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O automóvel

11 de Julho de 2020 às 00:01

O automóvel Crédito da foto: Divulgação

Edgard Steffen

Escrever é trabalho duro.

É como soldar um cano ou empilhar tijolos.

(Arthur Hailey)

Bons filmes na TV a cabo ajudam vencer o confinamento. Assistir ao “Ford vs Ferrari” lembrou-me “O Automóvel”, livro de sucesso nos anos 70. Ambos detalham a função das fórmulas e ralis para aperfeiçoamento e segurança dos carros.

Arthur Hailey (1920-2004), nascido na Inglaterra, criado no Canadá e radicado nos USA, escreveu best-sellers garantidores de fama e riqueza. De origem humilde, trabalhou desde os 14 anos. Cursou apenas o primário, mas conseguiu o que muita gente talentosa e preparada nas melhores universidades não consegue. O segredo de seu sucesso? Talento, leitura, foco e trabalho árduo. Nem mesmo a guerra -- onde atuou como piloto da RAF -- impediu sua compulsão devoradora de livros. No intervalo das missões descansava lendo. Nos USA, produziu textos para filmes e programas de televisão. Antes de iniciar um trabalho, Hailey concentrava-se, durante 8 meses em média, em leituras sobre o tema. O resultado foram textos agradáveis e descrição precisa dos cenários onde se entrecruzam personagens. As histórias sobre doenças e hospitais fizeram muitos acreditar que ele era médico. Em Hotel, o enredo envolve hospedeiros e hóspedes num hotel de luxo durante cinco dias. Os acontecimentos de apenas um dia em um terminal aeroviário, parece relato de quem administrara durante anos aeroporto internacional de grande movimento. O enredo de Aeroporto (1968) envolve forte nevasca, conflitos familiares, protestos de vizinhos contra a poluição sonora, passageira clandestina, avião encalhado na pista e outro, em pleno voo, sob ameaça de explosão por bomba caseira. O livro vendeu muito e o filme (1970) rendeu tanto em bilheteria quanto em indicações para o Oscar. A veterana Helen Hayes (velhinha clandestina) levou o de atriz coadjuvante.

Para o romance “O Automóvel” Arthur Hailey seguiu a mesma técnica. Passou muitos dias convivendo com mestres e operários dentro de uma fábrica, em Detroit. Resultou em obra didática sobre concepção de projetos, etapas, rivalidades, testes, acidentes e histórias pessoais durante os passos para fabricação de modelo capaz de agradar consumidores e gerar dividendos para investidores.

Rir é outra coisa que nos ajuda a esquecer o desconforto desta prisão a que estamos submetidos. Gostaríamos sair a bater pernas, mas temos medo de bater as botas. Como já cansaram reprises do “Apertem os sinos, o piloto sumiu” e paródias similares, melhor lembrar curiosos nomes gerados pela criatividade popular frente aos produtos de nossa indústria automobilista.

O primeiro carro a álcool, o Fiat 147, ganhou o epíteto “cachacinha”. Ônibus especiais (bilhetes mais caros) dotados de ar-condicionado viraram “frescões”. Pior que isso, receberam flatulento apelido quando passaram a ser movidos a gás.

As primeiras peruas DKW tinham portas que abriam da frente para trás. Entrar ou sair dela era terror para usuárias de saia curta. O povão trocou o “decavê” para “deixa vê”. Comercial afirmava que a Vemaguete era perua de “transportar gente”, para cutucar a concorrente Kombi, que se orgulhava de transportar meia dúzia de novilhos. Pelo formato, a kombi ganhou o apelido “pão-de-forma”.

Os comerciais da época enalteciam o leite Glória, porque “dissolve sem bater”. O Dauphine, primeiro minicarro da linhagem Willys virou “leite glória” porque nossas precárias estradas e esburacadas ruas o enchiam de barulhos na lataria. Nem o badalado “fusca”, proclamado “bom senso em automóvel”, escapou das gozações. Ao ser contemplado com dois grandes faróis, por analogia, virou “fafá-de-belém” e, dotado de teto solar, virou “corno-vaguen”.

Marcelo Mastroiani interpretou galã conquistador, mas impotente, na comédia ítalo-francesa de grande sucesso “Il bell’Antonio” (1960). O Simca Chambord -- concebido por montadora ítalo-francesa -- talvez tenha sido o carro mais bonito de sua década ou vintena. Pequeno erro de cálculo na relação carroceria/potência do motor valeu-lhe o apelido “Belo Antônio”.

Fonte: Wikipedia

Edgard Steffen é escritor e médico pediatra. E-mail: [email protected]