Instituições de segurança e igualdade de gênero
Jamila Jorge Ferrari
Os principais direitos usufruídos pelas mulheres no mundo contemporâneo são resultado de prolongados, e muitas vezes penosos, processos de disputa no interior da sociedade. De maneira geral, os eventos determinantes para alterar a condição das mulheres ao longo da história dependeram de rupturas com valores estabelecidos e da ação heróica de algumas personagens específicas. Questões como o direito ao voto, direitos trabalhistas e temas ligados à liberdade feminina sempre foram considerados tabus e exigiram enfrentamento aos costumes vigentes em cada época para serem legitimados. Todos foram conquistados. Nada foi dado ou oferecido como entendimento de que a igualdade entre gêneros é uma forma de justiça.
Um desafio que o mundo ainda trabalha para superar, entretanto, é o da violência de gênero. O drama da violência contra a mulher persiste em diferentes culturas, independentemente de classe social, e acontece em formatos variados, que vão de agressões físicas à opressão psicológica. De acordo com a Opas (Organização Pan-Americana de Saúde), uma a cada três mulheres em todo o mundo sofre violência física e/ou sexual durante a vida; 30% das mulheres que estiveram em um relacionamento relatam ter sofrido violência por parte do parceiro; e 42% das mulheres agredidas por parceiros relatam lesões como consequência da violência.
Vários fatores são associados à violência e ao risco de violência de gênero, como baixos níveis de educação, uso nocivo do álcool e exposição a maltrato infantil. Mas é a posição desigual das mulheres em relação aos homens nas sociedades e o uso normativo da violência para resolver conflitos que são apontadas pela instituição como condições fortemente ligadas ao problema.
Da mesma forma, a redução desse tipo de crime depende de uma série de medidas combinadas, direcionadas a oferecer proteção às vítimas e romper com os ciclos de violência. No Brasil ou em qualquer parte do mundo, o desenvolvimento de ferramentas de segurança e de políticas públicas que desestimulem todas as formas de discriminação de gênero são determinantes para a redução dos casos e de vítimas de violência contra a mulher.
E é com base nesses princípios que a Secretaria de Segurança de São Paulo atua para combater os crimes motivados por questões de gênero. Além da ampla estrutura física colocada à disposição das mulheres, com delegacias espalhadas por todos os 645 municípios, as 136 DDMs (Delegacia de Defesa da Mulher), sendo 10 com funcionamento 24 horas, a rede de proteção da mulher paulista também conta com a DDM Online e serviços como o SOS Mulher e o Programa Bem-Me-Quer, entre outros, para proteger e amparar as vítimas de violência.
Permanentemente, todos os programas são analisados e novas ferramentas são estudadas visando a aprimorar o atendimento, com especial atenção ao acolhimento das vítimas, e o estabelecimento da justiça. Ao mesmo tempo, as instituições de polícia promovem a igualdade de gênero com políticas que estimulam a participação feminina em suas estruturas internas. Todos os policiais de São Paulo recebem orientação e treinamento específico sobre igualdade de gênero e existem mulheres ocupando postos importantes nos comandos das instituições.
Graças a esse conceito de igualdade, hoje temos mulheres chefiando operações da PM, pilotando helicópteros, desenvolvendo e aplicando técnicas de perícia criminal, chefiando delegacias e participando do desenvolvimento das políticas públicas de segurança. É um processo que ocorre a partir do Estado e que visa contagiar todas as esferas da sociedade.
Além de atuar diretamente no combate ao crime e no enfrentamento de criminosos, as instituições públicas de segurança de São Paulo reconhecem seu papel de servir como exemplo para construirmos uma sociedade mais justa, na qual os direitos mais elementares, como a igualdade de gênero, seja uma realidade.
Jamila Jorge Ferrari é coordenadora das Delegacias de Defesa da Mulher de São Paulo.