O Banco do Brasil, o ajuste e o emprego
Celso Ming
Um jeito de analisar a decisão do Banco do Brasil de fechar 112 agências e demitir 5 mil funcionários é pelo lado político. É o que aponta para quanto essa decisão contraria o interesse imediato do presidente Bolsonaro, que não quer mais pressões dos políticos, quando, como agora, pretende influenciar as eleições das Mesas do Senado e da Câmara dos Deputados. Outro jeito de analisar é pelo lado do impacto no mercado de trabalho, não só no âmbito do Banco do Brasil, mas no de toda a economia, como uma espécie de saga em andamento.
No sistema financeiro, são as próprias imposições técnicas para aumento da eficácia que exigem redução de agências bancárias e drástica redução de pessoal. São exigências que não têm origem apenas nas leis do mercado. É o Banco Central e o governo que empurram nessa direção. Quando, por exemplo, induz à adoção intensiva de aplicativos digitais, quando melhora o desempenho dos cartões de crédito e quando cria o Pix, o Banco Central está empurrando para os clientes dos bancos tarefas que até recentemente eram desempenhadas pelos funcionários. Não é à toa que, entre 2016 e 2020, o sistema bancário fechou 4,1 mil agências e 78 mil postos de trabalho, como mostram as estatísticas do Banco Central e o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
É processo inexorável que vai se aprofundar. Até onde não se sabe. E, se não acompanharem esse movimento, os bancos estatais, como o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, sejam quais forem os presidentes e as diretorias da preferência do chefão da hora, ficarão para trás, perderão participação de mercado e sairão prejudicados em relação aos concorrentes.
Essa lógica não se restringe ao setor financeiro. A saída da Ford e o fechamento da fábrica da Mercedes-Benz em Iracemápolis (SP) são apenas os fatos mais recentes confirmados no setor de veículos. Os sistemas de automação intensiva e as novas arrumações do sistema produtivo do setor já vêm dispensando mão de obra há anos, processo que agora vai se intensificar à medida que o setor se reestruturar para atender às mudanças no paradigma energético. E, claro, não se restringirá às montadoras. Atingirá em cheio as concessionárias e toda uma área enorme de serviços que dependem dessa produção. À medida que os carros elétricos se incorporarem à frota de veículos, as oficinas mecânicas convencionais perderão espaço e tenderão a ser substituídas por autoelétricas, que demandarão cada vez menos mão de obra.
A automação, a incorporação de tecnologia de informação e a superdigitalização dos processos dispensarão funcionários em grande número de setores que hoje são grandes empregadores, como a construção civil, o comércio varejista e os transportes.
É um engano imaginar que a recuperação da atividade econômica depois da Covid-19 trará de volta os empregos antes existentes. Ou, então, que a intensificação da digitalização e do emprego de inteligência artificial acabará por criar empregos de outra ordem, como a partir do século 17 a Revolução Industrial e a invenção da máquina a vapor substituíram os empregos perdidos no campo e nas atividades artesanais. Os novos postos de trabalho não compensarão os que se fecharem no processo.
O problema é que ninguém ainda apresentou solução cabal para o problemão que já está aí. Criação de mecanismos de renda mínima, aumento do tempo destinado ao estudo e ao lazer e propostas de mudança no paradigma de consumo podem atenuá-lo, mas não eliminá-lo. O que se pode dizer é que, se não for encontrada saída para os efeitos da revolução do trabalho no mundo, as próprias empresas ficarão sem mercado para seus produtos e seus serviços, por falta de poder aquisitivo dos consumidores.
Celso Ming é jornalista especializado em economia.