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‘Joaquim’ questiona a visão heroica da Inconfidência Mineira

11 de Abril de 2019 às 23:36

‘Joaquim’ questiona a visão heroica da Inconfidência Mineira “Joaquim” humaniza a figura de Tiradentes e discute o Brasil. Crédito da foto: Divulgação

Nildo Benedetti - [email protected]

Como aos 21 deste mês comemora-se o Dia de Tiradentes, a Fundec apresentará hoje, no projeto Cine Reflexão, o filme “Joaquim”, de 2017, sobre aquele personagem histórico. Como o próprio diretor do filme diz que é uma ficção, gostaria de rememorar a série de quatro artigos que escrevi nesta coluna que tinha por título “Baseado em fatos (quase) reais” e cuja versão ampliada foi integrada ao meu livro “Filmes para pensar”.

Observei que o pintor Pablo Picasso escreveu que a Arte é uma mentira que nos faz compreender a verdade. A verdade a que Picasso se refere não é a definitiva sobre fatos históricos ou científicos, mas é a verdade contida no sentido da obra de Arte dado pelo espectador no seu processo de interpretação. Escrevi também que documentários e filmes de ficção, baseados ou não em fatos reais, assim como os livros de História, devem ser vistos como a exposição de pontos de vista do autor sobre determinado fato real ou fictício. Por essas razões, os filmes declaradamente de ficção são poderosas fontes de reflexão sobre verdades a respeito de temas das ciências humanas e, nesse sentido, podem ser mais abrangentes, realistas e tocantes do que documentários e filmes baseados em fatos reais.

“Joaquim” tem a particularidade de abordar a vida de Tiradentes antes de ele se engajar no movimento de independência do Brasil. O diretor recorreu à consultoria histórica de Laura de Mello e Souza, autora de mais de uma dezena de livros e uma das principais historiadoras do Brasil. Ela é docente aposentada do Departamento de História da Universidade de São Paulo e ocupa a cátedra de História do Brasil na Universidade de Paris IV -- Sorbonne. É, portanto, uma acadêmica devidamente autorizada para apresentar uma visão realista, dentro do possível, da personalidade de Tiradentes e do ambiente político, econômico e social do Brasil do final do século 18. Como resultado dessa pesquisa histórica cuidadosa, “Joaquim” transcorre em ambiente de pobreza, humaniza a figura de Tiradentes e mostra-o como um homem comum que as circunstâncias do momento transformaram em herói. Discute, portanto, a própria gênese do herói, como também fez Bertolucci no “A estratégia da aranha” exibido na semana passada na Fundec.

O filme de Marcelo Gomes contribui para a análise do Brasil, nos moldes em que se empenharam os sociólogos do “Pensamento Social Brasileiro” da primeira metade do século 20: analisar o Brasil para corrigi-lo. Para esses autores, o peso da herança colonial foi decisivo na formação da sociedade brasileira. Por isso, o filme ajuda a compreender o Brasil colonial e o Brasil atual. É superior aos filmes anteriormente produzidos sobre a Inconfidência Mineira, como “O mártir da Independência”, de 1977, e “Tiradentes”, de 1999. Estes utilizaram os lugares-comuns encontrados em muitas obras do gênero biográfico: personagens históricos esquematicamente idealizados, envoltos em cenários e figurinos suntuosos, longe da realidade.

Serviço

Cine Reflexão

“Joaquim”, de Marcelo Gomes

Hoje às 19h

Sala Fundec (rua Brigadeiro Tobias, 73)

Entrada gratuita