Filmes da Netflix: ‘Soldado anônimo’
Swofford (Jake Gyllenhaal) vive o tédio da espera por um combate. Crédito da foto: Divulgação
Nildo Benedetti - [email protected]
“Soldado anônimo”, dirigido pelo inglês Sam Mendes em 2005, transcorre durante a chamada Guerra do Golfo de 1990-1991. Para quem não lembra do episódio, segue uma breve recapitulação.
O Irã era importante aliado dos Estados Unidos no Oriente Médio até 1979, quando ocorreu a Revolução Islâmica que levou ao poder uma teocracia hostil aos norte-americanos. Para enfraquecer o Irã, os Estados Unidos e outras nações do Oriente Médio armaram e induziram o Iraque a uma guerra sangrenta contra o Irã. Ao final do conflito, em 1988, o Iraque endividado vivia forte crise econômica. Kuwait e Emirados Árabes Unidos passarem a vender altas quantidades de petróleo por preço muito baixo e o Kuwait passou a cobrar as dívidas do Iraque feitas durante a guerra com o Irã. Em agosto de 1990 as forças iraquianas invadiram o Kuwait, sob protestos em todo o mundo. Como as negociações diplomáticas não evoluíam, as tropas das Nações Unidas foram enviadas à região. Em janeiro de 1991, mais de 500.000 homens e mulheres dos EUA estavam no Oriente Médio. As forças iraquianas foram facilmente derrotadas.
“Soldado Anônimo” é baseado no livro de memórias de Anthony Swofford e começa com as habituais cenas de filmes de guerra em que instrutores berram, humilham e agridem fisicamente jovens subordinados para despertar neles a “macheza” supostamente essencial frente ao inimigo. O filme se concentra na experiência de um jovem de 20 anos e de seus companheiros que procuram inimigos no deserto enquanto aguardam impacientemente o momento de entrar em combate.
Os companheiros de Swofford na academia lhes dão as “boas-vindas” ao som irônico da canção “Don’t worry, be happy” (Não se preocupe, seja feliz‘), de Bobby Mc Ferrin. Igualmente irônica será a cena em que, no cinema, os fuzileiros cantam entusiasmados “A cavalgada das Valquírias” que acompanha o ataque aéreo norte-americano no Vietnam no filme “Apocalipse Now”, de Francis Ford Coppola; a ironia desta cena patética reside em dois fatos: o primeiro, o de motivar os jovens por meio de uma música executada em um filme pacifista que se refere à derrota humilhante das tropas americanas no Vietnam e, segundo, executar uma obra musical de Richard Wagner, sobre quem Hitler teria dito “Só entende o Nazismo, quem conhece Wagner‘.
Swofford lê o livro “O estrangeiro” de Albert Camus, cuja narrativa transcorre sob o sol intenso da Argélia. O narrador de Camus é presa da angústia, porque tenta inutilmente encontrar algum sentido para viver. Os jovens soldados do filme -- para escapar de uma condição absurda, similar àquela vivida pelo protagonista do livro --, bebem quando podem, procuram por distrações na TV e em vídeos, reforçam amizades e, ao mesmo tempo, brigam.
“Soldado anônimo” é um filme de guerra em que não há combate real. Swofford diz que foi burro o bastante para assinar um contrato. Passa a maior parte do tempo no deserto, entediado, treinando, empunhando equipamentos de guerra sofisticados, na espera de um combate que nunca chega.
Na próxima semana escreverei sobre “Nascido em 4 de julho”
Está série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec