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Existe isolamento social para os gamers?

11 de Junho de 2020 às 00:01

Thífani Postali e Tadeu Rodrigues Luama

A palavra isolamento está bastante presente em tempos de pandemia. Em março deste ano, foi decretada a quarentena no Estado de São Paulo, sendo autorizados apenas os serviços essenciais. O termo passou a ser usado para se referir às pessoas que deveriam permanecer em casa, saindo apenas em caso de necessidade.

Para o bem de nossa saúde, o distanciamento físico hoje é necessário. Mas será que existe mesmo um isolamento social, considerando as novas tecnologias de comunicação? A palavra isolamento, neste caso, caberia mais às pessoas que não têm o hábito de usar essas tecnologias e aquelas que, por diversos motivos, não têm acesso às ferramentas digitais.

Esse não é o caso de muitos gamers, usuários dessas tecnologias. Embora sejam, muitas vezes, incompreendidos por aqueles que não conhecem a cultura dos jogos digitais, eles se relacionam com outras pessoas enquanto jogam. Para quem participa de jogos multiplayers (on-line), a palavra isolamento não faz sentido, pois já está habituada a interagir no ambiente digital.

Enquanto jogam, os gamers acabam esbarrando em outros gamers. Cada um já sabe que tem o jogo como gosto comum com o outro e, a partir daí, costumam formar uma rede de contatos para marcar outras partidas. Como toda relação de convívio, uma hora ou outra isso pode se transformar numa amizade. Logo, enquanto jogam, os gamers estão batendo papo, como em várias outras atividades do nosso cotidiano.

A diferença é que essa comunidade já nasce num ambiente virtual. Em tempos de distanciamento físico, para muitos o jogo é a principal forma de convívio social. Se, às vezes, a preocupação com um familiar passando horas na frente de uma tela é legítima, hoje podemos olhar para isso com outros olhos: afinal, passar horas na frente de uma tela se tornou a única forma segura de nos relacionarmos.

E que tal aprender com os gamers? Entusiastas da tecnologia, é bem possível que conheçam boas ferramentas para marcar reuniões, armazenar arquivos, transmitir vídeos, entre diversas outras que, de março para cá, se tornaram vitais para a garantia das atividades transformadas, da noite para o dia, em home office. Ou mesmo na hora de matar a saudade daquele familiar fisicamente distante.

Vale lembrar que o videogame surge como algo que visava reunir a família. Sugeria, por meio da publicidade, a reunião em torno da televisão. Isso porque, em 1970, as poucas casas que tinham esses aparelhos possuíam apenas um. Com o barateamento das tecnologias de comunicação, os televisores (e, mais tarde, os computadores pessoais) passaram a ocupar outros cômodos, permitindo que a comunicação dos jogos digitais se dirigisse mais à individualidade.

Com o avanço e barateamento da internet e novas tecnologias de comunicação, a socialização retoma a força na cultura de jogos digitais, já no início do século XXI. Hoje, muitos jovens e adultos possuem acesso a aparelhos, sejam consoles, computadores ou mobiles, que permitem a conexão com diversos indivíduos em torno de algo comum: o jogo multiplayer, que propicia a socialização num ambiente virtual, favorecendo as trocas culturais, o que inclui os problemas comuns em qualquer esfera da vida que reúna um grupo de pessoas.

Talvez estejamos vivendo a volta do propósito inicial da cultura dos jogos digitais: a socialização. Talvez seja hora de entendermos e, quem sabe, participarmos das comunidades virtuais...

Thífani Postali é doutoranda em Multimeios pela Unicamp e mestra em Comunicação e Cultura pela Uniso. É professora da Uniso no curso de Jogos Digitais. Membro do grupo de pesquisa MiLu. Contato: www.thifanipostali.com

Tadeu Rodrigues Luama é doutorando em Comunicação pela Unip e mestre em Comunicação e Cultura pela Uniso. É professor da Belas Artes. Membro do grupo de pesquisa MiLu. Contato: tadeu.iuama@belasartes