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Filmes da Netflix: “O irlandês”

17 de Julho de 2020 às 00:01

Filmes da Netflix: “O irlandês” Crédito da foto: Divulgação

Nildo Benedetti - [email protected]

“O irlandês” cavouca as entranhas do poder da sociedade americana do pós-guerra em que se entrelaçam crime com política, Justiça, sindicalismo, empresários e Máfia, alguns se associando para combater outros, de acordo com a conveniência do momento. São relações de grande complexidade, que foram à época cuidadosamente camufladas e que vieram à tona pouco a pouco em várias versões. Portanto, o que filme nos apresenta são versões dos fatos, que podem ser menos ou mais realistas, mas que ajudam a compreender aquele momento da história norte-americana.

Tratarei a seguir alguns poucos tópicos do filme que ilustram aquelas relações.

O narrador do filme é Frank Sheeran, um veterano combatente da Segunda Guerra Mundial que serviu à Máfia como assassino e, em seguida, tornou-se líder sindical com a ajuda de seu amigo Jimmy Hoffa, lutador pelos direitos dos caminhoneiros e chefe do maior sindicato da classe. Acusado de fraude e pagamento de propinas, em 1964 Hoffa foi condenado a 13 anos de prisão, mas após cumprir cinco anos foi libertado durante o governo do presidente Richard Nixon, para quem Hoffa teria doado verba do sindicato para a sua campanha. Robert Kennedy foi procurador-geral dos Estados Unidos durante a presidência de seu irmão John. Empenhou-se em condenar Hoffa e combater a Máfia e depois, como senador, foi opositor da escalada militar americana no conflito do Vietnã. Foi assassinado em 1968. Hoffa desapareceu misteriosa e definitivamente em 1975. Ele mantinha perigosas e obscuras ligações com a Máfia que incluíam empréstimos ilegais do caixa do sindicato e lavagem de dinheiro e seu sumiço teve características dos crimes perpetrados por aquela organização.

O filme menciona o assassinato de John Kennedy em 1963 e os nomes de Frank Sinatra e Sam Giancana. Este controlava importantes sindicatos de várias cidades norte-americanas e era chefe mafioso de Chicago nas décadas de 50 e 60. Atuava em setores como clubes noturnos, hotéis, cassinos etc. A pedido do pai de Kennedy, Sinatra teria pedido a Giancana que auxiliasse o filho a vencer as eleições presidenciais de 1960; aparentemente, as eleições contra Nixon foram decididas em Chicago, área de influência de Giancana. Foi Sinatra quem apresentou Judith Campbell a Kennedy. Ela teria sido simultaneamente amante do presidente e de Giancana, para enorme preocupação do FBI. Russ Bufalino fala da participação da Máfia no assassinato de Kennedy.

O filme também faz referência aos antigos donos de cassinos de Cuba e ao grupo paramilitar de exilados anticastristas treinados pela CIA para matar Fidel Castro -- incluindo a malograda invasão da Baía dos Porcos.

Martin Scorsese dirigiu o filme aos 76 anos e escolheu de vários atores idosos na época em que o filme foi rodado -- Roberto de Niro, Al Pacino, Joe Pesci, Harvey Keitel, todos com idades acima de 75 anos. Isso dá à narrativa certo clima de nostalgia, reforçado pela decadência física de Sheeran e Russ Bufalino. Lembra um tempo que já passou, porque hoje os crimes efetuados por cidadãos ou pelo Estado são hoje muito mais sofisticados, mas não menos devastadores.

Na próxima semana escreverei sobre “My happy Family”

Esta série de artigos está incluída no projeto Cine Reflexão da Fundec.