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O ‘Campo de avião Schleiffer’ de Sorocaba

08 de Outubro de 2019 às 00:01

O ‘Campo de avião Schleiffer’ de Sorocaba Crédito da foto: Fotomontagem Vanderlei Testa

Vanderlei Testa

Um amigo chamou um aplicativo de carro. “Quero ir à rua Adolfo Frederico Schleiffer na Vila Elza, em Sorocaba”. O motorista abre o App e aparece na tela do celular o endereço. O propósito dessa citação é pesquisar se ele, com muitos anos de experiência em dirigir na cidade, conhece a origem dos nomes do local solicitado. No trajeto, a pergunta ao condutor do veículo: “você sabe quem foi a Elza que leva o nome da Vila?”. “E a pessoa que leva o nome da rua Adolfo Frederico Schleiffer?.” Afinal, quem eram esses nomes dos logradouros, questionei em várias pesquisas realizadas. Perguntei a mais de 20 pessoas se sabiam onde fica a Vila Elza em Sorocaba e se alguém já tinha ouvido falar do Adolfo Schleiffer. Ninguém soube responder. Pensando bem, por que será que existem locais importantes na cidade, com nomes homenageados e sem que a população saiba da sua história? E nem conhecida dos próprios moradores dessas ruas das vilas. Quando me perguntaram se eu conhecia a Vila Elza, contei que em minhas décadas de vida nunca tinha ouvido falar desse nome em Sorocaba e principalmente, relacionado com o “campo de avião” da época em que viveu na cidade. Curioso, fui atrás da tal Vila Elza e do Adolfo. Encontrei os dois, se é que se pode chamar de Vila, a grande área habitacional e comercial localizada no entorno do atual Aeroporto Estadual Bertran Luiz Leupolz. Penso que é um bairro de grandes proporções. Explicarei adiante que o aeroporto (“campo de avião”) teve a sua área doada e foi construído e fundado pelo Adolfo e pelos iniciadores do Aeroclube, em 1942.

O presidente da Academia de Letras da cidade de Peruíbe, poeta João Libero, filho do fundador da Vila Angélica, conviveu com a família da imigrante alemã Elza Schleiffer nas visitas que ela fazia a sua casa. E veio na prosa que tivemos os fatos que me levaram a conhecer a jovem Elza e seu esposo Adolfo. Adolfo Frederico Schleiffer, de nacionalidade alemã, escapou das tragédias da II Guerra Mundial para morar no Brasil com sua esposa Elza. Foi nessa triste época do inicio até ao final da guerra, onde o mundo viveu momentos de combates, que eles sentiram como o nosso país é abençoado pela liberdade e respeito humano. A acolhida em Sorocaba do casal Schleiffer possibilitou a sua integração na comunidade alemã e com os moradores. Relembrando essa fase da história do município de Sorocaba, o Censo de 1940 apontava 70.299 habitantes, sendo 52.242 habitantes na região urbana. O prefeito em 1942 era o Cap. Augusto César do Nascimento Filho, tendo mandato de 29/7/1938 até 1/7/1943. José Fernal foi eleito prefeito depois até outubro de 1945. A pequena cidade de Sorocaba no interior paulista era a 11º do Estado de São Paulo em população. O sonho de pioneiros na aviação dava início a uma trajetória histórica que só foi truncada atualmente pelo cancelamento do funcionamento do Aeroclube e sua Escola de Pilotagem. O que é um retrocesso na história da cidade.

Adolfo Frederico Scheleiffer acreditou na cidade e juntou as suas economias. Depois de conversar muito com a esposa Elza, acabou comprando uma área com alguns alqueires de terra que existia nessa região da zona norte de Sorocaba. Sua primeira inciativa de investimento foi o de doar uma imensa área ao primeiro “campo de avião” da cidade. Com a pista em terra vermelha e um galpão-hangar para receber algum avião que aparecesse. Eles gostavam de avião, pois na Alemanha onde moravam as aeronaves eram vistas no céu desde as suas infâncias. Adolfo também teve o sonho de adquirir o seu avião. Ele queria a sua aeronave em um local apropriado. Recebeu o incentivo em realizar essa obra do “Campo de aviação” com o aval do então prefeito Cap. Augusto César do Nascimento Filho e pessoas apaixonadas por aviação. Sorocaba conseguiu o sonhado “Campo de avião” -- em 27 de março de 1943.

Com a chegada desse empreendimento inédito na cidade e outras ações empresariais na região, como o Aeroclube e Escola de Pilotagem, em aberturas de ruas e infraestrutura para moradias, era necessária a oficialização de um nome para a vila que se formava ao lado do atual aeroporto. Foi daí que a esposa Elza Schleiffer receberia o carinho do marido com o seu nome sendo registrado oficialmente nos anais da prefeitura do município: Vila Elza. É lá também na Vila Elza que anos depois, surgiu a rua Adolfo Frederico Schleiffer, cuja homenagem, prestada após o seu falecimento é um marco histórico a ser relatado pelos historiadores do início da aviação em Sorocaba. Quem mora nessa Vila e rua não imagina que a Elza e o Adolfo foram um casal de jovens imigrantes unidos pela fuga da guerra. O matrimônio e o amor à cidade os levaram a plantar sementes de prosperidade à Sorocaba. Tomara que agora, 77 anos depois, 1942-2019, o povo e as autoridades consigam reativar o Aeroclube e a sua Escola de Pilotagem como é o sonho daqueles que sempre acreditaram nessa entidade, como o piloto Telmo Pereira Cardoso. Tenho um amigo Marcelo Alonso que trabalhamos juntos e se formou na Escola de Pilotagem em Sorocaba. Já voei com ele naqueles tempos do Aeroclube. Trabalhou como instrutor por dois anos no Aeroclube e há anos é um dos comandantes de aeronave em uma grande companhia aérea do Brasil. Marcelo Monteaperto Alonso reafirma seu desejo de ver Sorocaba novamente com o Aeroclube e a escola formando novos alunos, possibilitando a geração de emprego nesse segmento, assim como aconteceu na sua vida.

Outros imigrantes alemães vieram para Sorocaba, como o Bertram Luiz Leupolz que se dedicou a construir a conhecida empresa de manutenção de aviões Conal instalada nos arredores do aeroporto. Convivi anos com ele em associações, como o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp). Também da família de Alexander e Ana Baudenbacher, que sempre viveram na região do aeroporto, os filhos Paulo e o Alexandre, há mais de 40 anos são pessoas que admiro pela competência em seus negócios e amizade. Sorocaba que é conhecida pelas descendências espanholas e italianas, traz na sua história a importância dos alemães como Elza e Adolfo. E, para a minha surpresa, descobri esta semana em documentação, que o meu bisavô materno, italiano Angelo Modolo se casou pela segunda vez com a alemã Anayde Gerdes, minha bisavó. E daí que também tenho descendência ítalo-alemã.

Vanderlei Testa é jornalista e publicitário e escreve quinzenalmente às terças-feiras no Jornal Cruzeiro do Sul. Aos sábados, no www.facebook.com/artigosdovanderleitesta