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O jogo de xadrez da vacinação: Reino Unido, Alemanha e Países Baixos

11 de Março de 2021 às 00:01

Carmela Marcuzzo do Canto Cavalheiro

A pandemia da Covid-19 tem provocado um grande custo para a classe política, mesmo para Estados com alto Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), como os Países Baixos, a Alemanha e o Reino Unido. Em Estados em que os chefes de governo sustentavam a aprovação de uma maioria significativa, a encruzilhada da logística da vacinação impõe um desafio pelo aumento das críticas de seus respectivos nacionais, principalmente por parte daqueles que ainda não receberam a vacina.

Em uma pesquisa conduzida pelo instituto dos Países Baixos, em neerlandês Rijksinstituut voor Volksgezondheid em Milieu (RIVM), ou seja, o Instituto Nacional de Saúde e Meio Ambiente, demonstra que os neerlandeses ainda seguem as normas emanadas no governo. O RIVM conduz ao longo da pandemia pesquisas periódicas para avaliar o comportamento da população. Quando o toque de recolher estava em vigência, mesmo que uma minoria estivesse de acordo, 94% dos neerlandeses aderiram a essa medida mais restritiva mesmo sem concordar inteiramente com a regra que durou duas semanas. Especialistas alegam que essa anuência em relação ao cerceamento de direitos em prol da coletividade em um período pandêmico carece de apoio e entendimento, porque a população não tem a percepção de que o vírus Sars-CoV-2 seja realmente uma ameaça.

A pesquisa do instituto neerlandês observa que a obediência às normas permanece estável com um pequeno aumento do número de adeptos. Os próprios direitos sociais, aqueles da coletividade, como saúde e educação são questionados, pois uma parcela acredita que as medidas não deveriam ser executadas de forma igualitária, mas dividida em conformidade com as especificidades de cada grupo da população. Segundo as pesquisas, a saúde física e mental também é questionada. O melhor entendimento e apoio com as regras estabelecidas pelo governo vem em sua maioria pela população com idade acima de 79 anos, isto é, o grupo vacinado.

Na Alemanha o início da vacinação tem sido amplamente criticado, pois a quantidade de vacinas estaria aquém do esperado, os sites para marcação de consultas médicas também estariam sobrecarregados. Não obstante a Alemanha tenha começado a vacinação com um percentual melhor do que dos Países Baixos, enquanto 4,4% da população alemã estava vacinada, na população neerlandesa o percentual era de 2,9%. Deve ser observado que a população alemã é de 83 milhões e a população neerlandesa é de 17 milhões. Na média, a Alemanha está um pouco acima dos índices da União Europeia (UE) e os Países Baixos um pouco abaixo.

No entanto, o fato do Reino Unido apresentar os melhores índices de vacinação, pois 20% já estavam vacinados nesse início, além de possuir uma relevante produção é motivo de atenção por parte dos países da UE, especialmente após o Brexit, a saída do Reino Unido do bloco oficialmente em janeiro de 2020. A formalidade ocorreu depois de um plebiscito realizado em junho de 2016, em que 51,9% dos britânicos escolheram pela saída do bloco.

A lenta campanha de vacinação na Alemanha é atribuída à escassez de vacinas, a presidente da Comissão Europeia (órgão Executivo do bloco), Ursula von der Leyen admite complexidades na distribuição da vacina intrabloco.

No caso da UE, a equação se torna um jogo de xadrez porque a saída do Reino Unido e seus melhores índices na vacinação exercem uma certa inquietude para o bloco. Além dos problemas enfrentados no primeiro semestre de 2020 com a negociação do bilionário fundo europeu, a Alemanha na condição de grande liderança do bloco, chamada de “paymaster” esperava resultados melhores. A cobrança também se dá, pois os alemães da BioNtech participaram da produção da vacina Pfizer, fato que incluiu dinheiro e investimento. Diante do difícil cenário, o alívio seria a nova fábrica da BionNtech localizada no município de Marburg, Estado de Hesse.

Profa. dra. Carmela Marcuzzo do Canto Cavalheiro, Universidade Federal do Pampa (Unipampa), câmpus Santana do Livramento (RS), área de Direito Internacional é doutora pela Universidade de Leiden/Países Baixos.