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O inimigo da vez

30 de Abril de 2020 às 00:01

Tulio Pereira Cardoso

Apesar do exponencial aumento de infectados, o número relativo de pacientes graves é pequeno se comparado com outras viroses, mas a gravidade das complicações e a letalidade são preocupantes. Parece, segundo os epidemiologistas, que ainda não atingimos o pico de contaminação. Idealmente deveríamos testar em massa a população, e aí sim poderíamos falar em isolamento vertical, com menos prejuízo para economia e mais segurança sanitária. Achatar a curva como tem sido proposto tem como meta o não colapso do sistema de saúde. Sem pandemia já temos falta de leitos de UTI e respiradores. Quem quer ser o responsável por tomar decisões tipo “escolha de Sofia”? Nós médicos?

Inúmeros centros de pesquisa de todo o mundo estão realizando estudos com objetivo de criar vacina para prevenir a “infecção” pelo coronavírus e medicamentos para tratar aqueles pacientes já acometidos pela Covid-19. Vários medicamentos imunossupressores e antivirais usados no tratamento de doenças autoimunes estão sendo investigados. Entre eles Tomilizumab, Globulina hiperimune policlonal, Regeneron coquetel, RNA interferente pequeno e vários outros. No Japão o antigripal Favipiravir demonstrou alguma eficácia no tratamento dos sintomas do Covid-19. A OMS está promovendo dois ensaios clínicos, o Solidarity coordenado no Brasil pela Fiocruz, e o Coalisão Covid Brasil coordenados pelo Hospital Albert Einstein, Hospital Sírio Libanês de São Paulo e BRICNet - Brazilian Research in Intensive Care Network. Estudos preliminares demonstram que 69 medicamentos possam ter eficácia contra o SARS-CoV-2. A OMS optou pelos quatro mais promissores: Remdesivir antiviral usado sem o sucesso esperado no tratamento do Ebola mas que parece ser eficaz em combater os corona vírus do SARS e MERS; Ritonavir/lopinavir associação usada no tratamento do HIV; Ritonavir/lopinavir + interferon-beta demonstrou ser eficiente no combate a MERS (Middle East Respiratory Syndrome); Cloroquina Difosfato e Hidroxicloroquina utilizadas no tratamento de malária, lúpus e a artrite reumatoide. Não são isentos de complicações, algumas graves como arritmias cardíacas e alterações da retina. Nenhum desses medicamentos, de forma alguma deve ser usado aleatoriamente. São de indicação médica criteriosa e individual. Cada caso é um caso. Importante destacar que até o presente momento não existe um protocolo formal de tratamento, definindo esse ou aquele medicamento como o ideal e eficaz. Devemos ouvir os Epidemiologistas, profissionais preparados para estudar e conduzir a pandemia. O tratamento dos pacientes deve seguir orientação dos infectologistas, pneumologistas, clínicos, intensivistas e da enfermagem especializada nessas ações. Ninguém precisa ficar histérico ou em pânico porque isso não ajuda nada. Por outro lado não devemos deixar de ouvir cientistas, que estudam anos a fio sobre viroses e infecções. Passam a maior parte de suas vidas dentro de laboratórios e hospitais, na maioria das vezes muito mal remunerados e sob condições quase deprimentes. Diferente de alguns indivíduos que ganham muito bem e vivem em confortáveis escritórios refrigerados, com inúmeros assessores e regalias. Os cientistas são as autoridades no assunto. Não podemos desmerecer a ciência. Será que o mundo inteiro está errado? Será que certas são as infindáveis teorias de conspiração? Será que os políticos, de todas as matizes e do mundo inteiro sabem tirar proveito eleitoreiro até da doença e da morte? A crise econômica advinda não é culpa só do isolamento social, ela já vinha ocorrendo há anos, principalmente no Brasil.

É lamentável que essa polarização política seja ainda mais nefasta num momento desses.

O inimigo da vez, invisível, silencioso e apartidário é o coronavírus!

Em Dos Deveres (De officiis) Marco Tulio Cícero, o grande tribuno romano ressalta as obrigações do homem na suas decisões justas, lembrando que “a análise deve ser severa, mas a crítica deve ser sutil”.

Tulio Pereira Cardoso é médico, especialista em Ortopedia e Traumatologia. E-mail: [email protected]