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Evite os chatos!

21 de Julho de 2019 às 00:01

Dom Julio

Encontrei na internet uma postagem que me chamou a atenção: “evite as pessoas problemáticas, pessimistas e resmungonas; fuja das pessoas que consomem suas energias, minam as suas relações e só te mostram problemas. Em vez dessas pessoas negativas, procure conviver com pessoas que agregam valor na sua vida”.

Esse conselho pode até parecer bom, mas, na verdade, traz no seu bojo uma triste falta de caridade e misericórdia. É verdade, que não é fácil conviver com uma pessoa inoportuna, chata e pessimista. A presença e o comportamento dela exigem de nós muita paciência e tolerância. Mas é exatamente isso que pode nos ajudar a crescer e fazer crescer o outro.

A convivência com as pessoas chatas primeiramente nos obriga a superar nossa tendência de nos concentrar somente em nós mesmos. É nossa preocupação egocêntrica que, muitas vezes, está na raiz de nossa irritação, quando a presença de alguém nos causa sofrimento. Suportar pessoas chatas pode ser uma ação que brota do amor pelos outros. Só amamos os outros verdadeiramente quando o foco de nossa atenção se desloca de nós para o outro, mesmo que esse outro seja uma pessoa difícil.

Conviver com pessoas difíceis é um teste de autenticidade do amor. O amor visa sempre o bem do outro acima e antes do próprio bem. Quando convivemos com pessoas simpáticas, o amor é espontâneo, mas pode também não ser amor verdadeiro: amo tal pessoa pelo bem que ela me faz ou porque desejo realmente o seu bem?

Jesus nos acautela: “Se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? Os publicanos não fazem a mesma coisa? E se saudais somente os vossos irmãos, que fazeis de extraordinário? Os pagãos não fazem a mesma coisa?” (Mt 5,46-47).

A paciência em suportar o outro indica a perseverança na caridade. Suporto porque amo, porque quero perseverar no amor e porque, amando, espero o melhor do outro, mesmo que esse outro me seja desagradável.

A paciência hoje é uma virtude que está em falta. Os tempos em que vivemos são acelerados, e a vida empurra para a impaciência. Queremos tudo para ontem. Tudo tem que ter resultado imediato. Deve ser sem enrolação. A nossa pressa egocêntrica nos leva a ver o outro que não corresponde imediatamente às nossas expectativas e aos nossos desejos como um lerdo e como um peso morto que deve ser largado para trás.

Suportar as pessoas chatas pode ser uma exercitação e uma escola para viver a paciência como um modo novo e sapiente de viver neste mundo tão centrado em si mesmo. Ser paciente com os outros não é perda de tempo nem de energia.

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Corremos o risco de perder a capacidade de esperar e de sofrer os tempos e os ritmos naturais da lenta maturação das pessoas. Por isso a paciência é uma reação saudável ao mundo moderno que impõe que as ações e as pessoas têm que ser sempre rápidas e eficazes.

A paciência não significa resignação e rendição. Ela segue o caminho do amor que luta e se esforça pela conversão e pela mudança. A paciência é a virtude dos fortes porque são eles que sabem que o bem mesmo que demore sempre vence. Exige um trabalho sobre nós mesmos, sobre o próprio caráter, sobre o próprio modo de reagir e de ver os outros.

É bom não esquecer, por fim, de que Deus nos suporta com maravilhosa paciência. Se Deus não tivesse paciência conosco, Ele já nos teria largado para trás; já teria nos abandonado em nosso pecado; já teria desistido de nós e nos entregue ao domínio de Satanás.

Deus nos suporta com ilimitada paciência a nossa preguiça, o nosso relaxo, as nossas obstinações, os nossos erros, a nossa lerdeza pecaminosa. Ele nos suporta com infinita paciência e misericórdia, esperando que nosso coração um dia finalmente se abra ao seu amor de Pai e nos convertamos a Ele.

Dom Julio Endi Akamine é arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Sorocaba