários, boa alimentação e repouso, todos fatores que melhoram a resistência imunológica. No tratamento de ferimentos ou fraturas expostas investir na lavagem abundante das lesões com litros de soro fisiológico e minuciosa limpeza local.
Nas cirurgias com implante de prótese de joelho ou quadril, realizar exame clínico e laboratorial identificando possíveis alterações metabólicas, nutricionais, odontológicas, dermatológicas, urológicas, ginecológicas, renais e hepáticas. Hoje existem protocolos de avaliação de risco de infecção pré-operatória bastante eficientes. Durante o procedimento operatório checar sala e material cirúrgicos, redobrar os cuidados com assepsia e antissepsia ou seja escovação e lavagem das mãos e antebraços, uso de gorro e máscara, luvas e aventais estéreis, lavagem e isolamento do sítio cirúrgico com campos estéreis e uso de antibióticos profilaticamente por 24 horas.
Mas não existe prevenção 100%. Bactéria é o plural de bacterium, uma latinização do vocábulo grego bakterion que significa bastão, porque esta foi a forma observada pela primeira vez pelo microscópio do naturalista holandês Antony van Leeuwenhoek.
Seres unicelulares, foram as primeiras formas de vida a aparecer na Terra há aproximadamente 4,5 milhões de anos. Os seres multicelulares que deram origem às plantas, aos animais incluindo nós seres humanos só surgiriam 3 bilhões de anos mais tarde.
Biomassa compreende todos os seres vivos existentes na Terra, animais, plantas e as bactérias. Essas últimas são mais da metade da biomassa. Habitam o solo, a água, a camada profunda da crosta terrestre ou biosfera e colonizam até em resíduos radioativos. Resistem à falta de ar e a altas temperaturas. Tem enorme poder de mutação e de troca de material genético, o que as torna extremamente resistentes e adaptáveis. Só no nosso trato intestinal e pele temos o dobro de bactérias em relação ao número total de células do nosso organismo. Parte delas compõe nossa flora natural convivendo em equilíbrio com nosso organismo.
Bactérias representam o maior exemplo de sucesso de sobrevivência do planeta. Vírus do latim toxina ou fluído venenoso, não são células, são partículas infecciosas formados por uma cápsula proteica ou capsídeo, que envolve o seu material genético, normalmente DNA ou RNA e raramente os dois juntos. São menores que as bactérias e precisam de um hospedeiro para se replicar. Como não são seres vivos, não se pode matá-los. O que se pode fazer é inibir sua multiplicação com agentes antivirais que impeçam que ataquem e invadam células que seriam sua hospedeira. Apesar de não haver indicação do uso de antibióticos contra infecções virais, seu uso é preconizado já que os vírus enfraquecem o sistema imunológico predispondo a infecções bacterianas associadas e oportunistas, como exemplo clássico temos a Aids.
Os vírus mais conhecidos são os causadores de diversas formas de hepatite, gripe, sarampo, catapora, sarampo, rubéola e paralisia infantil. Nos últimos anos foram identificados os vírus HIV, do Ebola, da SARS e mais recentemente na China, uma forma do Corona vírus que está se disseminando rapidamente e causando muita preocupação mundial. Esse último está associado a hábitos culturais, principalmente ligados ao consumo de animais como cobras e morcegos que são repositórios naturais do Corona vírus. Esperamos que métodos diagnósticos precisos e rápidos sejam logo encontrados, e que uma vacina eficaz possa nos livrar de mais uma doença.
Como afirmou o naturalista e biólogo inglês Charles Darwin “nem sempre vence o mais forte, mas o mais adaptável”.
Dr. Tulio Pereira Cardoso tem Título de Especialista pela Soc. Bras. de Ortopedia e Traumatologia e é Membro da Soc. Bras. de Cirurgia do Joelho. E-mail: [email protected] #drtuliocardoso